“A história das ciências tem quatro grandes objectivos: os nossos conhecimentos, as nossas opiniões, as nossas disputas, os nossos erros” (Jean Le Rond d’Alembert, (1717-1783)
Se ao debruçarmo-nos sobre a história dos factos podemos avaliar as consequências do passado, para Jean-Michel Rey “a Metafísica e a Religião nos seus esforços conjugados lançaram uma proibição sobre qualquer ciência do corpo”.
Georges Gusdorf (Da História das Ciências à História do Pensamento, Editores Livreiros Ld.ª, Lisboa, 1988, p.1 75) reforça esta acção frenadora da Filosofia no desenvolvimento das ciências do corpo quando afirma que “a biologia aristotélica só foi verdadeiramente ultrapassada depois de um intervalo de 2000 anos”. Ainda segundo o mesmo autor, Aristóteles, com lugar no pódio dos maiores filósofos da humanidade, ao debruçar-se sobre o funcionamento do corpo humano, “baralhou os espíritos durante séculos”.
O próbrio lançado por Platão sobre o corpo, "túmulo em vida da alma", é contrariado quando a res extensa assume uma inesperada dignidade como matéria pútrida, sem sopro de vida ou nobreza de alma. A pompa das cerimónia fúnebres como que recompensa o descuido que lhe foi devotado em vida, não tendo esse tardio remorso consentido a dissecação dos cadáveres, retardando, assim, de séculos o estudo da anatomia humana.
Segundo Rasch & Burke (Cinesiologia e Anatomia Aplicada: A Ciência do Movimento Humano, Editora Guanabara Koogan S.A., Rio de Janeiro, 1977, p. 2), “antes do século XVIII poucos músculos tinham nomes: nas suas ilustrações, Galeno, médico da antiga Roma, usou números e Da Vinci letras”. Desta forma, a medicina marcou passo até atingir o alvará científico de que hoje goza, pese embora o seu avanço se ter ficado a dever, em grande parte, a cientistas de outros ramos do conhecimento, como Pasteur (1822-1895), no domínio da Biologia (microbiologia), e Marie Curie (1867-1934), no âmbito da Física (radioactividade).
Reforça este statu quo Lewis Thomas (1913-1993), médico norte-americano que diversificou a sua actividade entre os mundos da ciência e das humanidades, antigo presidente do Memorial Sloan-Kettering Cancer Center. na vanguarda mundial do estudo e tratamento de doenças do foro oncológico. Escreveu ele:
“A história da medicina nunca foi assunto particularmente atraente no ensino médico e uma das razões é tratar-se de uma história deveras deplorável. Costuma situar-se a data do início da medicina moderna por meados dos anos 30. Com a entrada das sulfamidas e da penicilinas na farmacopeia é habitual atribuir-se a esses acontecimentos a força de uma revolução ma clínica médica (…) os médicos podiam curar doenças e isto era assombroso, sobretudo para os próprios médicos (descobriu-se, por alturas de 1830, que quase toda a medicina dessa época era um disparate (…) durante séculos, a medicina foi puro jogo de advinhas do mais grosseiro empirismo. É difícil imaginar tarefa menos científica entre as realizações humanas. É surpreendente que a profissão tenha sobrevivido tanto tempo e tenha suscitado tão poucos protestos. Quase todos pereciam prontos a deixar-se ludibriar”, etc.
Por seu turno, o médico e escritor Fernando Namora, em Retalhos da Vida de um Médico (1949), dá-nos conta do pouco cientismo da arte de curar do seu tempo, ao escrever: “Quando regressei à vila já ia preparado: soro, sulfamida, arsénico, iodo – a rotina de sempre”. Eu próprio em criança sofri as torturas das papas de linhaça, os vómitos do óleo de rícino, os calores do algodão iodado e, não sei mesmo, se a sucção das ventosas, pequenos frascos de vidro de boca larga que hoje teriam a utilidade de boiões de iogurtes.
Mas do mal o menos! Das sanguessugas que, ao que se dizia, nos chupavam os humores perniciosos do sangue me livrei eu, graças a Deus. Mas, apesar de todo este tormentoso arsenal de “curas milagrosas”, muitas vezes, com efeito de placebo, continuo a comungar da opinião de Proust (1871-1922): “Crer na Medicina é suprema loucura, se não crer nela não fosse loucura maior”. E ele sabia do que falava por experiência própria de uma saúde frágil desde a infância com crises constantes de asma.
