Novo texto de Galopim de Carvalho
No
passado Sábado, 31 de Outubro, passou “muito perto” (astronomicamente falando)
de nós a uma velocidade estimada à volta de 35 km/s (126 000 km/h), o corpo
celeste registado como “2015 TB145”. Com
cerca de 600 m de diâmetro, este “rochedo” passou, dizia a notícia divulgada
pela NASA, a uns 486 000 km da Terra, bem para lá da órbita do nosso satélite.
Interpretado como o núcleo rochoso de um cometa que, nas sucessivas passagens
pelo Sol, acabou por perder os componentes voláteis que os caracterizam nas
suas habituais cabeleira e cauda é, como foi referido, um cometa-morto.
Foi
Aristóteles (310 a.C.-230 a.C.) quem primeiro se referiu a estes corpos celestes,
referindo-os por “kométés”, o que quere dizer estrelas com cabeleira.
A queda na Terra de corpos
vindos do espaço e que, uma vez caídos, passamos a designar por meteoritos, tem
sido uma constante ao longo da sua história de cerca de mais de 4500 milhões de
anos (Ma). Entre estes corpos uns são asteróides, outros são núcleos rochosos
de cometas e outros, ainda, os seus fragmentos. Particularmente intensas nos primórdios
do nosso planeta, estas quedas são, relativamente, pouco numerosas no presente.
Uma tal intensidade nesses recuados tempos pode ser concretizada ao observarmos
a superfície selenita, pejada de um sem número de crateras de impacte
meteorítico que conserva, praticamente intacta, uma memória de milhares de
milhões de anos. Destituída dos factores que, na Terra, provocam a erosão do
relevo, a Lua mostra uma paisagem de há muito desaparecida no nosso planeta. As
numerosíssimas e boas imagens de que hoje dispomos dos planetas e seus
satélites e de diversos asteróides provam que sofreram um violento e prolongado
bombardeamento por parte dos mais variados corpos, alguns de dimensões quase
planetárias, deslocando-se a velocidades de dezenas de quilómetros por segundo.
Um tal bombardeamento teve lugar nos primeiros milhares de milhões de anos do
Sistema Solar, tendo provocado, por assim dizer, uma “limpeza do espaço”. Esta
expressão que, em poucas palavras, quer dizer que, na imensa maioria, os corpos
sólidos não integrados na formação dos planetas (os que permaneciam dispersos
no espaço interplanetário e, como eles, a gravitarem em torno do Sol) atraídos
pelo campo gravítico dos corpos maiores (os planetas e os seus satélites e asteróides)
mergulharam neles, produzindo as inúmeras crateras de impacto que podemos ver em todos. Segundo esta
interpretação, o espaço ficou “limpo” e, daí, a relativamente pequena
ocorrência de quedas meteoríticas nos tempos mais recentes.
Os
vestígios na Terra desse impactismo antigo foram completamente apagados,
sobretudo, devido à erosão. Mas, como se disse atrás, ficaram conservados no
nosso satélite, que pode ser visto como um “museu do Sistema Solar”.
Um
outro grande acontecimento relacionado com a colisão de um corpo sólido com a
Terra, terá estado na base da origem do nosso satélite. A teoria do “Grande
Impacte”, numa formulação conjunta dos investigadores do Instituto de Ciências
Planetárias de Tucson (Arizona, EUA) e do Instituto Harvard-Smithsonian de
Astrofísica, defende que, há cerca de 4500 Ma, durante as primeiras fases da
sua formação, o nosso planeta terá sofrido o impacte de um corpo do tamanho de
Marte (que baptizaram de Thea, a deusa pré-helénica da luz e mãe do Sol e da
Lua) de que resultou e ejecção de material dos dois corpos para uma órbita em
torno do maior (a Terra) onde acrecionou, originando a Lua.
São
relativamente escassos os vestígios deste tipo de quedas (astroblemas) que
chegaram até nós. Um dos mais recentes é a conhecidíssima e bem conservada
cratera do Meteoro, no Arizona (EUA), com mais de 1000 m de diâmetro, provocada
por um corpo com cerca de 50 m de diâmetro. Este magnífico testemunho de uma
colisão ocorrida há uns 50 000 anos, é também conhecido por cratera Barringer,
em homenagem ao geólogo americano Daniel Barringer (1860-1929) que o identificou
com tal. Entre os mais antigos astroblemas destaca-se o de Manicouagan, no
Quebeque (Canadá), testemunho de uma cratera com cerca de 100 km de diâmetro,
resultante da colisão de um corpo de diâmetro estimado em 5 km, ocorrida há
cerca de 215 Ma.
Estima-se
em milhares de milhões o número de asteróides ainda a vaguearem no espaço
correspondente ao Sistema Solar, desde as partículas de dimensão das areias aos
mais gigantescos, como Ceres, classificado em 2006 como planeta-anão. A grande
maioria gravita entre as órbitas de Marte e de Júpiter, constituindo a chamada
Cintura de Asteróides.
Incontável
é, ainda, o número de cometas, muitos deles com um núcleo rochoso, localizados num
vastíssimo conjunto exterior à órbita de Plutão conhecido por Nuvem de Orth.
Sempre que, por acção gravítica do astro-rei, um destes corpos ou um seu
fragmento penetra na região central do Sistema Solar, fá-lo segundo uma órbita
elíptica muito alongada, podendo passar muito próximo da Terra, como aconteceu
com o referido cometa-morto que, há dias, passou por nós, ou colidir com ela e,
neste caso, teríamos tido aqui um impacte meteorítico de efeitos altamente
destruidores.
A queda, há 65 Ma, em Chicxulub (península de Iucatão, no
México) de um outro grande corpo, com o dobro do tamanho do “2015 TB145”,
produziu uma cratera de cerca de 200 km de diâmetro. Esta ocorrência é
interpretada, pela grande maioria dos estudiosos, como a causa da extinção em
massa, na qual se admite terem desaparecido cerca de três quartos das plantas e
dos animais de então, numa catástrofe à escala planetária que marca a fronteira
entre o final da era mesozóica e o início da cenozóica. Para se ter uma ideia
da dimensão de um corpo (asteróide ou núcleo de cometa) como o que sustenta
esta interpretação, imaginemo-lo pousado no fundo do oceano. Nesta imagem, a
parte emersa tem a grandiosidade de uma montanha mais imponente de que os
Alpes.
Galopim de Carvalho
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