Antoine
de Saint-Exupéry
Com a vivência de ter
escrito o livro “Do Caos À Ordem dos Professores” (Janeiro/2004), em que, ao
longo das suas duzentas páginas, me debrucei, exaustivamente, sobre a criação
das ordens profissionais, anteriores a 25 de Abril de 74, destinadas
exclusivamente a licenciados por universidades (médicos, advogados, engenheiros
e farmacêuticos), enfatizei na respectiva p. 83:
“Como é consabido, a
filosofia que tem presidido à criação das ordens profissionais, expressa em
textos legais, aponta inequivocamente, as ordens como associações profissionais
que têm como exigência mínima de inscrição uma licenciatura universitária, que
se responsabilize pela qualidade dos actos profissionais prestados à comunidade
pelos seus associados”.
E prossegui: ”No
rescaldo duma época conturbada, que defendeu a sonegação do direito à diferença, em desrespeito deste modus faciendi, a Associação Nacional dos Professores do Ensino
Básico (ANPE), constituída, em grande parte, por professores diplomados pelas antigas escolas do magistério primário
anuncia num semanário realizado em 91, na cidade de Viseu, o firme propósito de
se transformar em Ordem” (“Diário de Coimbra”, 07/05/91).
De lá para cá,
quadruplicaram as ordens profissionais tendo sido criadas, entretanto, a Ordem dos Técnicos Oficiais de Conta e a
Ordem dos Enfermeiros ambas tidas como génese da respectiva democratização ou havidas, a contrario sensu, como a
sua mediocrização.
Alberga a primeira desde
cursados pelas antigas escolas comerciais a licenciados pelo politécnico, acolhendo a segunda
enfermeiros diplomados com o antigo curso geral de enfermagem e idêntica
formação de ensino politécnico.
Para além destas
minhas considerações, trago à colação um pequeno excerto da intervenção do Professor António Oliveira Marques no “Forum 96 -
Pensar a Educação”, promovido pelo Sindicato Nacional dos Professores Licenciados,
quando esclarece:
“A Ordem surge como
defesa ética e até estética de toda uma profissão e de toda uma deontologia.
Embora lhe possam interessar questões salariais e de promoção profissional, a
Ordem delega esses assuntos nos sindicatos, respeitando o espaço tradicional
que sempre lhe tem cabido e que sempre tem defendido com honra e dignidade”.
Aliás, esta situação,
que estabelece o campo de acção dos sindicatos, encontra-se plasmada na Constituição da
República Portuguesa, não permitindo,
ipso facto, ceifas em seara alheia
ao sabor de conveniências ocasionais ou meramente passionais de que é arquétipo
a actual bastonária da Ordem dos
Enfermeiros.
Em suma, aos
sindicatos compete a reivindicação dos direitos laborais dos seus associados e
às ordens a atribuição do título profissional
e o respeito por um código deontológico próprio. Assim, qualquer espécie de
intromissão da Ordem dos Enfermeiros em
fronteiras dos respectivos sindicatos, ou
vice-versa, ainda que de forma sofismada, contribui para situações não só ilegais como ausentes de “ética e
estética” defendidas por Oliveira Marques, emérito vulto da historiografia
nacional.
Por fim, como
sentenciavam os juristas da Roma Antiga: Suum
cuique tribuere. Ou seja, dar a cada um o que é seu, no linguajar popular,
dos nossos dias, “cada macaco no seu galho”!
1 comentário:
Esta intromissão da bastonária da Ordem dos Enfermeiros, assemelha-se-me a misturar água com vinho ou vinho com água dando uma zurrapa. Ou se defende um vinho de boa cepa ou uma água de fonte cristalina.
Deixemos, pois, os sindicatos defenderem os direitos laborais dos seus associados e a ordem os deveres dos seus inscritos, com verdadeira vantagem numérica para esta por obrigar à respectiva inscrição com condição "sine qua non" para o competente exercício profissional.
Esta situação de dualidade de citérios ordem/sindicatos dos enfermeiros não ajuda na luta de uma classe que tem , ou diz ter, como norma, a vida dos doentes como prioridade.
Ou seja, num estranho entrosamento de competências sai a perder, forçosamente, um sindicalismo secular sob os vagidos de uma ordem sem tradição pela sua condição de neófita.
Evocando Eça, que dizia sentir um torpe amolecimento que lhe amolecia o coração definindo-o com a relassa fraqueza que nos enlaça a todos Portugueses, nos enche de culpada indulgência uns para os outros, e irremediavelmente estraga entre nós toda a disciplina e toda a ordem. Ou seja, nunca uma ordem profissional pode ser motivo de desordem por se intrometer em assuntos que fogem ao seu âmbito de acção.
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