Quiçá este reviver de tempos chegados na vida da história da Medicina refreie ímpetos de descrença nos caminhos científicos da actividade física por a filosofia de René Descartes ainda muito pesar na tradição cultural do mundo ocidental (o historiador Robert Aron chega mesmo a responsabilizar a demasiada assimilação do cartesianismo pela actual fraqueza do Ocidente), dando azo à promíscua recordação de esplêndidas bestas em que um corpo musculado e de boa saúde era tido como a renúncia das coisas do espírito que muitas boas almas ainda hoje associam a franzina compleição física, a pálida tez ou, quando não mesmo, a um romântico tossicar de bacilo de Koch.
Mas teve este país como triste fado ser a pátria envergonhada de uma raça enfezada, de corpos enfermiços ou do fluir de sangue anémico nas veias?
Se ao debruçarmo-nos sobre a história dos factos podemos avaliar as consequências do passado, para Jean-Michel Rey “a Metafísica e a Religião nos seus esforços conjugados lançaram uma proibição sobre qualquer ciência do corpo”.
Georges Gusdorf (Da História das Ciências à História do Pensamento, Editores Livreiros Ld.ª, Lisboa, 1988, p.1 75) reforça esta acção frenadora da Filosofia no desenvolvimento das ciências do corpo quando afirma que “a biologia aristotélica só foi verdadeiramente ultrapassada depois de um intervalo de 2000 anos”. Ainda segundo o mesmo autor, Aristóteles, com lugar no pódio dos maiores filósofos da humanidade, ao debruçar-se sobre o funcionamento do corpo humano, “baralhou os espíritos durante séculos”.
O próbrio lançado por Platão sobre o corpo, "túmulo em vida da alma", é contrariado quando a res extensa assume uma inesperada dignidade como matéria pútrida, sem sopro de vida ou nobreza de alma. A pompa das cerimónia fúnebres como que recompensa o descuido que lhe foi devotado em vida, não tendo esse tardio remorso consentido a dissecação dos cadáveres, retardando, assim, de séculos o estudo da anatomia humana.
Segundo Rasch & Burke (Cinesiologia e Anatomia Aplicada: A Ciência do Movimento Humano, Editora Guanabara Koogan S.A., Rio de Janeiro, 1977, p. 2), “antes do século XVIII poucos músculos tinham nomes: nas suas ilustrações, Galeno, médico da antiga Roma, usou números e Da Vinci letras”. Desta forma, a medicina marcou passo até atingir o alvará científico de que hoje goza, pese embora o seu avanço se ter ficado a dever, em grande parte, a cientistas de outros ramos do conhecimento, como Pasteur (1822-1895), no domínio da Biologia (microbiologia), e Marie Curie (1867-1934), no âmbito da Física (radioactividade).
Reforça este statu quo Lewis Thomas (1913-1993), médico norte-americano que diversificou a sua actividade entre os mundos da ciência e das humanidades, antigo presidente do Memorial Sloan-Kettering Cancer Center. na vanguarda mundial do estudo e tratamento de doenças do foro oncológico. Escreveu ele:
“A história da medicina nunca foi assunto particularmente atraente no ensino médico e uma das razões é tratar-se de uma história deveras deplorável. Costuma situar-se a data do início da medicina moderna por meados dos anos 30. Com a entrada das sulfamidas e da penicilinas na farmacopeia é habitual atribuir-se a esses acontecimentos a força de uma revolução ma clínica médica (…) os médicos podiam curar doenças e isto era assombroso, sobretudo para os próprios médicos (descobriu-se, por alturas de 1830, que quase toda a medicina dessa época era um disparate (…) durante séculos, a medicina foi puro jogo de advinhas do mais grosseiro empirismo. É difícil imaginar tarefa menos científica entre as realizações humanas. É surpreendente que a profissão tenha sobrevivido tanto tempo e tenha suscitado tão poucos protestos. Quase todos pereciam prontos a deixar-se ludibriar”, etc.
Por seu turno, o médico e escritor Fernando Namora, em Retalhos da Vida de um Médico (1949), dá-nos conta do pouco cientismo da arte de curar do seu tempo, ao escrever: “Quando regressei à vila já ia preparado: soro, sulfamida, arsénico, iodo – a rotina de sempre”. Eu próprio em criança sofri as torturas das papas de linhaça, os vómitos do óleo de rícino, os calores do algodão iodado e, não sei mesmo, se a sucção das ventosas, pequenos frascos de vidro de boca larga que hoje teriam a utilidade de boiões de iogurtes.
