“Aprenda com o ontem, viva o hoje, tenha esperança no amanhã. O importante é não parar de questionar” (Albert Einstein, 1879-1955).
No meu anterior post, “O Ministério da Economia, a Ordem dos Professores e a Fenprof” (02/06/2012), teceu um comentário o leitor José Batista da Ascenção, companheiro de uma cruzada na luta sem quartel contra os “infiéis” que terçam armas contra a criação da Ordem dos Professores. Ou seja, especificando melhor, sindicalistas que tudo fazem para que essa realidade seja adiada para as calendas gregas. Mas que eu espero e desejo, colhendo inspiração em Vergílio Ferreira - “tenho esperança, é o que me vem sustentando; a esperança que amanhã é que é” – que esse prazo seja reduzido para um tempo que não se afaste muito da hora que passa
Este comentário é a prova de que ainda há professores que
pensam pela própria cabeça, rejeitando, por exemplo, propostas deontológicos sindicais (da
pertença legal e exclusiva das ordens
profissionais ) que tentam resistir aos ventos da história mesmo depois de
Soljenitzin ter anunciado, urbi et orbi, que “o relógio do comunismo já soou
todas as badaladas”. Em acrescento meu, com excepção do carrilhão da Coreia do
Norte e o tique-taque da República Popular
de Cuba!
Começo por dizer ao autor do referido comentário que
comungo com ele as dúvidas por si levantadas, em comentários anteriores, sobre a bondade, não isenta de defeitos, das
ordens profissionais, porque, como nos diz a vox populi, “não há bela sem senão!” De entre as minhas
objecções, apresento, a título exemplificativo, as seguintes:
- Criação de ordens profissionais que metem tudo no mesmo
saco sem diferenciar e respeitar as habilitações académicas dos seus membros.
- Obrigatoriedade de cotização mesmo que os seus membros se
encontrem no desemprego, sob o risco de o não fazerem serem obrigados a provas
de acesso em que a respectiva exigência faz com que “chumbem”, tendo que
repetir essas provas a troco de quantias incomportáveis para as suas vazias
bolsas ou, muitas vezes, em alternativa, com balões de oxigénio de sacrificados
progenitores.
- Possibilidade de eleição de
bastonários com habilitações de grau
académica não superior em ordens
que tutelam licenciados universitários e politécnicos.
Objecções sobre esta forma de associativismo profissional,
levantou-as, também, o jurista e jornalista Miguel Sousa Tavares. Mas delas se ressarciu quando reconheceu
publicamente: “(…) opus-me no referendo feito à classe sobre a criação de uma
Ordem dos Jornalistas. Hoje, revejo a minha posição: é urgente a criação de uma
Ordem” (“Público”, 06/06/03/98).
Sintomaticamente, e a exemplo da Ordem dos Professores, idêntica e fortíssima
contestação à criação da Ordem dos
Jornalistas teve como personagem de cartaz
o Sindicato de Jornalistas. Assim, num programa da TV2, intitulado “Clube
de Jornalistas”, em época acesa desta polémica, assistiu-se a um debate entre jornalistas e uma ex-presidente do Sindicato
dos Jornalistas, Diana Andriga, que se mostrou
visceralmente contrária a essa criação em oposição às opiniões favoráveis de Octávio
Ribeiro, subdirector do “Correio da Manhã”, e Eduardo Cintra Torres, crítico de
televisão do “Público”. Manifestou-se, também, favorável à respectiva criação o
antigo director do “Diário de Notícias”, um peso pesado do jornalismo, Bettencourt
Resendes.
Por todo um árduo trabalho de estudo (muitas vezes, em consultas de documentos em bibliotecas) que, ao longo de vários anos, dediquei a esta
temática, derrubando argumento atrás de argumento, como seja, por exemplo, o
refúgio impeditivo no conceito stricto
sensu de profissão liberal, não posso deixar de me revoltar com argumentos,
como diria Eça, escritos de “pena ao vento”, em alguns casos de má fé ou mesmo
a roçar a imbecilidade de querer fazer passar por estúpido todos aqueles que
defendem a criação de uma Ordem dos Professores.
