Meu Caro Eugénio: Voltei à
minha meninice quando me prometiam algo que eu esperava ansioso. Assim
aconteceu quando, finalmente, a campainha soou à minha porta e o carteiro me
entregou o teu derradeiro volume de memórias, autografado, que me tinhas anunciado: “Acta Est Fabula”: Memórias
– V- Regresso a Portugal: (1995-2015)”.
Como dizia Eça, “em Portugal não se lê, folheia-se”. No
meu entusiasmo, fiz-me prosélito queirosiano: folheei-o, quase diria
sofregamente, dando de caras com o mau momento, felizmente ultrapassado, que passaste, anos atrás, com a tua saúde. E, em consequência(?),
reporto-me à contracapa do teu livro:
"Chego ao fim: sinto-me, um pouco, numa sala de espera. Aguardando o quê?
Talvez tudo. Talvez nada. Mais provavelmente,
alguma coisa. Sou ainda capaz de surpreender-me. O assombro mantém-me de
pé".
Referias-te à finitude da
vida humana? E ao rasto que vamos deixando desta "vida descontente" que
muito nos apoquenta a todos (pelo receio do desconhecido), nem que seja só sob
o ponto de vista filosófico, quando no outono da vida? Na maior parte das vezes
no anonimato, mas no teu caso numa vida riquíssima sob o ponto de vista
cultural, profissional, familiar e, last
but not least, de cidadania que tens cumprido no mais nobre sentido da
palavra.~
Aliás, S. Tomás d'Aquino
pouco nos sossega, a este respeito, remetendo-nos para uma questão de fé: "Para os que têm fé numa explicação é
necessária; para os que não têm fé nenhuma explicação é possível”.
O que resta, portanto, para
aqueles que se debatem entre dúvidas e certezas confortantes ou desconfortantes
sobre o seu destino? O reconforto que nos deixa Henri Poincaré: “O Homem representa um pálido clarão na
tempestade da vida, mas esse clarão é tudo”?
Como vês, faço perguntas
para as quais não encontro respostas. Aquelas respostas, que a minha fé em Cristo,
e na sua pregação sobre um mundo novo de “amai-vos
uns aos outros”, começa a ruir no romper deste milénio que prenuncia, pelo
contrário, odiai-vos uns aos outros.
Recebe um abraço deste teu
dedicado amigo de saudosos tempos da nossa cosmopolita e cultural Lourenço Marques, hoje Maputo.
Coimbra, 27 de Novembro de
2015.
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