Mas do mal o menos! Das sanguessugas que, ao que se dizia, nos chupavam os humores perniciosos do sangue me livrei eu, graças a Deus. Mas, apesar de todo este tormentoso arsenal de “curas milagrosas”, muitas vezes, com efeito de placebo, continuo a comungar da opinião de Proust (1871-1922): “Crer na Medicina é suprema loucura, se não crer nela não fosse loucura maior”. E ele sabia do que falava por experiência própria de uma saúde frágil desde a infância com crises constantes de asma.
Quiçá este reviver de tempos chegados na vida da história da Medicina refreie ímpetos de descrença nos caminhos científicos da actividade física por a filosofia de René Descartes ainda muito pesar na tradição cultural do mundo ocidental (o historiador Robert Aron chega mesmo a responsabilizar a demasiada assimilação do cartesianismo pela actual fraqueza do Ocidente), dando azo à promíscua recordação de esplêndidas bestas em que um corpo musculado e de boa saúde era tido como a renúncia das coisas do espírito que muitas boas almas ainda hoje associam a franzina compleição física, a pálida tez ou, quando não mesmo, a um romântico tossicar de bacilo de Koch.
Mas teve este país como triste fado ser a pátria envergonhada de uma raça enfezada, de corpos enfermiços ou do fluir de sangue anémico nas veias?
Para o historiador João de Barros, o Vice-rei Afonso de Albuquerque era “fragueiro e pouco mimoso na sua pessoa, só se lançando na cama quando mais não podia"; e o Infante D. Henrique “tinha largos ombros e fortes membros acompanhados de carne, a cor da qual era branca e corada que bem demonstrava a boa compleição de humores”. De Luís de Camões, que viria a ser respeitável entre aqueles que ele próprio cantou como personagens que “por obras valorosas da lei da morte se vão libertando”, chega-nos o testemunho da sua força e coragem físicas por façanhas de que muito se orgulhava, dizendo só ser vulnerável pelas solas dos pé, e que essas ninguém lhas vira ou as havia de ver!
Ao serviço da coroa e da grei, foram eles exemplos duma perfeita harmonia entre corpos sãos em mentes sãs, de que nos fala Juvenal em uma das suas Sátiras. Pelo contrário, em nossos dias, em que surgem cada vez mais doenças apelidadas de hipocinéticas (originadas pelas longas horas de sedentarismo passadas frente à televisão e computadores) do foro reumático e cardiovasculares, diabetes, obesidade, em estranho e funesto paradoxo, a ginástica tida por Ramalho Ortigão como uma”alta e grave questão de sobrevivência nacional”, não parece suficiente para mudar a opinião de pessoas amputadas na sua cultura, por uma perspectiva mutilada e mutilante do homem completo.
E isto é tanto mais de estranhar numa época que se rendeu ao bronzeamento como moda estival, à ginástica como cinzel de corpos esbeltos e bem musculados, aos Jogos Olímpicos da era moderna com as suas estátuas em movimento no alcance de horizontes de “Citius, Altis, Fortis”. Por outro lado, a documentada influência da disciplina da Educação Física escolar num melhor rendimento das disciplinas ditas intelectuais deveria ter desfocado e amarelecido o retrato de uma sociedade em que o corpo continua a viver os resquícios de uma coisa tolerada.
Mas, seja como for, as promissoras conquistas científicas do nosso tempo deram carta de alforria e estatuto universitário às actividades corporais permitindo-lhes encontrar respaldo para parafrasear Proust: Crer nos benefícios da prática do exercício físico (decretados pela própria Organização Mundial de Saúde) pode ser suprema loucura se não crer neles não fosse loucura maior.
26 comentários:
ESPÍRITO OLÍMPICO
Mais alto, mais depressa, mais possante,
em honra pan-helénica dos deuses,
era a norma prescrita por Elêusis
para alcançar o prémio respeitante.
Em paridade todos os helenos
na palestra de Olímpia disputavam
o primeiro lugar a que aspiravam
numa modalidade... pelo menos.
Morreu a Grécia há mais de dois mil anos,
mas o seu ideal competitivo
ainda agora permanece vivo.
Só que nas actuais competições
são planetárias as motivações
que põem à prova os músculos humanos!
JOÃO DE CASTRO NUNES
«Galeno , médico da antiga Roma, usou números e Da Vinci letras”. Desta forma, a medicina marcou passo até atingir o alvará científico de que hoje goza»
Pensar que dar nomes a coisas em vez de as enumerar é necessário para algo ser ciência é tão ignorante que nem merece mais comentários.
