Com a devida vénia, e subscrevendo a homenagem a Armando Policarpo, artigo de Rui Dilão, hoje no jornal As Beiras:
O professor Armando Policarpo, recentemente falecido, é um dos nomes maiores da Física e da Ciência em Portugal no século XX. Após o seu doutoramento em Manchester em 1965, iniciou em Coimbra uma intensa atividade de investigação na física de detetores de radiação, utilizados nos grandes aceleradores de partículas. Este trabalho conduziria a uma forte colaboração com o físico francês Georges Charpak, laureado com Prémio Nobel da Física em 1992. Charpak, no seu discurso de aceitação do prémio, muito justamente refere: “este trabalho [de Armando Policarpo] foi para mim uma grande fonte de inspiração e mostrou ser muito importante para a experiência que adquiri e, em particular, para a compreensão dos princípios que governam a multiplicação de electrões em gases.”
O professor Policarpo foi assim, juntamente com José Mariano Gago e Gaspar Barreira, um dos artífices da adesão de Portugal ao CERN, a Organização Europeia para a Pesquisa Nuclear, que simbolicamente se dá em simultâneo com a adesão de Portugal à então Comunidade Económica Europeia, a 1 de Janeiro de 1986. A inclusão do país no concerto das democracias liberais europeias, como forma de sedimentar a então jovem democracia portuguesa, encontra o seu contraponto científico nesta adesão ao CERN, extraordinária estrutura de cooperação científica nascida dos escombros da 2ª Guerra Mundial.
Armando Policarpo foi assim também um dos universitários de proa que conduziu a Universidade Portuguesa do apagado papel que desempenhou durante a ditadura para o lugar de destaque que assume em todas as democracias liberais: formando as novas gerações no espírito e no método de análise crítica de todos os assuntos, que apenas os docentes que praticam a investigação científica em plena liberdade estão em condições de transmitir devidamente. Este espírito e este método transcendem em muito os limites da mera ciência, constituindo um ingrediente indispensável da participação cívica em democracia.
Homem culto e cosmopolita, os seus interesses não se limitavam à ciência, mas tocavam ainda a literatura, a fotografia, o cinema, a espiritualidade ou o património.
Numa altura histórica em que por todo o mundo e também em Portugal se levantam nuvens de obscurantismo, servas fi éis de velhos tiques autoritários, resplandece com maior brilho o legado comprometido de Armando Policarpo, cidadão, académico, cientista, político de ciência.
Muito obrigado por tudo, Sr. Dr. Policarpo!
Rui Dilão
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