sábado, 9 de março de 2019

"A nova geração terá o poder de decidir o que quer aprender"

Na sequência de texto anterior (aqui), reproduzo uma entrevista a Marc Prensky, que cunhou a expressão "nativo-digital", retirando dela implicações para a Educação, que sistematiza e actualiza no seu muito premiado livro Education to Better Their World. Unleashing the power of 21 st -Century Kids (2016). 
A entrevista foi realizada por Leo Branco em 2017 e apresentada na revista Exame com o título "O professor deve ser um mentor". O motivo foi o lançamento de uma escola, da qual é consultor pedagógico, pertencente à rede Global Future Education Foundation and Institute, que fundou e da qual é director executivo,

Nota: Os destaques são meus.

"O americano Marc Prensky, de 71 anos, é um otimista sobre o futuro da educação. Para Prensky, que estudou em universidades prestigiadas como Harvard e Yale e escreveu sete livros sobre o tema, hoje os professores devem trabalhar como mentores, estimulando as crianças a pensar em soluções criativas para os problemas da sociedade. Atualmente, segundo ele, um bom ensino é aquele que faz o aluno descobrir qual é seu propósito e aprender a usar as ferramentas para mudar o mundo (...)
Como o modelo educacional deve se adaptar ao mundo atual? Por séculos, o conhecimento acadêmico funcionou bem para ensinar matemática, línguas e ciências. Isso não funciona mais. A tecnologia trouxe instabilidade. O mercado de trabalho está mudando rapidamente. As crianças hoje têm mais poder de aprender sozinhas do que no passado. A educação tradicional não se encaixa mais às necessidades delas.  
Quais são as alternativas? Temos de dar poder às crianças para elas decidirem o que querem aprender. O professor precisa ter um papel de mentor dos desejos do aluno, e não o de mero retransmissor de conteúdo. A criança precisa hoje do professor não para receber conhecimento, que ela pode encontrar facilmente na internet, mas para guiá-la na busca do que gosta de fazer. 
O que o senhor quer dizer com “dar mais poder às crianças”? É mostrar às crianças coisas que elas enxergam como problemas no mundo e estimulá-las a encontrar soluções. Por exemplo, se há crianças que se preocupam com a violência policial contra jovens negros, o papel da educação é instigá-las a resolver o problema. Uma maneira é usar o tema como ponto de partida para as aulas de história e sociologia, e ensinar habilidades importantes para a vida profissional, como criar um aplicativo para avaliar a qualidade do atendimento policial. O aprendizado virou um meio para chegar a um objetivo, que, no fundo, é formar indivíduos transformadores. 
Os professores estão preparados para a mudança de função? Não estarão preparados se enxergarem a si mesmos como provedores de conteúdo. Alguns profissionais vão entender a mudança, mas outros vão sair da profissão
Qual é o perfil ideal de professor para os novos tempos? O critério mais importante para dar aulas hoje é ter empatia. A pessoa gosta de trabalhar com crianças? Gosta de aconselhar os outros a seguir seus propósitos? Então pode dar aulas. O conhecimento acadêmico do professor deveria vir em segundo plano
Como avaliar a qualidade do ensino atualmente? Hoje é comum criar rankings para tudo: as melhores escolas, os melhores professores etc. Acho isso uma bobagem. Prefiro avaliar a entrega: quem de fato produziu algo. É a mesma coisa nos negócios. Os profissionais bem avaliados são os que entregam aquilo que se propuseram a fazer. 
Haverá sala de aula no futuro? Na minha opinião, não. O modelo de sala de aula vai mudar. Recentemente, visitei uma escola em Palo Alto, na Califórnia, em que todos os móveis das salas tinham rodas para que pudessem ser movidos de um lado para o outro, dependendo da atividade. Veremos cada vez mais exemplos de soluções assim."

7 comentários:

Céu Aguiar disse...