E lembrem-se: quanto mais citarem mais válidas são as ideias que apresentam. Se for Proust ou Camões tanto melhor!
Prezado João de Castro Nunes:
Muito apreciei a visão humanística que transmitiu sobre os antigos Jogos Olímpicos em que se competia por um lugar no pódio no simples alcance de uma coroa de louros a ornar a fonte de quem lançasse mais longe, saltasse mais alto ou fosse mais veloz.
Quis o barão Pierre du Coubertin recuperar para os tempos modernos esse ideal agonístico transportando-o para o desporto amador, logo desvirtuado pela participação de atletas profissionais os Jogos Olímpicos a ponto de eles se confundirem com campeonatos mundiais das diversas modalidades desportivas em que se ganham rios de dinheiro.
Diz, a certa altura, que "são planetárias as motivações" (dos Jogos Olímpicos, pelo que depreendi). Se me é permitido acrescentar, mesmo depois da queda do Muro de Berlim essas motivações continuam políticas em nome de um país, de uma bandeira ou mesmo de uma supremacia racial de que foram expoentes os Jogos Olímpicos de Berlim para descrença da superioridade da raça ariana.
Cordialmente,
Rui Baptista
Anónimo (10 de Abril, 13:53):
Vai-me desculpar a insistência (que por si, concedo, pode, até, ser tomada por simples teimosia ou mesmo insolência), mas o facto dos músculos serem enumerados em vez de serem referidos com os actuais nomes de origem latina, “de per se”, não justifica o atraso da Medicina como ciência.
Mas justifica que “a anatomia como matéria, como se ensinava antes da época de Marie Françoise Xavier Bichat(1771-1802), consistia em pouco mais do que afirmações dogmáticas transmitidas através dos anos”. Como deve saber Galeno viveu e morreu na Roma Antiga (como deixei escrito no post) e Da Vinci, nasceu e morreu, respectivamente, em 1452-1519. Ou seja, anos antes do tempo em que a anatomia “consistia em pouco mais do que afirmações dogmáticas” (sic.). Mais uma transcrição (entre aspas!) pela honradez de me não querer apropriar de textos de gente ilustre fazendo-os fazer passar por meus.
Por outro lado, como sabe a ciência identifica-se com uma terminologia própria para que os seus cultores não falem em alhos para designarem bugalhos. Já pensou, por momentos, qual o crédito da Astronomia actual se e vez dos planetas e estelas do sistema solar terem nomes fossem referenciados por algarismos? Como deve saber, também, sempre que é descoberto uma nova estrela ou um novo planeta, a preocupação dos astrónomos é baptizá-los quanto antes.
Como deve saber, ainda, o grande salto da Medicina ficou-se a dever ao desenvolvimento da técnica cirúrgica (beneficiada pela prática alcançada nos campos de batalha da II Grande Guerra Mundial) e dos meios auxiliares de diagnóstico; tomografia axial computorizada, tomografia por emissão de positrões, etc.
Os exemplos que apresentei das ventosas, das papas de linhaça, etc., deixam essa prática médica, ainda de meados do século XX, criticada impiedosamente por Lewis Thomas (1913-1993), a anos-luz da Medicina científica dos nossos dias.
Foi essa, e apenas essa, a mensagem que tentei passar por si tida como “uma ignorância que nem merece mais comentários”. Entendo, com bastos motivos para isso, que esta análise melhor se aplica a comentários seus que eu aceitei, apenas, como dois dos quatros objectivos da história das ciências:”opiniões e erros”.
Quanto às citações (por si referidas) que fiz de Proust e de Camões devem-se ao facto, servindo-me de uma outra citação, esta de Oscar Wilde, “de eu ser um pessoa simples, contentando-me com o melhor”.
Para terminar, gostaria que me concedesse o favor de ler calmamente o meu post para não tomar uma pequena parte dele pelo seu todo. Antecipadamente grato,
Rui Baptista
Prezado Rui Baptista:
Olhe que, por ter algumas manchas, o sol não deixa de ser sol, ao menos por enquanto.
Quanto à fórmula olímpica, permita a rectificação: "Citius, altius, fortius". O mais... é poesia, goste-se ou não!
JCN
Prezado JCN:
"Touché: "Citius, altius, fortius". O útil Latim aprendido nos meus já remotos tempos de liceu (4.º, 5.º e 6.º anos do segundo ciclo, o terceiro ciclo, 7.º ano, foi cumprido na então chamada Secção de Ciências) desculpa, mas não justifica, o erro grosseiro de que me penitencio: "mea culpa".