Haja paciência! E paciência de Job não me falta. Só peço que
não mandem para o ar “bitaites” (releve-se-me o calão) como se fossem coisas
sérias, em nome do respeito que merecem os professores e o seu munus de
sacerdócio por um futuro risonho das vindouras gerações, mais cultas, melhor preparadas
cientificamente e em que se cumpra escrupulosamente o princípio
defendido por Einstein: “É fundamental que o estudante adquira uma compreensão
e uma percepção nítida dos valores”.
Ao contrário do exemplo
de operários que, durante o PREC, se manifestavam ameaçadores à porta das fábricas contra os patrões, esses valores não devem encontrar expressão, em manifestações sindicais actuais ruidosas (ou mesmo boçais),
por vezes, à porta das escolas e em
presença dos respectivos alunos.
Ora, só com medidas concertadas serão os docentes (docentes por
não haver nada na lei que outorgue o título de professor: o licenciado em
Medicina só é médico se inscrito na respectiva ordem) capazes de se libertarem
do anátema de falta de capacidade para se auto regularem , rejeitando, assim,
naquilo que a nova regulamentação das ordens profissionais permitir, a
submissão a uma tutela estatal ulcerada
de injustiça e com pústulas de compadrio.
Por último, na situação actual, em que o Ministério de
Economia se comprometeu em ouvir as ordens profissionais sobre a futura
legislação que presidirá a esta forma de associativismo profissional, os professores,
por falta de traje legislativo apropriado, terão que ficar à porta desta cerimonial audição. Se esses actos de tentativa de concertação de interesses
de ambas as partes decorrerem no segredos dos deuses, a exemplo de todo aquele que não
tem bilhete para assistir a um desafio
importante do chamado desporto-rei têm
as estruturas sindicais e os docentes delas desvinculadas que ir colhendo,
tão-só, notícias publicadas nos media.
Seja como for, oxalá
que essa audição não se destine apenas a
ouvir a opinião das associações profissionais públicas para o Ministério da Economia dela fazer ouvidos
de mercador. Isto é, como já tem sucedido, em
ocasiões anteriores, as entidades
solicitantes de pareceres idênticos fazerem
precisamente o contrário! Ou será, que, desta vez, se não deve dar qualquer crédito ao legado deixado
por Benjamim Disraeli, com a autoridade
de ele ser um destacado político britânico (1804-1881): “O exercício da
política pode ser definido com uma só palavra: dissimulação”?
Sem me querer precipitar, até porque como nos ensina a
sabedoria popular, “até ao lavar dos cestos é vindima”, por agora, limito-me a
dar voz e a acatar o princípio jurídico que
nos impões prudência mesmo que só nos nossos julgamentos pessoais: “In dubio
pro reo”.
10 comentários:
Sim, meu caro Rui Baptista
Depois de muito pensar, e muito por influência sua,
e olhando para a sua honesta e porfiada luta,
agradecendo a primeira e admirando a segunda, senti
que não me era permitido ficar indiferente. Por isso
sou a favor da criação de uma Ordem de Professores.
Mas não sou António e o Batista do meu nome não tem
"pê", o que, para o que se discute, é irrelevante.
Pudesse haver muitos Antónios a associarem-se ao
esforço. E muitos professores com "pê maiúsculo" a
darem poder a tão merecido esforço.
É o que desejo.
Sinceramente.
Meu caro José Batista da Ascenção: Já emendei no próprio post!Só eu e Deus sabemos o desgaste que me dá (e, por vezes, a irritação) repisar o que toda a gente de boa-fé sabe, ou tinha mesmo a obrigação de saber, ser uma luta que há-de acabar por vingar pela justiça que encerra.
