Newton e o Sistema de Avaliação do Desempenho do Pessoal Docente (com uma rápida passagem pelo estádio, onde o jogo continua molenga)
O binómio de Newton é tão belo como a Vénus de Milo.
O que há é pouca gente para dar por isso.
óóóó — óóóóóóóóó — óóóóóóóóóóóóóóó
(O vento lá fora).
Álvaro de Campos
Pergunta
óbvia: a que vem este paleio que liga um cientista de mérito a um diploma comum?
O
Binómio «de Newton» tem tudo a ver com simplicidade prenhe de consequências. O
Decreto Regulamentar n.º 26/2012, de 21 de Fevereiro, não.
Mas
era bem bom que tivesse…
Como
fui formado por pessoas que acreditavam na elegância e simplicidade das boas
soluções — chama-se a isto, confesso, uma formação
clássica —, olho pasmado para o Decreto Regulamentar que estabelece um novo
sistema de avaliação de professores, e pergunto-me: o que quer este diploma
dizer? Melhor: que quer ele fazer?
Vou
novamente olhar o sistema: há um currículo nacional; é operacionalizado por
programas; são postos em prática por professores, em benefício de estudantes;
estes estudantes são avaliados, numa escala de 0 a 20, por exames periódicos;
se estes exames forem tecnicamente corretos e exigentes, se as classificações
dos alunos forem medianamente satisfatórias (médias superiores a 10, com
domínios de excelência); se, enfim, corresponderem de perto às classificações
internas da frequência, o que há que entender?
Que
o ensino foi de qualidade.
O
que se faz aos docentes responsáveis? — Dá-se uma estrelinha para pôr no
caderninho, e nota de Bom!
E
se tiver muitas estrelinhas, ao fim de um tempo? — Ah, dá-se um Muito Bom, por
duas ou três estrelinhas.
Atão
e se as notas dos meninos forem, em média, superiores a 14 (por exemplo…)? — Pimba,
Excelente! — Duas ou três estrelinhas, e notas catitas, superiores a 14?: chelente!
Sem tirar nem pôr!
Isto
parece idiota? É bem capaz de o ser, mas vou pensando em voz alta: vimos que
havia um currículo nacional, e os programas de aplicação; vimos que os
professores ensinavam isso aos meninos; vimos que havia avaliações exigentes, e
notas espampanantes no fim. Quem foi lindo? Os meninos, que aprenderam bem a
lição, trabalharam—esforçaram-se? Sim. E o menino docente, que deu ao coco para
passar a mensagem? Também.
Excelente,
para os meninos todos.
De
há uns anos a esta parte brinca-se às avaliações: ele são as avaliações ditas
formativas (conhecidas muito antes da Idade Média por mestres medianamente
espertos, numa altura em que quem dissesse «ciências da educação» levava
imediatamente um estalo para não dizer impropérios); ele são as avaliações
ditas por pares (menos más: o que serão as avaliações por ímpares — só dão 19?);
eles são as avaliações ditas em exercício (contrapõem-se a avaliações em
perfeita imobilidade—ou Zen); ele são as avaliações ditas justas (são as boas:
as outras são injustas); ele, dito ele, vai parar aqui porque já vê Leitores a
bocejar!
Ele
lembra-se das últimas: ele submeteu-se, por vontade própria, a dois processos
de avaliação: em 2008-2009, e em 2010-2011, porque ele gosta de experimentar os
processos para formar opinião, e ele achava que deveria ser avaliado — sim,
senhores!
Bom,
e conclusões? Várias: o processo foi complicado, deu trabalho a montar, mas não
foi em benefício dos alunos, do ensino. Foi em benefício da nota da avaliação.
A nota foi boa, e o processo montado, que elegantemente vociferava contra «o
sistema», era, apesar de tudo, adequado: punha o dedo em feridas, o que é
sempre bem visto, é giro. A atuação nas aulas foi passada por crivos que
levavam em conta os descritores dum conjunto de parâmetros que não eram
inocentes, neutros ou científicos. Eram os parâmetros…
Ninguém,
no seu perfeito juízo, se preocupou com o seguinte: então e — acabado o ano
letivo—que foi que se passou com os estudantes? Passaram os ignorantes e os
preguiçosos? A matéria foi bem agendada? Os alunos que passaram ficaram com os
conhecimentos definidos pelo programa? Tinham exame? Se tinham, quais foram os
resultados? E se não tinham, como foi o ano seguinte? E no fim do ano, os ditos
resultados? Hein?
A
minha avaliação foi pacífica. Ninguém pelo processo ficou a saber mais nada,
nem nada que valesse a pena. Foi um pró-forma, sancionado por pares, e ímpares;
pelo departamento e pela direção. Nem posso gabar-me de ganhar algo com isso
porque o benefício da subida automática de escalão foi (está) inviabilizada por
um congelamento da carreira docente—o segundo na minha curta vida de 40 anos de
ensino.
O
processo foi contestado, por boas e más razões. Foi, mesmo, contestado na rua,
por 100?—150?—200.000 professores? Bom: por muitos professores, num clima de
festa contra a ministra da educação que, simplesmente, tratara de filmar as
últimas sequências dum guião que já vinha de antes do 25 de abril e, sempre em
crescendo, ministro a ministro, governo a governo, chegara, por fim, ao
paroxismo de eduquês que lhe
conhecemos hoje.
A
ideia deste filme foi congeminada por gente que pouco se importa com o ministro
que tem o prazo em vigor. Essa gente constitui um corpo que a excelente sátira
inglesa retratou na série Yes Minister.