"Aprender até morrer", e ficar grato a quem nos ensina tem sido o lema da minha vida. E que muito útil me tem sido.
Cordialmente,
Rui Baptista
Caro JCN
Tem razão o seu reparo de que a ordem é citius, altius, fortius, e não longius, altius, citius.
De resto no texto do post o Dr. Rui Baptista utiliza aforismo correcto citius, altius, fortius, mas ao exprimi-lo deu-lhe outra conotação, alterando a ordem, suprimindo o fortius e substituindo-o pelo longius que não faz parte da família.
Tudo bem, mas, embora consagrando o trio citius, altius, fortius, repare que no soneto dedicado ao "Espírito Olímpico" se observa igualmente a troca da ordem,:
Mais alto, mais depressa, mais possante,
altius citius fortius
Compreendo que houve uma liberdade poética.
Como compreendo que possa ter havido uma liberdade prosaica no autor do post.
Cordialmente
Meu caro João Boaventura:
Pior a emenda que o soneto! O que está em causa na minha observação não é a ordem dos termos, pois mais uma vez me cabe dizer que neste, como em outros casos, a ordem dos factores... é meramente arbitrária. A questão reside nos próprios termos morfologicamente errados. Não reparou? Ollhe que não é "altis", nem "fortis", como escreve Rui Baptista, mas "altius" e "fortius". Trata-se da forma neutra dos respectivos adjectivos no grau comparativo. Quanto ao "longius", não faz parte da fórmula. Deve ser da sua lavra. Todos temos o direito a qualquer espécie de liberdade!
JCN
Permita, meu caro Dr. Rui Baptista, que, em homenagem à sua honestidade mental, lhe dedique esta desprenteciosa quadra de clássico recorte:
A coroa de louros, meu amigo,
era peculiar do Lácio antigo
enquanto que da Grécia toda inteira
era do verde ramo da oliveira!
JCN
Caro JCN
Tudo tem sua explicação e seu reparo, a que me obrigo.
Entendi a sua chamada de atenção ao citius, altius, fortius, como dois em um.
1.º correcção do altis e fortis, por altius e fortius
2.º chamada muito subtil de atenção para, se o Dr. Rui Baptista sabe que a ordem é citius, altius fortius, no correr do teclado escrevera, na 1.ª resposta ao comentário de JCN, o seguinte:
...coroa de louros a ornar a fonte de quem lançasse "mais longe", saltasse "mais alto" ou fosse "mais veloz"...
Considerando que o "mais longe" (longius) desenharia "o mais forte", teríamos "fortius, altius, citius", o que contrariava a ordem do trinómio: "citius, altius, fortius"; aí considerei ter havido uma liberdade prosaica do Dr. Rui Baptista.
Comparativamente, não tenho a menor dúvida que JCN também sabe a ordem do lema olímpico
altius, citius, fortius, e que a alterou no início do soneto para altius, citius, fortius; aí visionei uma liberdade poética de JCN.
A explicação que era devida ao que então tinha expendindo tão aumariamente.
Cordialmente
Aproveito a oportunidade para esclarecer que o lema CITIUS, ALTIUS, FORTIUS, inscritas por cima da porta de entrada do Albert Le Grand School, foi criado pelo padre Henri Martin que o instituiu como pedra de toque a seguir pelos estudantes, não apenas mentalmente mas também nos desportos com que os incitava a praticarem.
Pierre de Coubertin fez uma prospecção sobre a prática desportiva nos colégios ingleses e americanos como forma de ponderar se os Jogos Olímpicos da Era Moderna que sonhava instituir, teria instrumentos suficientes para concretizá-los.
Nos encontros que teve com o padre Henri Martin acolheu o lema Albert Le Grand School como o mais adequado para os Jogos Olímpicos.
Como nos ensina a massa crítica, uma coisa leva a outra. Assim o citius, altius, fortius, introduzido nos Jogos Olímpicos, instigava os atletas a serem mais rápidos, a saltarem mais alto, a serem mais fortes.
O efeito perverso do lema foi o ponto de partida para o profissionalismo desportivo porque, para se ser cada vez mais rápido, saltar mais alto, e ser mais forte, era necessário dedicar mais tempo aos treinos, donde resultou a redução do tempo de trabalho e aumento do tempo de treino, porque a perfeição, a excelência de qualquer espectáculo exige a dedicação exclusiva ao desporto.
