Homenagem “Prestígio Profissional”, promovida pela Faculdade de Ciências do Desporto e Educação Física da Universidade de Coimbra (I)
“Época triste!
É mais fácil cindir-se um átomo do que um preconceito.”
(Einstein).
Hesitei em escrever este texto recordado dos meus tempos de português/latim do ensino liceal que nos alertava para o facto de “laus in ore proprio vilescit” (louvor, na própria boca, perde todo o valor). Todavia, por toda a moeda ter duas faces, o seu reverso obrigava-me à gratidão de tornar pública a recente homenagem “Prestigio Profissional” que me foi prestada no decurso da Conferência de Honra do “XIX Forum Internacional do Desporto”, pela Faculdade de Ciências do Desporto e Educação Física da Universidade de Coimbra (08/03/2019).
Durante a supracitada conferência, intitulada “Treino da força para idosos e evidências em estudos de intervenção”, proferida por Edilson Serpeloni Cyrino, professor universitário coordenador do Grupo de Estudo e Pesquisa em Metabolismo, Nutrição e Exercício da Universidade Estadual Londrina (Brasil), o professor catedrático que a ela presidia, Manuel João Coelho e Silva, da Faculdade de Ciências do Desporto e Educação Física (UC), quando da apresentação do conferencista feita por si, referiu-se a mim em generosas e amigas palavras que muito me desvaneceram por virem de um prestigiado académico que muito admiro e tenho em grande estima.
Nessa mesma ocasião, outra referência foi feita à minha pessoa por Edilson Cyrino que, poucos dias depois, publicaria, no meu facebook, uma mensagem que transcrevo com gratidão: “Homenagem merecida a um dos precursores do Levantamento de Peso/Halterofilismo/ Culturismo em Portugal, Prof. Rui Baptista. Me senti extremamente lisonjeado e emocionado de estar ao lado de uma lenda viva do Desporto”.
Reportavam-se estas duas personalidades ao meu livro “Os Pesos e Halteres, a função cardiopulmonar e o doutor Cooper” (publicado em idos de 73, e rapidamente esgotado). Qual pedrada no charco, atrevi-me a escrever esse livro numa época em que Kenneth Cooper, responsável pelo treinamento físico de astronautas norte-americanos, e autor de um estudo levado a efeito em cinco mil “cobaias” da Força Aérea, sustentava, num dos seus best-seller’s (1968), que o levantamento de pesos pouco representava em benefício da capacidade aeróbica dos praticantes de pesos e à sua saúde cardiovascular, embora com incontestada vantagem para o desenvolvimento dos músculos esqueléticos.
Pela minha responsabilidade na orientação de uma classe de culturismo do Clube Ferroviário de Moçambique, e pelo receio de um dos meus alunos, António Vasconcelos, por ter lido o livro de Cooper supracitado, resolvi, em dever de consciência, submeter ao teste, com o seu nome (correr ou caminhar, sem qualquer paragem durante 12 minutos), 6 praticantes de atletismo do Grupo Desportivo de Lourenço Marques e 9 praticantes de culturismo, por mim treinados, tendo obtido os 15 a classificação de excelente (o teste foi cronometrado pelo respectivo treinador de atletismo, António Matos, falecido em Coimbra onde viria a exercer, outrossim, uma acção digna de louvor).
Homenagem “Prestígio Profissional”, promovida pela Faculdade de Ciências do Desporto e Educação Física da Universidade de Coimbra (II)
“Preconceito é opinião sem conhecimento” (Voltaire).
Pouco tempo depois, ratificado pelo médico Jorge Pessoa Monteiro, docente do curso de Medicina de Lourenço Marques, com a ajuda de um finalista desse mesmo curso, Raúl Silveira, praticante oficial de atletismo, foi levado a efeito por mim um outro estudo sobre o efeito dos pesos e halteres nos valores das pressões arteriais máxima, mínima e diferencial, em que participaram 9 atletas da minha classe de culturismo, demonstrativo dos benefícios aportados por este treino de força na saúde cardiovascular dos testados.
Ao tempo, era eu havido como um apóstata da Educação Física chegando-se a ponto, de quando ministrei preparação física com pesos aos nadadores de Lourenço Marques que viriam a competir, em Portugal continental, nos Campeonatos Nacionais de Natação (1958), onde pulverizaram vários recordes nacionais, ser comentado em surdina estar-se a cometer uma heresia por os pesos “prenderem os músculos”!
Sessenta e quatro anos volvidos, sendo eu docente da Faculdade de Desporto de Coimbra (2001), tomei frutuoso conhecimento de valiosos estudos científicos sobre os benefícios da exercitação com pesos da autoria de José Maria Santarem, doutorado em Medicina pela Universidade de São Paulo, com um extenso e valioso currículo de vida, em mero exemplo, ex-coordenador dos cursos de pós-graduação em Fisiologia do Exercício e Treinamento Resistido na Saúde, na Doença e no Envelhecimento, personalidade do mundo científico com um perfil respeitado mundialmente, a quem enviei o meu livro: “Os Pesos e Halteres, a função cardiopulmonar e o doutor Cooper”.
Passado pouco tempo, recebi o seguinte mail que reproduzo com natural orgulho:
“Com muita alegria recebi o seu livro. Nossos ideais são comuns, e nossas dificuldades históricas também Felizmente hoje as evidências nos apoiam e somos ouvidos, mas é sempre emocionante lembrar os tempos em que éramos quase ignorados. Gostei muito do seu texto que, naturalmente, deve ser lido com a lembrança da situação do conhecimento de então. Como me pediu, segue em anexo um texto meu actual, é um capítulo do livro de medicina do esporte, ainda a ser editado. Meu desejo é que um dia possamos nos encontrar e rir bastante com as dificuldades do passado.Viviam-se então tempos em que vigorava o enraizado preconceito contra os pesos e halteres e o receio entre os seus praticantes, que esgotaram o amplo auditório da Sociedade de Estudos de Moçambique, entidade científica “Palmas de Ouro” da Academia de Ciências de Lisboa, quando aí proferi a conferência “Os Pesos e Halteres, a função cardiopulmonar e o doutor Cooper” que serviria de base à publicação do meu livro com idêntico título.
Um fraterno abraço!
Santarem”.
Dois anos antes, realizei, nesse mesmo local, uma outra conferência, intitulada “Educação Física, Ciência ao Serviço da Saúde Pública” que abriu a porta grande à Educação Física, tendo eu sido eleito, meses depois, vice-presidente da respectiva direcção e presidente da Secção de Ciências. Ou seja, “nihil fit sine causa” (nada acontece sem uma causa).
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