terça-feira, 5 de fevereiro de 2019

AINDA CÁ ESTÃO

Um animal geralmente apresentado como um ser gigantesco, monstruoso, terrível, surgir agora aos nossos olhos, com as dimensões e a beleza de um passarinho, é, deveras, surpreendente. Mas a verdade é que, para a ciência, as aves, as de ontem e as de hoje, são mesmo dinossáurios.

Durante muito tempo ouvia-se dizer e lia-se nos textos de estudo e de divulgação que os dinossáurios se tinham extinguido há cerca de 65 milhões de anos, mas, hoje, os paleontólogos garantem que eles ainda cá estão. As muitas descobertas de ossos e de outros restos destes animais, realizadas nas últimas dezenas de anos, puseram em evidência fósseis de dinossáurios com penas e membros superiores que lembram asas, representando os elos de transição para as aves. Assim, concluíram que houve, pelo menos, um grupo de dinossáurios que não se extinguiu e que, pouco a pouco, de geração em geração, ao longo de dezenas de milhões de anos, foi dando origem a indivíduos cada vez mais parecidos com as aves É o caso de Caudipterix, na imagem.

Foi, pois, a partir dos que sobreviveram que irradiou a imensa diversidade de espécies de aves do presente. Assim, distinguem-se, hoje:
- “dinossáurios não avianos”, representados pelo grande e diversificado grupo a que pertenceram todos aqueles que se extinguiram, mas que continuam “bem vivos” nos museus, na banda desenhada, no cinema, nosso imaginário,
“dinossáurios avianos”, representados pelas aves, desde a grande avestruz ao minúsculo colibri, passando por perus, galinhas, pombos, patos, pardais e papagaios, entre uma infinidade que povoa o mundo de hoje.
Os dinossáurios surgiram na Terra há cerca de 230 milhões de anos e temos deles um conhecimento apenas baseado nos seus restos fossilizados (ossos, dentes, ovos, pegadas e, até, excrementos). Como qualquer ser vivo ou conjunto de seres vivos, os dinossáurios tiveram origem num grupo de répteis mais antigos que, entretanto, desapareceram e, também, como quaisquer outros grupos biológicos, evoluíram ao longo de muitos milhões de anos.

Durante este enormíssimo espaço de tempo houve oceanos que se abriram e outros que se fecharam, montanhas que nasceram e se elevaram e outras que desapareceram, arrasadas pela erosão. Os climas e as paisagens mudaram ao sabor destas transformações e, assim, gerações sobre gerações, os dinossáurios experimentaram, sucessivamente, a adaptação aos diversos meios e a competição com outros animais, o que conduziu a um sem número de espécies, numa diversidade da qual a ciência se limita a conhecer uma pequena parte, avaliada em cerca de um milhar.

Se recuarmos 400 milhões de anos, vamos encontrar fósseis de indivíduos de um grupo muito antigo de peixes dotados de quatro barbatanas articuladas e suportadas por ossos no seu interior, que, além da natação, lhes permitia andar a quatro patas (tetrápodos).
Conquistando a capacidade de respirar, ao mesmo tempo, por guelras e por pulmões, estes peixes, a que foi dado o nome de sarcopterígeos, puderam sair das águas tépidas e deficientes de oxigénio dos pântanos de então e iniciar a grande aventura em terra, numa evolução a caminho dos anfíbios, de que são exemplo, as salamandras.
Sem dispensarem a vizinhança da água, onde continuaram a pôr os seus ovos e a humedecer a pele nua, os anfíbios evoluíram ao longo de milhões de anos, numa paisagem de florestas pantanosas, quentes, húmidas e densas de vegetação, ricas de insectos, aranhas e escorpiões que constituíam a sua principal dieta alimentar.
Lentamente, os anfíbios foram diminuindo a sua dependência do meio aquático, ocupando territórios progressivamente mais extensos e cada vez mais afastados das áreas húmidas. Há cerca de 300 milhões de anos, os anfíbios deram origem ao grupo dos répteis, caracterizados por produzirem ovos com casca, respirarem permanentemente fora de água (por pulmões) e terem o corpo coberto de escamas. Este grupo evoluiu, por sua vez, diversificando-se em várias classes, uma das quais foi a que conduziu aos dinossáurios e, milhões de anos mais tarde, às aves. Das outras classes surgiram répteis voadores (pterossáurios), outros marinhos (ictiossáurios e plesiossáurios) e todos os que, no presente, convivem connosco, como são os crocodilos, as tartarugas, as cobras e os lagartos.

