Texto recebido de Fernando J. Regateiro, Professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra
O Ministério da Saúde tem em mãos um projecto de
regulamentação da conduta dos seus profissionais – um “Código de Ética”. Num
dos pontos do projecto, é estabelecido que os trabalhadores se devem abster de,
em público e sem mandato superior, emitir opiniões que ponham em causa ou
afectem o interesse da instituição.
E aqui surge um conflito entre o dito “interesse” da
instituição e o real interesse dos utentes da saúde. Lamentavelmente, no centro
de gravidade onde a proposta impõe “absoluto sigilo e reserva”, deveria estar
um “absoluto” cuidado com os doentes.
Num espaço de liberdade e de estímulo à criatividade, o
trabalhador tem o dever de denunciar, por dever de lealdade, insuficiências e erros
junto da direcção. E esta de agradecer, limitar danos e corrigir a situação. Se
nada acontecer, e por lealdade para com os utentes, o trabalhador passa a ter
um duplo dever: trazer a público quer as falhas quer a inoperância da direcção.
Isto é cidadania!
Mas, da proposta também se deduz uma assimetria nada ética:
o trabalhador poderá dizer bem, mas não pode dizer mal! Ainda que seja verdade.
É a “lei da rolha”, a favorecer a opacidade na gestão, a
mediocridade e a subserviência.
Era esperada e é saudável a reacção dos médicos. Têm o dever
de denunciar condições que limitem a liberdade do exercício médico ou que prejudiquem
os doentes e ponham em risco a sua segurança.
A disponibilidade reactiva do Ministério da Saúde para
alterar os pontos da discórdia, pretende apenas iludir a realidade: aqui,
existe uma matriz de “rolheiro”!
Por isso, e já Eça o dizia: “os políticos e as fraldas devem
ser mudados frequentemente e pela mesma razão”.
E esta proposta cheira mal!...
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