Testemunho verídiculo

Sou uma criança do fotoro e hoje tou na excola. Apetecéu-me vir. Escrevu este texto porque qero, pa variar. Sei que dou eros mas o meu profesor tamém dá e ningém simporta porque ele é enpático. A mãe gosta muito que ande por aqui por causa que não levo TPC pa casa e tou o dia inteiro a jogar, a cantar, a faser jinástica, a tocar nas teclas e a pintar grafitis onde calha. É o que eu gosto de fasere ela quase não me vê. E sou um génio proque aprendi a ler e a checrever tudo sosinha. Só não fasso matemática, não gosto.
Ai!
Uma rodinha da minha mesa acabô de se soltar!
É que eu ando de um lado pó otro encanto xcrevo este bocadinho. Deviam pôr rodinhas mais largas e um motorzinho nas mezas pa não termos dandar a emburrá-las. As mezas podiam ter um GPS, assim como as cadeiras.
No otro dia, inventei uma cansão:

Fui à excola do Lélé
Girópé, girólá
O que fostes lá fazer?
Girópé cá e lá

Fuime divertir bué
Girópé, girójá
Levei bolos e café
Girópé lá e cá.

Todos gostaram e deram-me um pré-mio de queriatividade. Sou muito fliz na ixcola.

Isaltina Martins disse...

Brincando... brincando... não tarda é isto que teremos. Com tanta criatividade e aprendizagem individual, os professores só vêm estragar tudo... fora com eles! O tempora, o mores!

Anónimo disse...

No entanto, quer concordemos ou discordemos de Marc Prensky, na nossa velha escola, cada vez é mais difícil dar conta do recado de ensinar o que quer que seja. Uma pessoa até pode explicar aos alunos que os nossos antípodas neozelandeses não caem para o céu porque, tal como nós, estão sujeitos à força da gravidade que os "puxa" para o centro da Terra, mas estas "curiosidades" da realidade física são muito menos interessantes do que aquilo que se pode ver nas omnipresentes pantalhas dos dispositivos eletrónicos, onde, ao fim e ao cabo, a Terra virtual tanto pode ser esférica como chata!
O desenvolvimento da matemática e das ciências físicas foi essencial para chegarmos ao mundo tecnológico em que hoje vivemos. Não acredito que os jovens consigam aprender “matemática, línguas e ciências” apenas com a ajuda de máquinas e professores empáticos ignorantes!
Num mundo sem escola, onde se possa ensinar e aprender, o futuro de qualquer ciência é morrer!

Helena Damião disse...

Prezada Isaltina
Já temos isto na Europa e em Portugal. A iniciativa "A voz dos alunos", realizada em vários países do espaço OCDE concretiza o que Prensky propõe. É evidente que ouvir os alunos é um pretexto para introduzir na escola o que os/certos adultos entendem que deve ser a educação do futuro e que dizem aos alunos que deve ser a sua educação. E, sim, os professores há muito que, nos discursos financeiro-político, deixaram de ser parte da equação (aspecto que se retoma de várias outras circunstâncias históricas). Acontece que esse discurso está a ser concretizado e muito rapidamente, tornando o professor técnico-aplicador ou substituindo-o mesmo por tecnologias que, de meios, se tornaram fins em si mesmas. Se comparar os discursos que sobressaem sobre as tecnologia e professor, verá, de imediato, que o professor é sedundarizado, dispensado, os novos recursos tecnológicos são colocados em primeiro plano, tornados indispensáveis.
Cordialmente,
MHDamião

Helena Damião disse...

Prezado Leitor Anónimo
Eu não diria "a nossa velha escola" porque velha não deixa de ter uma conotação negativa. A escola que temos e que, apesar de tudo, ainda consegue ensinar (o possível) deve ser melhorada em alguns aspectos mas não substituída por uma escola nova que promete o céu na terra. Isso já foi tentado muitas vezes e, a verdade, é que há uma estrutura escolar que se mantém. E mantém-se porque tem de se manter em nome não apenas da morte das diversas ciências, como diz, mas do declínio civilizacional.
Como diz, "cada vez é mais difícil dar conta do recado", até porque esse "recado" é recusado pela sociedade, e pelo os seus múltiplos actores que interferem na escola, e pelas tutelas, que deveriam defendê-lo. É também, infelizmente, recusado ao nível académico e escolar. É estranho, por exemplo, perceber que há professores a defender o discurso e as iniciativas patentes na entrevista acima.
Cordialmente,
MHDamião

Anónimo disse...

Os móveis têm rodas? Então e motor? Não me digam que obrigam as criancinhas a empurrar? A não ser que seja o professor a empurrar, assim já concordo.
José Augusto

Anónimo disse...

Querem o Céu e a Terra numa sala, exígua, com 28 alunos, tendo como material um PC e um projector! Não brinquem connosco e sobretudo não brinquem com a educação nem com os mais desfavorecidos!

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