Põem a cabeça de fora quando são mesmo obrigados a isso, mas preferem trabalhar
no sossego dos seus gabinetes, fazendo o que têm a fazer e aturando com um
suspiro sapiente o político de serviço… que está aqui está na rua.
Quer
o Leitor um exemplo recente? Olhe: a formação de professores classificadores de
exames. O ministro Nuno Crato tem um conjunto conhecido de publicações contra o
tal eduquês. E que fazem o GAVE e o
Júri Nacional de Exames? 1.º: mantêm uma suposta (por toda a gente nas escolas)
ação de atualização da informação aos professores que estão prestes a
classificar os exames nacionais; 2.º: não fazem nada disso, antes põem os docentes
a suportar—de vénia pronta e elogio nos lábios—alguns textos da mais arreigada
tradição construtivista—velhos, ainda por cima—em rotineiro desafio às ideias
do responsável pelo organismo que lhes paga o ordenado (ou os honorários), e em
manifesto insulto aos docentes que também descontam para impostos que permitem
ao governo fazer esses pagamentos, e por aí fora, que este tipo de raciocínio é
uma espiral. Sim, senhor ministro.
Então,
e voltando à avaliação de professores?
É
simples: os sábios dos gabinetes do ministério pensam, pensam, e produzem:
O
26/2012 tem dimensões (três, como um estádio de futebol) do desempenho do
pessoal docente: científica e pedagógica, de participação na escola e relação
com a comunidade, de formação contínua e desenvolvimento profissional.
O
26/2012 tem elementos de referência da avaliação (dois, como um relvado):
objetivos e metas do projeto educativo, e parâmetros estabelecidos para cada
uma das dimensões aprovadas pelo conselho pedagógico. (Peço perdão pela
linguagem insignificante, mas estou a transcrever.)
O
26/2012 tem natureza (como a relva sintética do dito relvado), expressa em
componentes: a interna, a externa.
O
26/2012 tem intervenientes (players,
como se diz agora—há jogo, em suma): o presidente do conselho geral, o diretor,
o conselho pedagógico, a secção de avaliação de desempenho docente do conselho
pedagógico, os avaliadores externos e internos e—surpresa!—os avaliados.
O
26/2012 tem procedimento (as táticas, diria o Esteves), expresso em documentos:
o projeto docente, feito com referência às metas e objetivos do projeto
educativo do agrupamento ou escola, o documento de registo e participação nas
dimensões atrás referidas, o relatório de autoavaliação e respetivo parecer do
avaliador—sendo que o relatório incide sobre prática letiva, atividades
promovidas, análise dos resultados obtidos, contributo para os objetivos e
metas fixados no projeto educativo, e a formação realizada e o seu contributo
para a melhoria da ação educativa.
Depois
segue-se um articulado sobre a avaliação, e os recursos (a arbitragem), que
espero que sejam muitos!, e não me sobra ânimo para descrever mais nada. Eu
detesto a maior parte dos efeitos da escrita reformada mas, desta vez, estou
contente por estar a escrever assim, porque me sinto distanciado do 26/2012,
que ainda é escrito «à antiga».
Ufa!
O resultado do jogo é um imenso empate, evidentemente.
Vou
voltar atrás: dizia eu que…
…
há um currículo nacional; é operacionalizado por programas; são postos em
prática por professores, em benefício de estudantes; estes estudantes são
avaliados, numa escala de 0 a 20, por exames periódicos; se estes exames forem
tecnicamente corretos e exigentes, se as classificações dos alunos forem
medianamente satisfatórias (médias superiores a 10, com domínios de
excelência); se, enfim, corresponderem de perto às classificações internas da
frequência, o que há que entender?
Que
o ensino foi de qualidade.
Só se percebe o levantar de questões, as intervenções interna e externa, o circo completo da avaliação à lupa (todo o estádio a
assobiar), se houver razões de queixa. Não será?
Não
percebi o 26/2012.
Sou
estúpido!
António Mouzinho
NOTA: o 26/2012 está a aguardar as várias manobras preparatórias de 2011/2012, pelo que não é aplicado, de momento, aos docentes de carreira (professores com carta de pesados).
NOTA: o 26/2012 está a aguardar as várias manobras preparatórias de 2011/2012, pelo que não é aplicado, de momento, aos docentes de carreira (professores com carta de pesados).
2 comentários:
Sim, ou tudo muda para ficar igual ou tudo fica igual para dar a ideia que muda. E muda? Sim, vai mudando para... pior. Sempre. É a inércia dos "mastodontes", os quais, se têm um "condutor" é apenas para dar a ideia de que ele... conduz.
E (nos) conduz para o mesmo de sempre... A tal inércia... O movimento perpétuo.
Confuso? Não. Estúpido.
Tenho esperança que o Despacho normativo 13-A/2012, este sim, genuíno filho de Nuno Crato, rebente com DReg 26/2012.
A ideia do 13-A é:
CT = K x CAP + EFI + T
A vossa escola quer créditos de tempo (CT)?
Giram melhor os vossos recursos humanos (acabando com as turmas do Novas Oportunidades, por exemplo) e ganham K e CAP.
Querem mais CT’s?
Melhorem os vossos resultados nos exames nacionais, equilibrem as classificações internas de frequência com as de exame, tenham acréscimos superiores ao acréscimo da média anual e ganham EFI.
Querem ainda mais CT’s?
Aceitem agrupamentos (o que elimina uma direcção) e ganham T.
Enviar um comentário