Começo por agradecer o seu comentário ao post por mim publicado, em transcrição que fiz do artigo “MATAR” (“Revista-Expresso”, 29 de Maio/2016) que me pareceu importante, mormente, por esta peça jornalística ter assumido o preceito romano: "Ridendo castigat mores!"
Por, logo de início, ter sido por si referido aqueles que se têm debruçado sobre as escolas oficiais e os colégios com contrato de associação , aqui no De Rerum Natura (e na parte que me toca, outrossim, no jornal Público) não posso, e muito menos quero, deixar de justificar, publicamente, a minha posição actual sobre a acção do anterior ministro da Educação, Professor Nuno Crato, embora, em tempos, tenha acreditado ser o seu consulado uma nova e esperançosa forma de acabar, por exemplo, com o "eduquês" e o abuso dos colégios com contrato de associação.
Não o foi, em ambos os casos! No primeiro, por ter sido cilindrado pela máquina da 5 de Outubro; no segundo por culpa própria em cedência ao Rei Midas.
Como o não foi a acção de José Sócrates mandando (re)construir, em dispêndio faraónico, escolas do ensino oficial deixando, simultaneamente, chegar algumas delas à maior das degradações materiais, v.g., antigo Liceu Camões, em Lisboa, e antigo Liceu Alexandre Herculano, no Porto, como tenho referido em vários posts e em artigos de jornal.
Deixo à consideração dos leitores (principalmente de si) as ilacções pertinentes a tirar de tanta e dispendiosa obra e de quem delas se possa ter aproveitado. Como vê, cá (Nuno Crato) e lá (José Sócrates) más fadas houve. E já que estou, como diz a linguagem popular, “com a mão na massa” (honny soit qui mal y pense, por a massa significar também o vil metal) não posso deixar de estranhar que este diferendo se tenha resumido, essencialmente, entre escolas oficiais e colégios com contrato de associação, deixando de fora os colégios privados.
Nanja eu por ter perspectivado esta temática no seu triplo aspecto: ensino oficial, ensino convencionado e ensino privado (12/02/2011; 10/11/2012 e 13/11/2013).
Assim, em transcrição com esta última data, escrevi no Público, e nesse mesmo dia transcrito, aqui, no De Rerum Natura, com o título “Ensinos oficial, convencionado e privado”, o seguinte artigo de opinião:
“Perante uma aparente apatia de escolas oficiais confrontadas com o ensino privado com contrato de associação (para o qual a lei estabelece condições que nem sempre têm sido cumpridas), estão grande número delas transformadas em verdadeiros elefantes brancos com instalações luxuosas carenciadas de alunos e, ipso facto, com professores com horários zero que fazem pairar nuvens negras sobre o seu futuro.
Em consequência, tive como muito oportuno e de grande interesse um artigo de opinião de António Rendas, presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (PÚBLICO, 11/11/2013), em memória exaltante “Ao meu velho amigo Liceu Camões”, por ele assim havido em título de artigo.
Em evocação de Miguel Torga, "maldito seja quem se nega aos seus", isentando-se, desta forma, da maldição de se negar a um ensino da sua saudosa recordação, este testemunho reitoral é tanto mais de enaltecer por me parecer que se tornou tabu discutir esta temática no olvido de umas tantas personagens que deram aos liceus um estatuto de grande honorabilidade (no caso do Pedro Nunes, verbi gratia, Nuno Crato, ministro da Educação, Marcelo Rebelo de Sousa, catedrático de Direito e Francisco Pinto Balsemão, fundador do Expresso). E tanta outra gente ilustre e ilustrada, ex-alunos de outros liceus do país (não sei porque carga de água, hoje crismados de escolas secundárias) que pontificam em numerosos aspectos científicos, culturais e artísticos da sociedade portuguesa.
Em abono da verdade se diga que no statu quo actual escolas oficiais há de sucesso que tudo fazem para tentarem sobreviver com galhardia da crise que assola o ensino em Portugal. Como mero exemplo, ditado pela posição de destaque no ranking nacional, em função da média das notas de exames nacionais do 12.º ano, o caso da Escola Secundária Infanta D. Maria, de Coimbra.
Sem esquecer, e muito menos desconsiderar, outras escolas estatais das margens do Mondego ou de outras partes do território nacional.
Que fique bem claro: a minha defesa em prol das escolas oficiais não significa, de forma alguma, um ataque cerrado e cego às escolas privadas convencionadas. Apenas a cada uma delas (oficiais e convencionadas) um destino que não transforme as escolas estatais numa espécie de vazadouro de alunos que por elas optam como último recurso e não como eleição deliberada de tempos de glória na memória colectiva dos portugueses.
