Quando expostas aos agentes atmosféricos e às condições de pressão e temperatura próprias da superfície do planeta, as rochas, em especial as geradas em profundidade, sofrem modificações menos ou mais profundas, num processo que recebeu o nome de alteração meteórica ou meteorização, considerado uma fase do ciclo geoquímico da litosfera, como lembrou o professor Bastos de Macedo, em 1988.
Esta fase é, pois, a que tem lugar à superfície da Terra, reiniciando esse mesmo ciclo usualmente referido por ciclo petrogenético.
Do ponto de vista prático, pode afirmar-se que não haveria solo, nem plantas, nem animais, sobre as terras emersas, se não houvesse alteração das rochas.
A alteração das rochas é um dos ramos mais importantes da geologia. Com efeito, a sedimentologia, a geomorfologia, a geologia económica e aplicada, a pedologia, a prospecção geoquímica, a geologia do ambiente, a engenharia, entre outras, fazem constantemente apelo aos conhecimentos relativos a esta parte do ciclo geoquímico da litosfera.
Sobre a rocha meteorizada, o solo é o suporte da vegetação, base da cadeia alimentar |
Nesta mesma linha, a geomorfologia necessita de recorrer aos conhecimentos da alteração das rochas a fim de interpretar as formas de relevo e explicar a sua evolução. Aspectos relacionados com a erosão diferencial, bem como o essencial da problemática dos sistemas bioclimáticos de erosão, estão tão intimamente ligados à meteorização que, em parte, se confundem com ela.
No campo da geologia económica e aplicada, a alteração das rochas tem papel de relevo, por exemplo, na prospecção de matérias-primas argilosas, tão importantes para a indústria cerâmica, entre outras menos visíveis (papel, borracha). O perfeito conhecimento do estado de alteração ou da susceptibilidade de certas rochas usadas como pedra de construção, é outro aspecto do interesse deste ramo das geociências. As grandes obras de engenharia, como são as construções das barragens, pontes, estradas e, mesmo, as urbanas, não dispensam, para efeito de fundações, o recurso ao conhecimento do tipo e grau de alteração das rochas do substrato.
Outro tanto se poderá dizer em relação aos trabalhos de preservação do relevo, no tocante às formas naturais ameaçadas, em que é necessário lutar contra a erosão das terras e o deslize das vertentes. A hidrogeologia é outro ramo da geologia aplicada que encontra nos fenómenos de meteorização muitas das respostas inerentes aos seus objectivos. Problemas relacionados com a escorrência, infiltração, percolação e quimismo das águas subterrâneas estão intimamente relacionados com a alteração das rochas.
Estamos habituados a considerar as rochas como qualquer coisa de definitivo, mas, na realidade, elas nascem, vivem, envelhecem, degradam-se... Ao fazer esta afirmação, o geoquímico russo M. Chaskolskaia (1959) põe em evidência a extrema lentidão do processo natural de alteração das rochas, só abarcável na imensidade do tempo geológico. Mesmo antes da exposição aos agentes externos, na sequência de fenómenos que as fazem ascender e, subsequentemente, aflorar, as rochas geradas em profundidade, ou seja, as rochas endógenas (ígneas e metamórficas) sofrem alteração. À medida que se elevam das zonas de origem, as rochas ficam sujeitas a modificações que correspondem a fases progressivas de adaptação dos respectivos minerais (e da própria rocha, no seu conjunto) a ambientes sucessivamente mais próximos das condições físico-químicas da superfície, isto é, pressões (cerca de 1 atmosfera), temperaturas muito mais baixas (10 a 25 ºC, em média) e presença de água, de oxigénio, de dióxido de carbono, etc., decorrente do contacto com a hidrosfera, a atmosfera e a biosfera, esta última com um bioquimismo muito particular. Assim, distingue-se uma alteração das rochas ainda em profundidade, antes de estas aflorarem, qualificada de hipogénica [1] ou deutérica [2] e uma outra, à superfície, por exposição aos agentes externos, adjectivada de meteórica.
Alteração hipogénica ou deutérica
A alteração hipogénica tem lugar, como o nome indica, abaixo da superfície e resulta, sobretudo, da acção de soluções hidrotermais ascendentes, razão pela qual também se diz per ascensum. Com o mesmo significado, alteração deutérica alude a que os minerais dela resultantes são posteriores aos que constituem a rocha-mãe e, portanto, considerados primários [3].
