segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Uma escolha para todos que é só para alguns

Encontra-se consagrado na Constituição da República Portuguesa e na Lei de Bases do Sistema Educativo o direito de os pais/encarregados de educação escolherem a escola, pública ou privada, para os seus filhos/educandos. Desde que a escolaridade das crianças e jovens seja guiada pelo currículo oficial, as escolas tenham condições de ensino, e os pais/encarregados de educação paguem as despesas, é um princípio tolerável.

Ora, em muitos casos, este último requisito não se verifica pois o Estado Português instituiu, nos anos de 1980, um subsídio, que ainda se mantém, para as famílias que optem por escolas privadas. Acontece que isto colide com um direito básico, também consagrado em ambos os normativos: o direito à igualdade de oportunidades de acesso e sucesso escolar.
Constituição da República Portuguesa (Revisão de 2005), Artigo 74.º.
1. Todos têm direito ao ensino com garantia do direito à igualdade de oportunidades de acesso e êxito escolar. 
Lei de Bases do Sistema Educativo (Revisão de 2005), de 30 de Agosto, Artigo 2.º
1. Todos os portugueses têm direito à educação e à cultura, nos termos da Constituição da República; 2. É da especial responsabilidade do Estado promover a democratização do ensino garantindo o direito a uma justa efectiva igualdade de oportunidades no acesso e sucesso escolares
Esta colisão, que, caso não se notasse ao ler os normativos, se evidencia na prática, foi recentemente admitida por dois representantes de pais/encarregados de educação, sem, contudo, apresentarem uma saída (in Sol, 7 de Novembro de 2014, p.28, artigo de Rita Carvalho):
A Confederação Nacional de Associações de Família (CNAF) defende este subsídio pois considera que os pais devem poder escolher a escola dos filhos, seja pública ou privada. «Mas na prática as classes sociais mais carenciadas nunca conseguirão ter filhos num colégio, mesmo que considerem que aí o projecto educativo é melhor» [destaque no original], diz Amândio Alves, da direcção da CNFA. 
A Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap) tem uma posição semelhante:  «Sendo um apoio directo à família, alguns ficam com o acesso facilitado. Mas os que queiram e não podem pagar são discriminados» [destaque no original], diz o presidente Jorge Ascensão. 
Uma escolha para todos que apenas permite a alguns escolher não é, de facto, a melhor maneira de honrar a democracia.

1 comentário:

regina disse...

Concordo plenamente, mas tudo isso se insere numa estratégia que favorece o ensino privado em detrimento da escola pública.
Durante muitos anos a escola pública em Portugal tinha muito melhor qualidade que a esmagadora maioria das escolas privadas. Talvez seja ainda assim mas muitos resultados são escamoteados por processos de avaliação pouco fiáveis.
Ab
Regina Gouveia

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