sábado, 16 de julho de 2022

"As escolas deviam ser lápis e papel e seres humanos e livros"

Timothy Snyder, professor de História na Universidade de Yale, tem-se empenhado em pensar, conjuntamente, os Estados Unidos da América e a Europa no que respeita, sobretudo, aos valores que são a democracia e a liberdade. A sua leitura é histórica, sociológica e filosófica mas também psicológica; o presente e o futuro ocupam o centro da sua obra. Por isso, toca a educação. Numa entrevista para Portugal (ver aqui) disse, sobre a educação, ao minuto 14:30, o seguinte:
 
"[A educação é muito importante para a democracia]. Não só ensinar às pessoas a Constituição (...) e a História, mas ensinarmos a História de como o país não costumava ser democrático, o que é verdade para quase todos nós. Mesmo nos EUA a maioria da nossa História não é totalmente democrática (...) envolve a escravatura ou a discriminação contra afro-americanos. Raramente fomos uma democracia plena e isso é verdade em todo o lado. 
Mas também refiro educação no sentido geral de ensinar os jovens a participar no mundo real. O mundo real, esse mundo de seres humanos, espaços públicos, manifestações e por aí fora é o mundo democrático. 
O mundo das redes sociais (…) é algoritmos, não é um mundo democrático. É um mundo antipolítico, um mundo que nos isola e que nos torna menos esclarecidos e menos capazes de participar numa democracia (…). 
Acho que a digitalização das escolas é um erro. Acho que deviam ir exactamente no sentido oposto. Acho que os aparelhos digitais deviam ser banidos das escolas. Então, as escolas deviam ser lápis e papel e seres humanos e livros. 
As crianças podem estar ao telefone e no computador nas outras 16 horas do dia (…). Mas acho que as escolas e universidades, tanto quanto possível, deviam conscientemente tentar construir espaços humanos onde os olhos das pessoas estão nos livros ou nos rostos de outras pessoas e não nos écrans. 
E se quisermos um argumento para isto pensemos na pandemia. A pandemia deu-nos o extremo da educação digital e tem sido horrível. Não há ninguém no mundo que diga “Tem sido óptimo ter educação digital”. Vamos admitir, não tem sido. Há muito recursos por trás, muitas pessoas inteligentes e ricas em Silicon Valley, dizem que isto é o futuro, mas não é. Basicamente, estar sentado em casa a fazer zoom é o equivalente a estar de férias, do nosso ponto de vista. Não são férias no sentido de ser divertido, são férias onde não aprendemos nada."

4 comentários:

T. Ângelo disse...

A "digitalização" da escola não passa de uma ideologia. Nada se ensina sobre a história da computação ou até mesmo sobre a história da electricidade. Existe uma tendência recorrente em esconder a tecnologia da vista e dos sentidos em geral. Acho que a educação deveria ir no sentido de ajudar a perceber como a tecnologia funciona e não como "nós a utilizamos". São bastantes os exemplos de várias tecnologias que foram inventadas com um propósito e utilizadas com outro. Se os alunos perderem esta perspectiva muito facilmente se tornam escravos da "tecnologia".

Helena Damião disse...

Prezado Leitor, o autor mencionado diz isso na entrevista: os nossos alunos precisam de saber como a tecnologia funciona, que estratégias são usadas para tornarem os utilizadores dependentes, etc. Cordialmente, MHDamião

Anónimo disse...

Cara Blogger. Obrigado

Anónimo disse...

É a velha questão do equilíbrio: as escolas EB 1,2,3 + JI + S devem apenas usar um dos pratos da balança, sobrecarregando-o com redes e plataformas digitais online, ou privilegiar os espaços e tempos reais de aprendizagem, em sala de aula ou em saídas de trabalho no campo?
Reconheço o quase insignificante papel desempenhado pelo Estado Português, praticamente falido, no gizar das grandes linhas programáticas das políticas educativas mundiais, em que os EUA ainda são quem tem a faca e o queijo nas mãos, mas a nossa subserviência, que já chega ao ponto de desistirmos de ensinar e aprender nas escolas, para que a ignorância seja a bitola comum de todos os cidadãos democráticos, é uma vergonha!
A Literatura, com livros, e a Ciência, com livros e experiências, são os alicerces onde se apoiam as escolas secundárias.

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