A escola, como mediadora cultural
entre gerações, tem demonstrado dificuldade em adaptar-se a uma sociedade em
rápida mutação com inúmeras fontes informativas e sobretudo com as novas
tecnologias disponíveis sem limites de tempo e de espaço. Pertence à escola e
aos seus agentes converter o produto cultural da humanidade em conteúdos
curriculares, saber sistematizado e organizado em torno do qual se desenham as
estratégias de ensino e as experiências de aprendizagem.
Sem
diminuir a importância dos objetivos educacionais de aprender a cooperar e a
ser, tem interesse abordar à parte a função docente ligada ao saber conhecer e
fazer e os perigos dos exclusivismos. Nas aulas magistrais, o professor expõe a
matéria fracionada e elaborada e espera que os alunos aprendam, objetivo só
acessível aos interessados, inteligentes, trabalhadores, preparados e,
portanto, capazes de processar e gerir a informação. Tal prática conduz
naturalmente ao abandono dos estudos pelos alunos sem as qualidades referidas
e, combinada com baixa exigência avaliativa, a muitos diplomados ignorantes. Em
outras aulas tradicionais também de programas-fim, o professor explica a
matéria, mas age sobre os alunos para que a interiorizem, a incorporem,
estimulando-os, modelando-os, com prémios, castigos e treino. Esta prática,
associada muitas vezes ao enchimento da memória, ao adestramento e aos trabalhos
forçados, pode produzir no extremo indivíduos como «idiotas sábios». Em centros
de interesse e áreas de projeto, o professor cria condições para os alunos
aprenderem a aprender sem currículo ou com currículo mínimo mais ligado à vida,
isto é, para desenvolverem competências. A educação para a autonomia com
programas-meio, radicalizada no percurso escolar com o objetivo utópico da
redescoberta da ciência acumulada historicamente, isto é, de formar autodidatas
saltando etapas na evolução do conhecimento, conduziria na realidade a pessoas
inteligentes mas ignorantes. Todas estas práticas encerram virtudes, mas são
incompletas.
De facto, para garantir a transmissão e a
assimilação dos conteúdos, com eficácia e eficiência, o professor deve possuir preparação
académica e competência didática e o aluno deve desenvolver competência de
estudo.
O domínio da matéria específica exige permanente
atualização. Não se ensina o que se não sabe. A competência didática consiste na
capacidade não só para transmitir a matéria, mas também para promover a sua
assimilação com vista à realização do aluno. O professor oscila entre dois
métodos complementares, conforme o seu posicionamento perante o aluno – tanto
objeto como sujeito - aspetos polares impossíveis de apreender em simultâneo (tal
como a relação figura-fundo). Com método diretivo, o professor considera o
aluno como objeto condicionável, e, com método não diretivo, como sujeito
autónomo. No primeiro caso, não só explica a matéria, como condiciona o aluno a
assimilá-la, e, no segundo caso, facilita a aprendizagem. Só com técnica e arte
se conciliam ambos os métodos.
É fundamental o desenvolvimento
da competência de estudo, desde os primeiros anos de escolaridade, com mais
incidência no 2.º ciclo e no 3.º ciclo, para prevenir o insucesso escolar e
continuar a aprender ao longo da vida, tanto mais que muitos alunos chegam à
universidade sem saberem estudar. Numa aula formativa, o professor pode efetivamente
conseguir que o aluno compreenda e realize, graças sobretudo à memória de
trabalho e de curto prazo, que permite operações mentais. Porém, já no próprio
dia e nos dias seguintes, processa-se o esquecimento e perde-se depressa o
frágil saber adquirido na aula. A aprendizagem só se completa mediante a
consolidação, isto é, a transferência para a memória de longo prazo, quer
declarativa, quer procedimental. Não basta pois que o professor explique,
condicione e facilite, é necessário também que o estudante disponha de competência
autorregulatória. Persistem ainda crenças irrealistas, que têm condenado
gerações ao fracasso e consentido que apenas os capazes vençam. São
ilustrativos quer o mito construtivista de que os alunos reúnem as capacidades
necessárias para descobrir por si sós (mesmo ativados) e em tempo restrito a metodologia
de estudo já testada e validada, quer o mito do esforço como único meio (sem o
domínio de técnicas eficazes) para os alunos de menores capacidades naturais igualarem
os mais dotados.
Torna-se então imperioso que cada
professor ensine, de modo metódico e científico (e não avulso e empírico), no
âmbito da disciplina, o aluno a analisar, sintetizar, relacionar, memorizar,
aplicar e enfim pesquisar, depois da aula, como pessoa autónoma com espírito
crítico e criativo, no sentido de realmente aprender a conhecer e a fazer. A
formação do professor em métodos de estudo constitui evidentemente condição
indispensável para o ensino do processo do estudo do conteúdo disciplinar.
Nuno Pereira (psiquiatra)
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