quarta-feira, 25 de novembro de 2015

ENSINO INTEGRADO: OBJETO E PROCESSO

Texto recebido do nosso leitor Nuno Pereira, de quem já antes tínhamos publicado artigos sobre educação:

    A escola, como mediadora cultural entre gerações, tem demonstrado dificuldade em adaptar-se a uma sociedade em rápida mutação com inúmeras fontes informativas e sobretudo com as novas tecnologias disponíveis sem limites de tempo e de espaço. Pertence à escola e aos seus agentes converter o produto cultural da humanidade em conteúdos curriculares, saber sistematizado e organizado em torno do qual se desenham as estratégias de ensino e as experiências de aprendizagem.

    Sem diminuir a importância dos objetivos educacionais de aprender a cooperar e a ser, tem interesse abordar à parte a função docente ligada ao saber conhecer e fazer e os perigos dos exclusivismos. Nas aulas magistrais, o professor expõe a matéria fracionada e elaborada e espera que os alunos aprendam, objetivo só acessível aos interessados, inteligentes, trabalhadores, preparados e, portanto, capazes de processar e gerir a informação. Tal prática conduz naturalmente ao abandono dos estudos pelos alunos sem as qualidades referidas e, combinada com baixa exigência avaliativa, a muitos diplomados ignorantes. Em outras aulas tradicionais também de programas-fim, o professor explica a matéria, mas age sobre os alunos para que a interiorizem, a incorporem, estimulando-os, modelando-os, com prémios, castigos e treino. Esta prática, associada muitas vezes ao enchimento da memória, ao adestramento e aos trabalhos forçados, pode produzir no extremo indivíduos como «idiotas sábios». Em centros de interesse e áreas de projeto, o professor cria condições para os alunos aprenderem a aprender sem currículo ou com currículo mínimo mais ligado à vida, isto é, para desenvolverem competências. A educação para a autonomia com programas-meio, radicalizada no percurso escolar com o objetivo utópico da redescoberta da ciência acumulada historicamente, isto é, de formar autodidatas saltando etapas na evolução do conhecimento, conduziria na realidade a pessoas inteligentes mas ignorantes. Todas estas práticas encerram virtudes, mas são incompletas.

    De facto, para garantir a transmissão e a assimilação dos conteúdos, com eficácia e eficiência, o professor deve possuir preparação académica e competência didática e o aluno deve desenvolver competência de estudo.

    O domínio da matéria específica exige permanente atualização. Não se ensina o que se não sabe. A competência didática consiste na capacidade não só para transmitir a matéria, mas também para promover a sua assimilação com vista à realização do aluno. O professor oscila entre dois métodos complementares, conforme o seu posicionamento perante o aluno – tanto objeto como sujeito - aspetos polares impossíveis de apreender em simultâneo (tal como a relação figura-fundo). Com método diretivo, o professor considera o aluno como objeto condicionável, e, com método não diretivo, como sujeito autónomo. No primeiro caso, não só explica a matéria, como condiciona o aluno a assimilá-la, e, no segundo caso, facilita a aprendizagem. Só com técnica e arte se conciliam ambos os métodos.

    É fundamental o desenvolvimento da competência de estudo, desde os primeiros anos de escolaridade, com mais incidência no 2.º ciclo e no 3.º ciclo, para prevenir o insucesso escolar e continuar a aprender ao longo da vida, tanto mais que muitos alunos chegam à universidade sem saberem estudar. Numa aula formativa, o professor pode efetivamente conseguir que o aluno compreenda e realize, graças sobretudo à memória de trabalho e de curto prazo, que permite operações mentais. Porém, já no próprio dia e nos dias seguintes, processa-se o esquecimento e perde-se depressa o frágil saber adquirido na aula. A aprendizagem só se completa mediante a consolidação, isto é, a transferência para a memória de longo prazo, quer declarativa, quer procedimental. Não basta pois que o professor explique, condicione e facilite, é necessário também que o estudante disponha de competência autorregulatória. Persistem ainda crenças irrealistas, que têm condenado gerações ao fracasso e consentido que apenas os capazes vençam. São ilustrativos quer o mito construtivista de que os alunos reúnem as capacidades necessárias para descobrir por si sós (mesmo ativados) e em tempo restrito a metodologia de estudo já testada e validada, quer o mito do esforço como único meio (sem o domínio de técnicas eficazes) para os alunos de menores capacidades naturais igualarem os mais dotados.

    Torna-se então imperioso que cada professor ensine, de modo metódico e científico (e não avulso e empírico), no âmbito da disciplina, o aluno a analisar, sintetizar, relacionar, memorizar, aplicar e enfim pesquisar, depois da aula, como pessoa autónoma com espírito crítico e criativo, no sentido de realmente aprender a conhecer e a fazer. A formação do professor em métodos de estudo constitui evidentemente condição indispensável para o ensino do processo do estudo do conteúdo disciplinar.

                                                                                                            Nuno Pereira (psiquiatra)
                         

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