1)A medicina durante muito tempo não foi cientifica, ia evoluindo à medidas das possibilidades, com conhecimentos empíricos, os médicos com aprendizes eram como os mestres construtores das catedrais, iam passando os conhecimentos aos discípulos, conhecimentos científicos misturados com mitologias, preconceitos e ignorância, conhecimentos que se foram refinando deixando de lado progressivamente a ignorância e os mitos.
2) a medicina como a ciência não avançou mais também por causa da igreja, por muito que custe aos senhores padres a igreja a partir do fim da idade média até hoje só têm sido um estorvo e um empecilho na evolução cientifica.
Eram proibidas as dissecações e outras coisas, não devido essencialmente à religião, pois não havia nada na doutrina antiga que o impedisse, era mais uma das muitas omissões e lacunas preenchidas á posteriori, mas sim porque os padres perceberem que se permitissem que tais práticas avançassem, dissecação, observações dos nus (nem se conhecia cientificamente bem os órgãos genitais externos!), experiências e teorias várias, lembremos galileu, a igreja ia perder poder, porque sabia que não tinha hipótese de se opor ao novo conhecimento nem de o aprender em tempo útil, dai mata-lo à nascença!
Hoje se estamos doentes do corpo ou da mente, vamos ao médico ou ao psicólogo não ao padre!
Depois a medicina tornou-se cientifica, excluindo todas ou quase todas as palermices que lhe estavam agarradas.
Mas esse processo demorou, só deu um grande pulo após a segunda guerra mundial.
Nos anos 30 os conhecimentos de embriologia eram quase os mesmos que no tempo de Darwin, até se duvidava da forma como eram transferidos os genes, coisa desconhecida antes da II guerra mundial, pelo - o actual conceito que temos deles, bastam lerem livros da especialidade dos anos 30!
A questão é que mesmo que os médicos tenham influência e poder na sociedade eles não dirigem os países, cabe à sociedade e aos governos em colaboração com a medicina incitar as pessoas a boas práticas.
Todos sabemos da falta de exercício mas a preguiça fala mais alto muitas vezes, isso depois paga-se caro fisicamente e economicamente ao pais!
Urge recuperar a mentalidade do exercício físico que existia nos fins do séc. XIX e início do XX!
Em primeiro lugar sou o Manuel e não o "Anónimo (10 de Abril, 13:53)". Se quisesse ter sido o anónimo tinha escolhido essa opção.
"Já pensou, por momentos, qual o crédito da Astronomia actual se e vez dos planetas e estelas do sistema solar terem nomes fossem referenciados por algarismos?"
Vou presumir que por "estelas" queira dizer estrelas (ambas existem mas são bem diferentes). Uma simples gralha.
O crédito intrínseco seria o mesmo. O crédito dado por quem acha que quem diz alguma coisa influi na validade da mesma (como parece ser o seu caso) poderá ser menor ou até nulo. Na realidade a maioria dos corpos celestes têm nomes que não passam de números.
"Mais uma transcrição (entre aspas!) pela honradez de me não querer apropriar de textos de gente ilustre fazendo-os fazer passar por meus."
Nem o acusei disso até porque cita com toda a correcção. Acusei-o sim de utilizar argumentos de autoridade para provar deduções utilizando citações irrelevantes de pessoas com "prestigio" para o obter por associação. O que digo é simplesmente que isso nao altera em nada as ideias sobre as quais escreve mas chateia pela irrelevância.
Caro Joáo Boaventura:
Dando de barato a sua pretensão de ensinar o pai-nosso ao vigário, insisto em três aspectos do meu reparo:
1º estou-me nas tintas para a ordem da fórmula em questão, perfeitamente arbitrária;
2º crispou-me os nervos, comolatinista, a forma incorrecta dos termos "altis" e "fortis", como honestamente reconheceu o Dr. Rui Baptista, que a mais não é obrigado pela sua formação escolar;
3º a ordem que dei à fórmula olímpica no começo do meu soneto não se insere em qualquer tipo de liberdade poéticca, mas foi tão-só motivada por um mero imperativo de natureza métrica... ao som do violino! Viva a musicalidade em detrimento de prosaicas trivialidades de lógica mental! Poesia... é poesia. E o resto... são cantigas de arroz pardo, como sói dizer-se nas terras frias e rudes de Aquilino.
Cordialmente.
JCN
Caro Anónimo das 19:25
Se nos permite há outra versão sobre a história da Medicina, diferente da que propõe, pelo que se adianta em resumo a que perfilhamos.
