No Jardins de Cristais, Química e Literatura escrevi um pouco sobre as histórias de vampiros e de zombies. Saliento em particular o excerto seguinte:
Mas acabei por não referir directamente a questão das bruxas e da química que lhes está associada. É notável a similitude das narrativas que nos chegaram sobre estas mulheres, e também homens, acusados de bruxaria. São em geral pessoas que têm bons conhecimentos empríricos sobre ervas com actividade biológica e que saberiam com certeza quais eram alucinogénicas. Estes conhecimentos eram provavelmente transmitidos como segredos e vários autores acreditam que a similitude das narrativas reside nas propriedades alucinogénicas das moléculas envolvidos. Numa sociedade opressiva para a mulher, possuir segredos sobre a cura e alívio de algumas doenças através das plantas e ter a possibilidade de se libertar das tarefas diárias através do voo numa vassoura, era arriscado mas compensador. Claro que o voo era uma alucinação, mas pareceria muito mais real com a ajuda de compostos como a atropina, a hioscimina e a escapolamina da beladona e figueira do diabo, por exemplo, e da batracotoxina obtida dos sapos, entre vários outros compostos obtidos de plantas e animais. Paralelamente, resistindo ao sofrimento insano causado pelos perseguidores de bruxas, foram sendo preservados conhecimentos importantes sobre plantas medicinais tais como a dedaleira que possui o glicosídeio digitoxina que é um estimulante cardíaco, a casca de salgueiro e choupo com salicina e tantas outras mezinhas ou poções que derem origem ou inspiraram um grande número de medicamentos modernos.Brian Stableford, biólogo e autor de ficção científica britânico, procurou, em O Império do Medo, de 1988, outra forma de apresentar o mito do vampiro, dando‐lhe verosimilhança científica e histórica. Neste livro, fantasia uma história alternativa em que uma aristocracia de vampiros imortais domina a terra. Estes não têm problemas com a luz, mas o aumento do seu número é muito limitado, embora continuem a precisar de sangue, mas apenas em pequenas quantidades. Com o desenrolar da história, que vai de 1623 e 1983, percebe‐se que se trata de uma doença benigna causada por um germe (mais tarde identificado como um vírus) que repara danos celulares e retarda os processos de envelhecimento celular. O sangue, modernamente substituído por comprimidos, é necessário porque alguns neurotransmissores importantes deixam de ser produzidos no corpo transformado, que entra em hibernação na sua falta.
No caso do mito dos zombies é também possível encontrar ligações químicas. Existe a teoria, mais ou menos confirmada, de que em determinados locais da América Central são usadas toxinas como a tetrodoxina que causa paralisia e outras drogas para fazer zombies através de vodu. Para o sucesso disso, concorre a credulidade das pessoas, mas não é totalmente descabido.
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