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No Capital, Marx usa a química para dar exemplos e analogias dos conceitos que está a definir.
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No capítulo 1, parte 1, do volume 1, depois de analisar a relação entre a quantidade de tecido, o número de fatos produzidos e o trabalho envolvido, discute a forma relativa do valor das mercadorias tomando o exemplo do ácido butírico (ou butanóico) e do formato de propilo que têm a mesma fórmula molecular C4H8O2 mas propriedades muito diferentes.
Podemos ir buscar uma analogia à química. O ácido butírico e o formato de propilo são dois corpos diferentes, não só na aparência como também nas qualidades físicas e químicas. Contudo, são compostos pelos mesmos elementos: carbono, hidrogénio e oxigénio. Além disso, contêm-nos na mesma proporção: C4H8O2. Se agora equacionássemos o formato de propilo com o ácido butírico ou se o constituíssemos, em seu equivalente, o formato de propilo figuraria nesta relação apenas como forma de existência de C4H8O2, ou seja, da substância que é comum a si e ao ácido. (Karl Marx, O Capital, Centelha, 1974, tradução de J. Teixeira Martins e Vital Moreira, pp. 73-74) [corrige-se o nome de um dos compostos]
Mais adiante, numa nota de rodapé do capítulo 11, Marx refere a nova e revolucionária química orgânica que Gerhardt e Laurent acabavam de introduzir, revelando estar a par dos mais recentes desenvolvimentos desta área da química. Nessa nota, a estrutura dos alcanos CnH2n+2 que varia com n pela adição de radicais metileno CH2, serve de analogia para mostrar a subtileza dos aspectos quantitativos e qualitativos que transformam a acumulação quantitativa de dinheiro e de excedentes numa coisa qualitativamente diferente: o capital.
Infelizmente, o interesse de Marx pela química, talvez tenha levado a um certo amor louco dos Marxistas e socialistas pela química. Junto com os mitos do progresso, os tractores e o endeusamento da industrialização e da tecnologia, tal acabou por ser pouco simpático para esta ciência. Um dos exemplos extremos dessa atracção é a famigerada Elena Ceauşescu, mulher do ditador romeno Ceauşescu (ambos julgados de forma sumária e executados em 1989), cujo nome aparece como sendo co-autora de 48 artigos científicos ISI de química (de 1981 a 1989 com índice h=6). Membro da Academia Romena e agraciada com doutoramentos Honoris Causa e outras distinções honoríficas em vários países não socialistas, como os EUA e o Reino Unido, parece que tinha na verdade uma formação escolar bastante limitada.
Obviamente, o caso anterior não tem qualquer comparação com o percurso científico bem documentado e sério de Angela Merkel, autora de 12 artigos ISI (de 1981 a 1992, com índice h=5) que se doutorou em Química Teórica na antiga Alemanha de Leste e posteriormente, com a queda do muro de Berlim, se dedicou à política, vindo a ser a actual Chanceler da Alemanha. Neste caso a relação entre a química e a política talvez seja furtuita (ou talvez não). Não deixa de ser curioso que Joaquim Augusto Simões de Carvalho tenha escrito em 1850, nas suas Lições de Filosofia Química, que [a]té à política ou arte de governar a Química tem aplicações: para preencher os altos deveres que lhe impõe a sua missão, o homem de Estado deve ser versado em conhecimentos em Química; de outra forma ignoraria sempre as condições de melhoramento e utilidade do seu país.
Marx e a sua família viveram em condições muito difíceis em Londres. Quando Marx morreu, em 1883, estiverem presentes no seu enterro dois membros da Royal Society. A sua campa, no Highgate Cemetery, está a pouca distância da de Michael Faraday. Ambos estão imortalizados na obra que nos deixaram.
[texto com algumas correcções feitas em 17 de Janeiro de 2011]
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