As águas envolvidas neste processo tanto podem ser águas juvenis, isto é, águas excedentes da diferenciação magmática, mais ou menos ricas de substâncias mineralizadoras residuais, como águas meteóricas, ou seja, águas pluviais que descem em profundidade na crosta, onde aquecem e dissolvem certas substâncias aí existentes, antes de voltarem a subir para níveis elevados onde exercem a referida alteração.
São exemplos de alteração deutérica a caulinização e a sericitização dos feldspatos, a moscovitização e a cloritização da biotite, a serpentinização da olivina e muitas outras com interesse, sobretudo, no sector mineiro. A alteração hipogénica, quando existe, antecede a meteórica, “abrindo-lhe o caminho”. Assim, quando a erosão desgasta o terreno até atingir níveis mais ou menos profundos, onde se fez sentir a alteração deutérica, acontece que a meteorização tem o trabalho adiantado.
Alteração meteórica ou meteorização
Como os nomes indicam, alteração meteórica e meteorização aludem à alteração das rochas provocada pelos agentes meteóricos. Pode dizer-se, ainda, supergénica, na medida em que se processa à superfície do planeta sob a acção da energia solar, e per descensum, uma vez que actua de cima para baixo.
Os nossos irmãos brasileiros introduziram o termo intemperismo como sinónimo de meteorização, termo que tem vindo a ser usado entre nós com frequência crescente.
O conceito de meteorização foi enunciado sob a designação inglesa weathering, em 1936, por C. Croneis e W. C. Krumbein, como um processo de aproximação das rochas para situações de equilíbrio estável com as condições prevalecentes à superfície da Terra, processo que termina pela desagregação e, muitas vezes, decomposição parcial ou total dos seus minerais.
Um outro conceito alude à desagregação e transformação dos minerais e, consequentemente, das rochas, provocadas pelos agentes atmosféricos, por organismos vivos e pelas águas pluviais na capa mais superficial da crosta emersa. Neste processo, salienta-se a redução do tamanho das partículas resultantes da desagregação, o que lhes proporciona um estado de maior susceptibilidade às citadas transformações, uma vez que aumenta a superfície exposta aos ditos agentes. As referidas transformações têm lugar, não só por efeito da energia solar, mas também da energia interna, própria de cada um dos minerais das rochas, energia esta que se liberta espontaneamente no decurso da decomposição. A meteorização não é mais do que uma resposta por parte dos minerais das rochas, originalmente em equilíbrio no interior da litosfera, quando expostos à superfície, em contacto com a atmosfera, a hidrosfera e, sobretudo, com a biosfera, processo conhecido por epimorfismo ou epigénese.
Sendo a meteorização um processo espontâneo, os produtos resultantes possuem um nível de energia interna inferior à dos que lhes estão na origem.
A meteorização manifesta-se pela desagregação e/ou decomposição das rochas, levadas a cabo pelos agentes externos (físicos, químicos e biológicos), convertendo-as em outros produtos naturais em equilíbrio com as condições termodinâmicas e químicas do meio, que é, afinal, o da superfície subaérea da Terra. Por outras palavras, a meteorização das rochas traduz a sua adaptação a um dado ambiente externo, na interface litosfera-atmosfera-hidrosfera-biosfera. Os ambientes externos, isto é, os da superfície terrestre, são, via de regra (com excepção dos hiperáridos e hiperfrios), meios hídricos e todos eles oxigenados, cujas pressões e temperaturas são muito mais baixas do que as dos ambientes profundos, essencialmente redutores, onde tiveram origem. No dizer de Luís Aires-Barros (1991), meteorização é o apodrecimento, in situ, de uma rocha endógena que foi levada a condições exógenas.
NOTAS:
[1] Do grego hypo, abaixo de, sob.
[2] Do grego deuteros, ulterior, que vem depois, secundário.
[3] Por definição, nas rochas ígneas (as mães de todas as outras rochas) rotulam-se de primários os minerais que nascem primeiro, directamente da consolidação do magma.
A. Galopim de Carvalho
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