Mas grande parte desta polémica, que está longe de ter chegado ao fim, reduz-se a uma coisa tão simples como esta: dever ser o ensino privado com contrato de associação uma alternativa ao ensino público inexistente numa determinada área e não mera satisfação megalómana de famílias não muito abonadas que gostam de blasonar a “riqueza” de terem os filhos a estudar em colégios à custa do erário público, o dinheiro dos impostos de todos nós.
Em plena época de grave crise económica, promover uma situação de favor para o ensino privado subsidiado pelos cofres do Estado, poderá ser uma forma de transformar o ensino privado, com longa e valorosa tradição (em minha lembrança e a título de mero exemplo, o Colégio Valsassina de Lisboa, membro-honorário da Ordem de Instrução Pública) num barco em perigo de adernar por, em nome da sua independência, dispensar quaisquer formas de subsídios estatais.
Salvo melhor opinião, reduzir esta questão ao binário ensino oficial/ensino privado convencionado poderá ter como consequência trágica ferir de morte o ensino privado tout court.
Contrariando um exagerado optimismo da alma lusitana, de que receio me ter feito intérprete de , deixou-nos Nuno Crato, todavia, lampejos de esperança: “Os dias terríveis são, afinal, as vésperas dos dias admiráveis” (Almada Negreiros).
Mas que cheguem rapidamente esses dias em benefício da sociedade portuguesa fustigada por ventos constantes de mudança do sistema educativo que em nada ajudam o equilíbrio emocional da sua juventude prejudicando mesmo o seu rendimento escolar!
Para não me pesar na consciência um silêncio cúmplice sobre um assunto que carece urgentemente de clarificação dando a César o que é de César, respaldo-me em Pitigrilli: “Tudo deve ser discutido. Sobre isso não há duvida”!
Para que o ensino oficial não possa ser subvertido por interesses político/económicos do ensino convencionado, ainda que em mero dever de cidadania, discuta-se, pois, um assunto que volta a estar nas luzes da ribalta por se tratar (ou dever tratar) de uma questão de verdadeiro interesse nacional que pode pôr em risco as gerações actuais e futuras”.
Embora podendo passar por injusto, por desconhecimento de possíveis acções levadas a efeito pelo ensino privado em defesa dos mais que legítimos interesses dos seus professores e alunos, que pagam as respectivas mensalidades, não posso, uma vez mais, deixar de evocar (numa altura em que, um tanto tardiamente, as escolas oficiais têm agendado uma manifestação para o próximo mês de Junho) palavras de Miguel Torga: “Maldito seja quem se nega aos seus em horas apertadas!”
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7 comentários:
P.S.: Acabo de ver e ler na Net este "cartoon" que não resisto a transcrever:
"O ESTADO TEM TRANSPORTES PÚBLICOS. EU PREFIRO USAR O TRANSPORTE PRIVADO. MAS QUERO QUE SEJA O ESTADO A PAGÁ-LO. POSSO FAZER UM CONTRATO DE ASSOCIAÇÃO? EU ESCOLHO O MEU CARRO (MAS QUERO QUE TU AJUDES A PAGAR).
Por imperdoável lapso, de que me penitencio perante o seu autor (Manuel Silva, 30 Maio às 12:02) e peço desculpa ao leitor, escrevi no título deste meu post o nome José Meneses em vez de Manuel Silva. Como defendia um jurista da Antiga Roma:”suum cuique tribuere”. Como tal, apresso-me a emendar o título do meu post.
Senhor Rui Baptista:
Comungo praticamente tudo que escreveu no seu post.
Só discordo de tão grande destaque dado à minha pessoa a partir de um singelo comentário noutro post.
Vivemos num país algo insólito, temos poucos recursos mas esbanjamo-los: reabilitámos escolas que se tornaram luxuosas mas não temos aquecimento central noutras em zonas de rigor no Inverno. E deixamos cair aos bocados e lentamente algumas escolas históricas, como refere.
Depois do esforço de termos criado uma rede de escolas públicas que, neste momento, cobre 97% do país, passando do 6.º ano de escolaridade obrigatória nos anos 80 para o 12.º de hoje, houve a engenhosa invenção de criar e operacionalizar um instrumento de garantir rendas perpectuas pagas pelo Estado (pasme-se, por parte dos defensores do mercado completamente livre: os neoliberais) inactivando a referida rede que cobre 97% das nossas necessidades.
