sexta-feira, 20 de maio de 2016

HOLOGRAFIA OU UMA NOVA ARTE DA LUZ


Meu artigo no último "As Artes enter as Letras" (a exposição e hologramas "Janelas de Luz" está no Museu de Ciência da Universidade de Coimbra):

Algumas formas de arte devem a sua origem à ciência e tecnologia. É decerto esse o caso da fotografia e do cinema que surgem no século XIX com base nos extraordinários desenvolvimentos da óptica e da química que caracterizaram esse século: o francês Nicéphore Niépce conseguiu realizar fotografias rudimentares em papel de cloreto de prata com uma pequena câmara em 1816 e os, também franceses, irmãos Auguste e Louis Lumière apresentaram a primeira sessão pública de cinema, em Paris, em 1895, que mostram a saída de operários da Fábrica Lumière (a sua empresa de películas fotográficas). É curioso que os irmãos, chamados “luz”, tivessem inaugurado a sétima arte na “cidade luz”.

Mas, no século XIX, o desenvolvimento do laser uma ideia do físico  suiço de origem alemã Albert Einstein em 1917 apenas concretizada com luz visível pelo norte-americano Theodor Maiman em 1960 permitiu novos desenvolvimentos artísticos baseados na ciência. Sem os lasers não teria sido possível, por exemplo, a nova arte da holografia.

O pai da holografia é o engenheiro electrotécnico e físico húngaro mas naturalizado britânico Dennis Gabor: nasceu em Budapeste em 1900 (pertenceu a uma geração de húngaros tão extraordinários, que já foram chamados marcianos de Budapeste”  por não parecerem deste mundo) e morreu em Londres em 1979. Foi um dos cientistas que fugiu da Mitteleuropa nazi passando a trabalhar nos países aliados. Recebeu sozinho o prémio Nobel da Física de 1971 pela sua invenção da holografia realizada na empresa British Thomson-Houston, em Rugby (a modalidade desportiva chama-se assim por ter nascido nessa cidadezinha do interior da Inglaterra), no ano de 1947. Sim, decorreram 24 anos entre a invenção e o reconhecimento com o maior prémio científico do mundo!  De facto, o primeiro holograma só de ser concretizado em 1964, quatro ano após a primeira luz do laser de Maiman. Até lá não passava de uma ideia, surgida no contexto dos microscópios electrónicos, mas sem possibilidade de realização prática.

Um holograma consegue-se fazendo incidir luz laser sobre um object que a devolve para uma película fotográfica ao mesmo tempo que parte da mesma luz laser (desviada por vidros semi-espelhados) incide na mesma película. O padrão gravado fotograficamente resulta da interferência dos dois feixes de luz. Iluminado com um laser por detrás o padrão formado dá origem, por um fenómeno optico óptico chamado difracção, a um holograma, uma imagem tridimensional do objecto (estes são hologramas ditos de “transmissão”). A holografia é muito mais do que um meio de obter tridimensionalidade: é um meio de gravação num formato compacto de informação sobre um objecto tridimensional.

Existem outros tipos de hologramas além daquele muito simples que foi descrito. Há, por exemplo,  hologramas que podem ser vistos não com luz laser, que é monocromática, mas com luz branca, que é  policromática. São hologramas de luz branca aqueles que podem ser vistos nas imagens brilhantes que surgem nos cartões de créditos e notas de banco que mostram uma das grandes aplicações da moderna holografia: a autentificação como garantia de segurança, uma vez que não é cil fazer  hologramas deste tipo (chamados hologramas de “transmissão de arco-íris”). E são também hologramas de luz branca aqueles  que normalmente  produzem  imagens  holográficas em que a luz branca está do mesmo lado que o observador (hologramas de "reflexão").

Na película formada está codificada informação sobre o objecto original que permite a reconstituição tridimensional da sua imagem. Quando se grava um holograma, a impressão de perspectiva é fantástica. Parece-nos que o objecto real está lá quando efectivamente não está. Com a extraordinária diminuição do preço dos lasers  tornou-se possível a qualquer pessoa, desde que domine a tecnologia, fazer hologramas. Muitos artistas tornaram-se assim autores de imagens holográficas. Já havia a fotografia estereoscópica e o cinema a três dimensões, mas a holografia é uma técnica diferente, oferecendo aos artistas novas possibilidades de expressão. O pintor surrealista espanhol Salvador Dali, que se revelou sempre atento aos progressos da ciência, se não foi o primeiro artista a fazer hologramas foi, pelo menos, o primeiro artista famoso a expor hologramas, numa exposição que montou em Nova Iorque em 1972.  O físico norte-americano, professor do MIT, Stephen Benton, criador em 1968 dos hologramas de “transmissão de arco-íris”, foi também um artista. Para ele a holografia era a “intersecção da arte, ciência e tecnologia”. A colecção dos seus hologramas artísticos ficou de posse da sua escola, onde co-fundou o famoso MIT Media lab, um espaço de investigação ao mesmo tempo artística, científica e tecnológica.

No Ano Internacional da Luz foram apresentadas, em Portugal e em todo o mundo, exposições de hologramas. A Comissão Nacional do Ano Internacional da Luz comissionou a Fábrica Ciência Viva da Universidade de Aveiro a preparação de uma exposição interactiva sobre holografia, denominada Janelas de Luz , que não só apresentava uma colecção de doze hologramas de reflexão como convidava os visitantes a produzirem eles próprios os seus hologramas. O espaço principal é um laboratório fotográfico munido de lasers e películas de modo a gravar hologramas (o “Hololab”, laboratório de hologramas). Um monitor ajuda em sessões destinadas a todos, embora principalmente aos mais jovens, a fazer hologramas. A exposição foi preparada para poder ser itinerante. Abriu no átrio da Reitoria da Universidade de Aveiro e depois disso já esteve no Cine-Teatro municipal da Guarda, Covilhã, Santa Comba Dão, estando agora no Museu de Ciência da Universidade de Coimbra. O visitante pode aprender a história e aplicações da holografia, de modo a dissipar os mistérios dessa tecnologia baseada na luz.

As imagens holográficas são fotografias tridimensionais que se podem ver sem óculos especiais. Cinema holográfico ainda não existe. Mas os filmes de grande audiência têm mostrado a ideia da holografia. Nos filmes da “Star Wars” apareceu várias vezes o uso de hologramas para reunir pessoas a grandes distâncias. No filme “Superman II”, um dos personagens usa a holografia de uma forma bastante original: foge da prisão deixando um holograma de si próprio de modo a iludir os guardas... 

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