domingo, 12 de junho de 2016

PORTUGAL, A ENGENHARIA E O FUTURO


Gilberto Santos é um engenheiro de Viana do Castelo que, tendo em novo a paixão dos automóveis, se formou em Engenharia Mecânica, no ramo de Engenharia de Automóveis, em Bratislava, na Eslováquia (em Portugal não havia à época esse ramo da engenharia). Doutorou-se mais tarde na Universidade do Minho, depois de ter passado pela Universidade Nova de Lisboa.  Hoje ensina na Escola Superior de Tecnologia do  Instituto Politécnico do Cávado e do Ave.  

O livro “Engenharia pt”, com o sugestivo subtítulo “Uma via verde para o desenvolvimento tecnológico e económico do país”, foi publicado pela Vida Económica em 2014, com nada mais nada menos do que quatro prefácios: de António Sampaio do Nóvoa (então Reitor da Universidade de Lisboa), Carlos Matias Ramos (então Bastonário da Ordem dos Engenheiros),  Fernando Santos (então Presidente da Ordem dos Engenheiros da Região Norte) e António Saraiva (Presidente da Confederação da Indústria Portuguesa).

Depois de capítulos iniciais sobre a diferença entre ciência e tecnologia, o ensino da engenharia entre nós e a ligação entre as escolas do ensino superior e a indústria, o autor expõe o problema que, acima de tudo, o preocupa. Após as especiarias da Índia, do ouro do Brasil e dos cheques da CEE, Portugal está numa encruzilhada. Somos ainda um país em que a engenharia continua a ser de processos e não de produtos, limitando-nos a montar e, quando muito, a acrescentar algum valor a produtos desenvolvidos lá fora. Veja-se, por exemplo, no sector automóvel,  a montagem dos carros da  na Auto-Europa  cuja concepção vem inteiramente de fora. Juntando-se a outros autores, Gilberto Santos diz que o mar é a nossa grande oportunidade de futuro, uma vez que se trata de um recurso natural enorme e em larga medida por explorar. Mas quase não temos estaleiros para construir barcos... E, quando os temos, a engenharia naval é importada.  

A nossa escolha actual é entre continuar a ser um país de mão de obra barata e de pouco valor acrescentado ou tornar-nos um país da sociedade do conhecimento, capazes de fazer produtos  com alto valor acrescentado. As sete etapas que o autor apresenta com vista à escolha da segunda via são: melhorar a educação no ensino básico e secundário, principalmente na matemática e na física (nas quais os alunos continuam a ter dificuldades), promover a formação em engenharia (os alunos estão a fugir de ramos essenciais como a engenharia civil, assustados com o temporário desemprego nessa área), aprofundar as relações universidades/politécnicos – empresas (o ensino superior, apesar de progressos recentes, está ainda em grande medida de costas voltadas para o mundo das empresas), criar novas empresas e melhorar as existentes (por vezes em vez de estabelecer novas empresas, de futuro incerto,  melhor seria optimizar os resultados das que já laboram), inserir mestres e doutores nas empresas (os empresários recusam-se a  empregar doutorados, que só numa escassa minoria vão para a indústria), criar uma política tecnológica (adoptou-se nos últimos vinte anos uma política científica, mas ela não foi combinada com a política económica) e, por fim e em resumo, criar riqueza agora em vez de pedir emprestado ao futuro (o que estamos a fazer quando nos endividamos). 

A segunda parte do livro, em cerca de metade das cerca de 400 páginas, e porque nem tudo está mal em Portugal apresenta doze casos de sucesso da engenharia nacional, que incluem a Efacec, que desenvolveu um sistema de gestão de redes eléctricas, a Amtrol-Alfa, que desenvolveu reservatórios de pressão para GPL, a NewTextiles, que criou vestuário interior com fibras de efeito terapêutico, a Vangest, que faz design de automóveis (modernamente já há entre nós quem crie carros desportivos!), etc.

A encerrar a obra é referida uma série de índices do World Economic Forum (Suíça) apresentados no Global Competitiveness Forum, de 2014-1915. Há coisas boas e coisas más. Estamos em 2.º lugar mundial, depois dos Emiratos Árabes Unidos, na qualidade da rede rodoviária,  em 8.º na disponibilidade de cientistas e engenheiros em 18.º na qualidade das instituições de investigação científica. Mas, em forte contraste, estamos em 91.º na capacidade de reter talentos, em 111.º na robustez dos bancos, e em 138.º na amplitude da dívida pública.

Gilberto Santos coloca a dado passo a dúvida de António Sérgio de há cem anos: “Quando nos convenceremos de que se cria, avigora, triunfaliza um povo, não por uma colectiva recordação do passado, mas por uma aspiração comum para o futuro?” A pergunta permanece mais actual do que nunca. O passado não se pode mudar, mas o futuro pode.

2 comentários:

Ildefonso Dias disse...

Fernando sim, mas Santo...

Ildefonso Dias disse...

Fernando Santo foi presidente da O.E. Fernando Santos foi presidente da Região Norte tem razão Prof. Carlos Fiolhais, não li com cuidado... de Santos guardo muito má memória, enderecei-lhe institucionalmente, em 2010 uma carta para que a O.E actua-se numa ilegalidade que iria ser cometida por um município sobre a abertura de um concurso público, no que concerne às habilitações de Engenharia a ser exigidas para o efeito. Nunca me respondeu, iria certamente mexer com certos poderes politicos, cunhas, favores etc... pergunto, então porque é que Fernando Santos ocupou o cargo, se não foi para defender uma classe, os Engenheiros, foi como tantos outros neste país, para aquilo que se vê. Figurará neste país, como mais uma "Folha Caída" destinada a ser arredada com os pés, de que nos fala B. Caraça. É como é.


NOVA ATLÂNTIDA

 A “Atlantís” disponibilizou o seu número mais recente (em acesso aberto). Convidamos a navegar pelo sumário da revista para aceder à info...