E em que consistiu esse engenho? À semelhança do fermento que invade toda a farinha e a transforma em pão, a partir de um fermento de 3% de necessidades não cobertas pelo Estado, e dadas as dificuldades financeiras para completar a cobertura universal do território (ou a redundância em fazê-lo, admito), procura-se perverter a totalidade da escola pública, não cuidando de saber o que fazer a esses recursos que tanto custaram a implantar e que pela primeira vez chegaram a praticamente todo o território.
Bastou contratar um especialista instantâneo em Educação, de seu nome Nuno Crato, um verdadeiro padeiro dos milagres da massa (monetária), para que a coisa ganhasse velocidade acelerada.
Isto é um bom indicador do estado a que chegou a política entre nós, estado ao qual eu chamo PREC da Direita-Extrema.
Depois de termos tido o PREC da Esquerda-Extrema, do qual ainda estamos a pagar pesadas facturas, temos o da Direita-Extrema, cujas facturas já estão a cair na contabilidade e continuarão.
A questão dos Contratos de Associação redundantes é um bom exemplo das facturas de que falo.
Quanto ao balanço do Deve e Haver entre umas e outras facturas dos dois PREC, não consigo fazer a comparação.
Não aprendemos nada com a nossa própria história.
E nós que, apesar de termos ainda tanta coisa a melhorar no funcionamento e eficácia da escola pública, até temos vindo paulatinamente a subir nos resultados do único teste fiável e internacional: o PISA (que avalia quase 50 países da OCDE).
E a partir de 2012 já conseguimos ficar à frente da Suécia nos 3 itens medidos (Língua; Matemática; Ciência), Suécia que foi um país pioneiro na erradicação do analfabetismo nos finais do século XIX.
Suécia que, a partir dos anos de 1990, começou a aplicar a receita que esta Direita-Extrema nos que enfiar pelas goelas abaixo: o cheque-ensino com a justificação dos «amanhãs que cantarão» da livre escolha (naquele país na modalidade de free schools).
Não aprendemos nada com a história dos outros.
"A questão dos Contratos de Associação redundantes é um bom exemplo das facturas de que falo." Quantos contratos novos foram feitos no tempo de Nuno Crato, sr. Manuel Silva? O sr. é, realmente, uma pessoa de comentários "singelos"...
Senhor Jorge Cunha:
Só tem isso a alegar em defesa do Nuno Crato?
O que o movimento dos colégios com CA alegam é que a natureza dos contratos iniciais mudou, pois foi negociado com Nuno Crato outro modelo de contratação com a introdução de outros parâmetros (direito de escolha, p. ex.) que justificam a sua existência sem ser apenas a falta de escola pública.
Por isso se abririam turmas de início de ciclo mesmo que houvesse escolas públicas ao lado: não pela inexistência de oferta pública mas por outros critérios.
Ainda não se deu conta disso.
E também não se deu conta de que foi proibida a abertura de turmas em escolas públicas com capacidade para as acolher para que estas fossem para os colégios com CA?
E em escolas bem cotadas nos rankings que existem: vá perguntar na Escola Secundária Raul Proença (Caldas da Rainha), onde o famoso grupo GPS opera.
Se calhar singeleza existe mas da sua parte.
Há pessoas que veem mais depressa um mosquito nos olhos dos outros do que um boi nas seus.
Nos últimos 20 anos, Nuno Crato foi o único Ministro da Educação que, de forma séria e competente, tentou melhorar a qualidade da escola pública agindo sobre o fundamental: no que se ensina e como se ensina. Para isso escolheu os melhores para a formulação de novos programas e quis imprimir maior qualidade e exigência na formação e selecção dos professores. Claro que teve contra ele praticamente todas as corporações e sindicatos de professores.
Senhor Jorge Cunha:
Se quiser entrar nessa discussão, é uma boa e legítima discussão.
Mas o que está em causa nesta são os CA.
E quanto ao deboche (que já vinha de trás e que Nuno Crato ampliou como ninguém), proibindo a abertura de turmas no público (mesmo em escolas de qualidade e com vagas) para que fossem alimentar a mama dos negócios privados com dinheiros públicos (garantidos, portanto, sem os riscos do sacrossanto mercado, que os ditos liberais tanto gostam de invocar), nunca ninguém fez tanto como ele.
E alterou as regras, conta a Constituição e a Lei de Bases, deixando esta situação armadilhada.
Veja este vídeo, elucidativo.
Reportagem para se perceber BEM a questão dos colégios privados, mas financiados por todos nós: https://youtu.be/evqWWdgOY4o?t=12
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