Declarações que fiz à revista Visão sobre o balanço da acção da troika na educação portuguesa. Tem sido tudo, em geral, bastante negativo:
A troika fez diminuir brutalmente a despesa com a
educação em Portugal, tanto no ensino básico e secundário como no ensino
superior. Os cortes foram em muitos casos cegos, isto é, foram feitos
sem atender a critérios de qualidade. A troika
mandou cortar e o governo cortou em força rapidamente. Não se pode dizer que a
escola pública esteja esse melhor com esse assim chamado
"reajustamento". Por exemplo, o aumento do número de alunos por turma
não veio aumentar a qualidade das aprendizagens. Outro exemplo:
ao cair o financiamento nas construções escolares e nas bibliotecas
escolares os alunos não saíram nada beneficiados. Persistem de resto alguns
problemas que vêm de trás e que dificultam o trabalho de alunos e professores. Um livro
publicado recentemente pela Fundação Francisco
Manuel dos Santos - "A Sala de Aula" - de Maria Filomena Mónica veio chamar a atenção
para o problema da indisciplina e para o continuado centralismo por
parte do Ministério. A autononomia das escolas não passa de uma palavra, pois na prática cada evz é menor. O exame aos professores não correu muito bem ao Ministério. Os professores ficaram zangados, piorando
o ambiente escolar. Como evolução positiva registem-se a revisão
curricular, com a definição de metas de aprendizagem e a mudança de
alguns programas do secundário, e a tentativa de aprofundamento do
ensino profissional. Por seu lado, olhando para o ensino superior foi
negativa a queda de financiamento para bolsas devido à política de lesa ciência da FCT, mas poderá ser positiva a criação de
cursos mais curtos no ensino politécnico.
2 comentários:
Não creio que a culpa dos cortes cegos seja da troika. É, mesmo, ideologia de quem dos governa. Se assim não fosse, como se poderia ter cortado e vai cortar tanto na educação pública e, ao mesmo tempo, se financiam escolas privadas? Como é que alguém imagina que a escola pública pode ter qualidade se um professor , por exemplo, de História ou Ciências pode ter mais de 240 alunos ou um de TIC ter 500 em diferentes níveis e ciclos de aprendizagem ( isto agora pois há sinais de que no próximo ano pode aumentar) ? Depois , vão dizer que os professores do público não ensinam , não querem trabalhar e , por isso , há necessidade de privatizar tudo.
Temos poucas crianças devíamos tratá-las bem e não pensar apenas nos empresários da educação. Ainda ontem foi notícia uma grande compra no sector privado da educação. Também a educação está a ficar na mão de multinacionais.
Para mais , também o sector universitário tomará o caminho do americano em que quem quiser aceder aos estudos universitários vai ter de os pagar bem caros ou endividar-se. Alguém consegue explicar bem por que é que nos EUA as propinas são proibitivas?
Ivone Melo
Em relação à indisciplina na escola há um factor que não vejo discutido e é da maior importância, os guetos em que algumas escolas se tornaram e que também estão relacionados com a proliferação dos privados.
Andei num liceu onde se podiam encontrar todos os estratos sociais, como era habitual naquele tempo ( os colégios eram para os de longe, os indisciplinados e os que não queriam estudar). Mais tarde, dei aulas numa escola , a Leonardo Coimbra, em que igualmente se encontravam todos os estratos sociais e não existiam problemas de maior a nível disciplinar. Pouco tempo depois de lá ter leccionado foi aberta uma outra escola a cerca e um km, a Francisco Torrinha ,em plena Foz. É evidente que a Torrinha se tornou a escola dos meninos da Foz e a Leonardo foi esvaziada daqueles que eram os bons modelos a seguir pelos filhos dos bairros degradados . O resultado está à vista . Uma boa escola tornou-se uma TEIP e aqueles miúdos, sem outros exemplos a seguir, continuam e continuarão a atolar-se na vida escolar e na sociedade.
Tudo isto, aprofundado com a proliferação dos colégios, como dos condomínios fechados, torna a sociedade bipolarizada entre maus, os pobres atolados nas suas ilhas de miséria (- quase todos nós , não tarda nada) e bons , os ricos, sempre cheios de medos que os comam vivos. Dois grupos que nunca se encontrarão como duas linhas paralelas, eis a sociedade do futuro que se está a criar e já nem existe o serviço militar para permitir que haja algum ponto de contacto entre eles!
Ivone Melo
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