A arte médica foi, nos seus primórdios, desempenhada por clérigos, bispos, priores, monges e sacerdotes, desenvolvendo-se nos conventos e confrarias o ensino regular da Medicina, cultivando-se nos seus hortos as plantas para usos medicinais. Os próprios estabelecimentos hospitalares da Edade Média estavam em geral anexos aos institutos religiosos, às residências episcopais e até aos simples presbíteros.
Ribeiro Sanches explicou que “pela destruição do Império Romano na Europa e pela dominação das Nações Bárbaras do Norte se refugiaram as Ciências nos Conventos, e nos Cabidos; e que desde aquele tempo, começaram os Frades e os mais Eclesiásticos a praticar a Medicina; chegou a tal excesso aquele abuso que foi proibido aquele exercício a todos os Eclesiásticos por muitos Concílios”.
A Igreja objectava que não se enquadrava na doutrina cristã a aceitação de honorários pelas curas, e o receio de ocorrerem mortes dos pacientes por inépcia. A proibição promulgada no Concílio de Reims (1131) parece não ter obtido nenhuma resposta, pelo que a obstinação continuada levou a Igreja a promulgar sucessivos Concílios: o de Latrão (1139), o de Montpellier (1162), o de Tours (1163) proibindo a prática da cirurgia, o de Paris (1212), o 2.º de Latrão (1215), e o de Le Mans (1247).
Só quando a Medicina se tornou secular, com a criação das escolas médicas, a classe eclesiástica passou a desempenhar as funções teológicas que lhe eram inerentes. E, assim como as escolas médicas recolheram os ensinamentos das ordens religiosas, assim as futuras escolas de educação física iriam recolher os saberes da classe médica.
Cordialmente
Caro Manuel:
Na verdade escrever "estelas" por estrelas, foi um simples "lapsus calami" (aliás, por si próprio reconhecido) do qual me penitencio perante as possuidoras deste nome próprio.
A minha penitência, outro tanto, por ter omitido o seu nome próprio. Ora, como escreveu, Camilo Castelo Branco, “pode-se asnear nos tratamentos; mas na gramática gira mais fino”. Daqui a minha dupla penitência!
Quanto a ter ou não gostado do meu "post" é um direito que lhe assiste, mas que o não deve autorizar a ver nele a intenção megalómana de eu me utilizar "de citações irrelevantes de pessoas com 'prestígio´ para o obter por associação".
Tudo o resto que escreveu, desculpe a sinceridade da minha crítica, são opiniões meramente pessoais que eu respeito pelo direito democrático que lhe assiste ao contraditório. Mas que penso, com o devido respeito, pouco terem acrescentado à matéria em discussão embora saiba poder ser eu, agora, a correr o risco de me tornar juiz em causa própria. Assumo esse risco!
Caro Anónimo (11 de Abril, 19:25):
Grato pela perspectiva que trouxe para a história da Medicina, seus êxitos e fracassos, avanços e retrocessos, suas causas e efeitos.Igualmente, pelo comentário de João Boaventura que o completou com novas achegas.
Cordialmente,
Prezado JCN:
Mais uma vez, lhe devo a gratidão de me ter ensinado (em quadra que me dedica) que a coroa de louros "era peculiar do Lácio antigo".
Costumo dizer (e repito-o, agora, com maior convicção)que os comentários muito valorizam os "post's" quando a intenção é mesmo essa e quem os recebe tem a humildade de saber que se aprende até morrer.
Cordialmente,
"Tudo o resto que escreveu, desculpe a sinceridade da minha crítica, são opiniões meramente pessoais que eu respeito pelo direito democrático que lhe assiste ao contraditório."
Deve ter lido apenas o que lhe interessou da forma como lhe interessou. Também escrevi:
" Na realidade a maioria dos corpos celestes têm nomes que não passam de números."
Pode ser tudo menos meramente uma opinião visto ser facilmente verificavel ou falsificável.
A procura das estrelas é feita utilizando a posição ou identificadores (HST ID por exemplo com 10 dígitos).
HST quer dizer Hubble Space Telescope.
Fico muito triste de isto implicar segundo o que escreveu uma perda de crédito da astronomia. Uma tragédia a que os astrónomos certamente se irão dedicar.
Com isto espero ter provado que o que escrevi não foram apenas opiniões como pretende passar.
Q.E.D. (latim para que sempre reconheça algum valor ao meu comentário)
Sugiro que escreva um post onde explique que segundo os seus critérios a Astronomia está na idade das trevas tal como a Medicina estava antes de atribuir nomes aos músculos.
