Nova contribuição do psiquiatra Nuno Pereira:
A felicidade, como bem-estar com relativa
estabilidade temporal, integra duas dimensões essenciais: uma afetiva (as
emoções positivas) com benefício imediato e outra cognitiva, valorativa (o
sentido da vida) com benefício adiado. As pessoas felizes experimentam predomínio
de emoções positivas (como prazer, alegria) em relação às negativas (como tristeza,
medo). O sentido da vida consiste num projeto que propicia autorrealização e
tem valor. Não é plenamente feliz uma vida de prazer, mas à deriva, apenas
centrada no ganho presente, nem uma vida com sentido, mas sacrificada, apenas
orientada para o ganho futuro. Uma vida feliz corresponde a uma existência
agradável e significativa, à semelhança duma viagem aprazível e com rumo, em
que se aprecia o percurso e se cumprem as etapas em direção ao destino
desejável.
Tal como a boa viagem implica adequadas
condições da estrada, do veículo e do condutor, também o bem-estar depende de
fatores circunstanciais, biológicos e psicológicos. Contra a intuição geral, a
maioria das circunstâncias de vida (tanto acontecimentos negativos como
positivos) tem atenuado impacto nos níveis de felicidade (maior a curto prazo,
mas menor a longo prazo), devido à espantosa capacidade de adaptação humana. Não
obstante a importância do desenvolvimento económico, a correlação entre riqueza
material e felicidade tende a esbater-se, após o equilíbrio financeiro e
satisfeitas as necessidades básicas. O modo de viver feliz requer sobretudo bom
estado do cérebro ligado ao corpo – isto é, da maquinaria cerebral, da
neuroquímica e da disposição temperamental herdada – e competente controlo
psicológico, com ampla margem educável.
Não basta a ausência de sofrimento, neutralizando o estado negativo, importa outrossim promover o bem-estar, em que se procura acrescentar valor positivo à existência, conciliando o agradável com o sentido.
Nuno Pereira (psiquiatra)
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