Receba um abraço com o pedido de desculpas pelo meu erro involuntário e justificado pelas razões acimas expostas.
Rui Baptista (com "pê"!)
Ph - (professores com fósforo) Conhecimento.
Excelente texto - mas, mesmo com as dúvidas que se expõe, há muita mais vantagens do que desvantagens na criação da nossa Ordem.
PS - sou geólogo; na minha área científica também se tem posto a questão e a minha resposta é a mesma - embora os geólogos, sejam muitas vezes, por natureza, anarquistas (eu sou um bocado...) e eu não gostasse antigamente de uma Ordem dos Geólogos (preferia uma DesOrdem dos Geólogos...) hoje não tenho dúvidas de que o país e os geólogos teriam muito a ganhar (tal como os jornalistas) numa Ordem, mesmo que eu tivesse de optar pela Ordem dos Professores, se não me fosse permitido pertencer às duas.
Meu caro Fernando Oliveira Martins: Haja o que houver, mais dia ou menos dia, a Ordem dos Professores será uma realidade. A acção concertada, constante e pertinaz da Fenprof e da própria FNE (para não falar de outros sindicatos de expressão quase insignificante num universo de mais dezena e meia de organizações sindicais) acabará por ser vencida pela força da razão. Toda esta obstrução sindical que se julga um inamovível Rochedo de Gibraltar não passa de uma pedra solta de calçada à portuguesa…
Ancorados no princípio “ se não puderes vencê-los junta-te a eles”, só há o perigo de – aparecerem, sem serem convidados, para festejar essa vitória e delas tentarem tirar proveito. Mas nessa altura terão que arcar com a responsabilidade dos seus actos. Nós cá estaremos para não nos deixarmos enlear em novos cantos de sereia que nos façam naufragar em novos escolhos:” Cesteiro que faz um cesto faz um cento desde que tenha verga e tempo”!
Como outros comentários aqui deixados, o seu comentário é uma ajuda preciosa para arregimentar adesões de indecisos que poderão ( e deverão) levantar todas as objecções que entendam por necessárias. O papel de advogado do diabo é de uma grande utilidade por nos obrigar a esclarecer todos os pontos contestatários que venham por bem. Já chega de silêncios cúmplices…
Cumprimentos gratos,
Caro Professor Rui Baptista,
O ensino está a passar por uma profunda transformação e a vida quotidiana nas escolas decorre sob alguma ansiedade. Depois da redução salarial de 5%, em média, em 2012, e mais de 14%, no ano corrente, a revisão da estrutura curricular caiu mal entre o professorado.
Mesmo os docentes que leccionam as disciplinas do 3º ciclo cuja carga horária vai aumentar — História, Geografia, Física-Química e Ciências Naturais — não manifestam contentamento com a valorização das disciplinas para cujo ensino foram recrutados, chegando a evidenciar pena pelo desaparecimento de áreas curriculares — área projecto, formação cívica e estudo acompanhado — que consideravam inúteis, mas que diminuíam o número de turmas que exigem trabalho de elaboração e correcção de testes.
Quanto aos de EVT (2º ciclo), a animosidade contra o ministro é de tal ordem que usam cargos no Conselho Pedagógico e no Conselho Geral e ligações partidárias nas autarquias para ignorarem, ou até darem cobertura a perseguições a colegas que nunca se conformaram com as pedagogias rousseaunianas.
Este ambiente provoca-me um profundo cansaço e ontem, quando por aqui passei, não consegui alinhavar umas linhas de apoio à criação da Ordem dos Professores. É, porém, um combate que também sinto necessidade de travar.
(continua)
Caro Professor Rui Baptista,
Que as ordens defendem interesses corporativos dos seus membros, é sobejamente conhecido.