A palavra dinossáurio foi construída juntando o termos gregos “deinós”, que significa medonho, terrível e “saurós”, que significa lagarto, o que, no conjunto, quer dizer lagarto terrível ou lagarto medonho. Isto porque, o paleontólogo e professor de anatomia comparada e primeiro director do Museu de História Natural de Londres, o inglês Richard Owen (1804-1892), que inventou o nome, em 1841, só dispunha de ossadas de três destes animais (“Megalosaurus”, “Iguanodon” e “Hyaelosaurus”) que sabia serem répteis de proporções gigantescas e, portanto, terríveis ou medonhos. Porém, os muitíssimos achados, que se seguiram, mostram que nem todos os dinossáurios foram gigantescos. Entre eles houve enormes quadrúpedes, herbívoros, um dos quais o descomunal Argentinosaurus, com cerca de uma centena de toneladas, de longos pescoços e compridas caudas, e outros igualmente corpulentos e altos como um prédio de quatro andares, como foi o Brachiosaurus. A par destes viveram bípedes, marchando ou correndo sobre as patas traseiras, como as aves, uns herbívoros, outros carnívoros, numa grande diversidade de tamanhos, desde os muito pequenos, como galinhas, aos gigantescos predadores, como o Tyrannosaurus e o ainda maior Giganotosaurus.

É raro encontrar um esqueleto completo de um dinossáurio. Geralmente o que se encontra são ossos isolados e separados. Neste caso é necessário saber juntá-los até reunir os suficientes para reconstruir o respectivo esqueleto. Depois desta fase, os especialistas sabem acrescentar-lhes os volumes dos músculos e, assim, obter uma imagem tão próxima quanto possível do corpo do animal. A seguir há que imaginar o seu aspecto exterior, nomeadamente a textura e a ou as cores da pele, nuns casos, com escamas, noutros, com penas, e noutros ainda, com escamas e penas. É na sequência deste tipo de trabalhos que os museus exibem os bem conhecidos esqueletos de muitos deste animais desaparecidos e as sugestivas réplicas fixas ou robotizadas que atraem multidões de visitantes.

Portugal, com destaque para as regiões de Alcanede, Batalha, Lourinhã, Pombal e Torres Vedras, está entre os países da Europa e do mundo mais ricos em fósseis de dinossáurios, sobretudo do período Jurássico. Contam-se por mais de duas dezenas de géneros conhecidos que podem ser vistos no Museu da Lourinhã, no Museu Geológico (do Laboratório Nacional de Engenharia e Geologia, em Lisboa) e no Museu Nacional de História Natural e da Ciência, da Universidade de Lisboa. O Dino Parque Lourinhã é, desde há um ano, uma mais valia na divulgação da paleontologia dos dinossáurios. Trata-se do maior museu ao ar livre do nosso país, com 120 modelos à escala real e milhares de visitantes.

Portugal também se distingue por possuir as mais importantes jazidas com pegadas de dinossáurios da Europa, com destaque para as de Cabo Mondego (Figueira da Foz), Vale de Meios (Alcanede, Santarém), Pedreira do Galinha (Torres Novas), Pedra da Mua, Lagosteiros e Pedreira do Avelino (Sesimbra) e Pego Longo-Carenque (Sintra). Entre os muitos achados, destaca-se um ninho de ovos de um dinossáurio carnívoro, alguns deles conservando os ossinhos dos respectivos embriões.

O interesse pelos dinossáurios é um acontecimento mundial, sobretudo entre os mais jovens e não para de crescer. Eles estão no nosso quotidiano, nos museus e no cinema, estão na televisão, nos livros de divulgação e na banda desenhada. Estão nos peluches e em muitos dos brinquedos. Estão na nossa imaginação e, ao mesmo tempo, bem reais, voando no céu, correndo pelos campos ou vegetando, prisioneiros dos desumanizados aviários da sociedade de consumo.

A. Galopim de Carvalho

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