Agradeço desde já a sua autorização deste comentário a bem do contraditório que tanto valoriza.
Caro JCN
Se para o caro JCN, como latinista, a ordem é arbitrária - julgo que é uma liberdade poética - na qual, se me permite, não acredito.
Quando digo citius, altius, fortius, respeito o direito do seu autor, o padre Henri Martin, do Albert Le Grand School, e o do Comité Internacional Olímpico que o consagrou como lema dos Jogos.
Portanto há duas instituições que detêm a sua criação, pelo que, a elas associamos o lema.
Claro está que, apesar destas condicionantes, ninguém me impede o uso arbitrário da ordenação dos adjectivos, mas quando a formulo, delas me divorcio.
Da mesma forma, quando digo "alea jacta est", respeito o direito do seu criador, Júlio César, e ninguém me autoriza que arbitrariamente escreva ou diga "est jacta alea", ou "jacta est alea".
Bem sei que no primeiro caso se trata de três adjectivos sem ligação entre eles, que a gramática o permite, e que o "alea jacta est" se trata de uma oração que a gramática consagra.
Nestas circunstâncias, também não me posso divorciar da ordenação, pelo respeito que tenho à gramática.
Mas, seria pedir muito que, meu caro JCN, respeitasse a ordem estabelecida pelo padre Henri Martin, e consagrada como lema pelo Comité Internacional Olímpico?
Bem entendo que sou o vulgus veritatis pessimus interpres, pelo que terminarei, como vox nihili, com o meu habitual
Cordialmente
Caro Manuel:
Que me seja perdoada a teimosia da insistência, se de teimosia se trata: quando as estrelas são observados pela primeira vez são "baptizadas" com números, mas rapidamente esses números se transformam em nomes.
Mas eu não sou especialista na matéria e concedo, como tal, estar a emitir uma simples opinião que desejava devidamente fundamentada ou refutada por quem de direito pelo grande respeito que me merecem a Astronomia e as suas revolucionárias descobertas do tempo de Galileu (século XVII), tidas como heréticas pela Inquisição.
O respeito que me merecem os leitores e os factos científicos (ainda que sujeitos ao princípio da refutabilidade de Karl Popper), aconselham-me a não ir além da chinela, deixando ao cuidado dos astrónomos o desfecho desde diferendo que corre o risco de se tornar numa espécie de “discussão sobre o sexo dos anjos” em que num comentário seu o acessório de um comentário meu cedeu lugar ao principal do meu “post”. Valeu?
Não acha, meu caro João Boaventura, que é prosa a mais... para coisa tão pequena?... Olhe que "de minimis non curat praetor". JCN
caro rui baptista,
se tivesse consultado o link deixado pelo manuel tiraria duas rápidas conclusões:
1) é bastante provável o manuel saber do que fala;
2) é bastante provável você não saber do que fala.
Faz ideia da quantidade de estrelas que são conhecidas? Se a baptizarmos todas com nomes, há nomes suficientes? E admitindo que sim, que interesse terá isso?
Não vá o diabo tecê-las: na 2.ª linha do 1.º § do meu último comentário, emendo "observados" para observadas.
Caro anónimo (20:21):
Eu próprio já reconheci a probabilidade (mais do que probabilidade, até) do meu lapso de natureza astronómica, mas que, em minha opinião, não merecia que o essencial da tese defendida no meu post se transformasse numa discussão de coca-bichinhos.
Apresenta-me agora você a probabilidade do Manuel saber do que fala e eu não. Aceito por haver a probalidade dessa fala vir de um especialista na matéria. Estarei enganado?
Quanto às estrelas terem nome, muitas há que o têm. Sobre a vantagem do baptismo, caso não houvesse, não teriam todas elas apenas números?
Resta-me agradecer o seu esclarecimento por haver, também, a probalidade de estar face a um parecer técnico. Estarei enganado, uma segunda vez?
Caro JCN
Porque a sua sintética resposta me faz lembrar a raínha Victoria para quem as coisas menores a aborreciam, ocorre-me uma frase que respinguei de um dos romances de Somerset Maugham, onde um personagem, depois de ouvir perorar duas pessoas sobre um determinado tema, teve esta interrogação introspectiva que cito de cor:
"Porque será que um assunto é tão importante para um e tão insignificante para outro?"
Eis a razão da minha persistência na minha causa.
Será mais um casus conscientiae, mas nunca um casus belli.
De qualquer forma foi um prazer dialogar com o meu caro JCN. Vive et vale.
Cordialmente
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