Que há ordens profissionais que "metem tudo no mesmo saco sem diferenciar e respeitar as habilitações académicas dos seus membros", como muito bem lembrou, é problema a exigir solução. Haveria que distinguir os docentes com formação em politécnico da universitária, começando por definir o termo "professor". Os espanhóis, por exemplo, diferenciam o "maestro" do "profesor", tal como os escritores portugueses do séc. XIX também distinguiam o "mestre-escola" do "professor".
Não podemos esquecer, porém, o papel inestimável das ordens profissionais na exigência de elevadas qualificações aos seus membros, cumprindo fielmente o objectivo das corporações medievais de artesãos onde têm as suas raízes.
Nunca será demais recordar o serviço prestado ao prestígio profissional dos engenheiros pela sua ordem, quando esta recusou a aspiração de José Sócrates a ser considerado como tal.
Nunca a indisciplina nas escolas teria atingido a gravidade visível, nunca teríamos assistido, impotentes, à degradação da qualidade do ensino no nosso País, se os candidatos a professor dos ensinos básico e secundário oriundos de instituições de ensino superior pouco fiáveis tivessem de prestar provas de conhecimentos numa ordem profissional para poderem exercer a profissão de professor.
Dir-me-ão que não havia escolas nem professores suficientes para cumprir a escolaridade obrigatória de seis anos decretada em 1964 e foi necessário recrutar pessoas com habilitações ao nível do secundário para preencher vagas nas escolas.
Dir-me-ão que se montaram pavilhões pré-fabricados e que Veiga Simão criou licenciaturas em ensino, só com exames nos dois primeiros anos, para formar rapidamente professores.
É verdade. Mas era uma situação temporária que mais tarde a ditadura corrigiria.
Depois aconteceu o 25 de Abril e das universidades saíram licenciados com três semestres de passagens administrativas (sem exames) que caíram de pára-quedas nas escolas dos ensinos básico e secundário. Como não existia uma Ordem dos Professores a exigir qualificações aos seus membros, os sindicatos conseguiram enfiar todas estas pessoas nos quadros das escolas.
Neste meio propício, surgiram as Ciências da Educação a defender que os alunos podiam adquirir competências sem que os professores transmitissem conhecimentos, apenas brincando. Os defensores de pedagogias estritamente activas multiplicaram-se como cogumelos em universidades e institutos politécnicos, entraram na Assembleia da República e instalaram-se no Ministério da Educação.
Quando já havia escolas bem equipadas, continuaram a ser admitidos professores cientificamente mal preparados, muito permissivos com a indisciplina, sem rigor na avaliação dos alunos, que aderiram de alma e coração às teorias dos técnicos das Ciências da Educação, que ficaram conhecidos por técnicos do Eduquês.
Porquê? Porque as exigentes universidades públicas davam menores classificações aos seus licenciados que, obviamente, eram ultrapassados nos concursos para professores. Com o ministério minado e sem uma ordem a defender a qualificação profissional, os melhores foram preteridos.
Pelo recrutamento dos professores por um critério de mérito, pela qualificação dos jovens, pelo desenvolvimento económico do País e para que as futuras gerações possam ter uma vida digna, todos juntos a defender a criação da Ordem dos Professores.
Cumprimentos cordiais.
Se o autor não vir inconveniente, subscrevo o seu texto, que apoio e agradeço.
Meu Caro "Dis alter visum": Encontro-me- em imperdoável falta para consigo por ainda não ter respondido a este seu belo texto de apoio a uma luta que deveria mobilizar todos os professores que estão a favor da criação da Ordem dos Professores.
Os imponderáveis que para isso têm contribuído residem no facto de ter estado a responder aos comentários que têm sido feitos ao meu último post, "O futebol, ópio do povo?" Aliás hábito que vem de longe pelo respeito que me merecem as opiniões dos outros. Aqueles outros que me dão o prazer de ler os meus post's e comentá-los, quer para com eles concordarem ou discordarem.
Fá-lo-ei, brevemente, com o destaque que lhe é devido e pelo prazer de um dever cumprido.
Cunprimentos gratos,
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