sábado, 6 de junho de 2009

Os professores têm de ser... professores

A jornalista Bárbara Wong perguntou a Ana Maria Bettencourt o seguinte: “Os professores queixam-se por acumular muitas competências como ser psicólogo, assistente social, terapeuta...”. A actual presidente do Conselho Nacional da Educação respondeu: “Mas, os professores têm que ser um bocadinho disso tudo. Há três componentes na missão do professor. Uma é mudar o paradigma do trabalho dentro da sala de aula: mais trabalho e mais acompanhamento aos alunos. A segunda é que o professor tem que ter função de tutoria, de enquadramento e apoio ao aluno; ajudar um aluno com crise pessoal ou que não consegue aprender. A terceira componente é o trabalho em equipa.”

Acontece que os professores não podem ser psicólogos, nem assistentes sociais, nem terapeutas… nem outra coisa qualquer que não seja serem professores.

E nem sequer devem tentar ser outra coisa a ser não professores, pois, caso contrário, estarão a interferir ilegítima e ilegalmente na esfera de actuação profissional de outrem. Além disso, por certo, irão cometer erros, uma vez que, para desempenharem tarefas que não lhes competem, disporão apenas do amável bom-senso, que, em matéria de educação, vale muito pouco.

Como está estabelecido, cada uma destas profissões requer formação específica e certificada, que, uma vez obtida, autoriza os profissionais a exercê-la, com exclusão de outrem.

Os professores são formados para serem professores e é isso, e nada mais do que isso, que, como sociedade, lhes temos de pedir.

E o que é que isso significa?

Significa, antes de mais, ensinar conhecimentos (científicos, artísticos, literários, filosóficos, axiológicos…), com intenções de desenvolvimento cognitivo, relacional, moral, etc. muito precisas, e recorrendo a metodologias adequadas.

Nessa sua função de ensinar, obviamente que têm de acompanhar e apoiar os alunos, mas esse acompanhamento, mesmo que, em certos casos, tutorial, e mesmo que requerendo trabalho em equipa não pode perder de vista o foro pedagógico-didáctico.

Não tem o professor o dever de estar atento aos seus alunos, às suas manifestações como pessoas que o são? Sim, tem. Trata-se, aliás, de exercer um especial dever de cuidado que, à semelhança de outros profissionais que lidam com crianças e jovens, de forma alguma pode negligenciar. Mas esse dever circunscreve-se à identificação de sinais de risco e à colaboração com outros profissionais, quando tal se justificar. Não é a essência da sua profissão.

17 comentários:

guida martins disse...

Deduzo ao ler este texto que só os especialistas nas diversas áreas têm competência para resolver os problemas que, naturalmente, surgem aos alunos. Tenho alguma dificuldade em perceber porque é que as escolas pedem a colaboração e a participação, nomeadamente em reuniões, dos pais e encarregados de educação na vida escolar. Apesar daboa vontade de muitos, só lá vamos fazer figura de corpo presente, pois não temos formação e nada percebemos de educação. Para educar os filhos, os pais têm de ser mestres na arte do improviso: na educação, na medicina, na nutrição, na psicologia, etc.
Obviamente, não estamos a fazer um bom trabalho e o resultado é o de os nossos filhos, cada vez mais, serem apontados como uma das principais causas do insucesso da educação em Portugal. Deixo uma sugestão aos entendidos na matéria: antes de nos responsabilizarem e de nos pedirem colaboração, façam também de nós especialistas e criem um curso, de preferência superior, para encarregados de educação.

Pinto de Sá disse...

Parabéns!
Nesta época de completo desnorte de valores, é CRUCIAL que se lembrem os "fundamentals" das coisas. O papel dos professores é o de ensinar, o dos alunos é o de serem estudantes, e o dos pais é o de serem educadores!!!

tania disse...

Sou professora. Como gostaria de ser professora apenas!! Mas quando um aluno passa a aula a chorar, ignoro a causa do seu choro? Quando um aluno atira a borracha pelo ar para o colega não tenho de alertar para os riscos do seu acto? Quando um aluno agride um colega, penso que é uma pancadinha de amor? Quando um aluno humilha o colega faço de conta que não ouvi? Quando um aluno deixa o teste em branco dou-lhe zero? É que há aulas em que não chego a conseguir falar de Ciências. Por favor, há por aí um psicólogo, um animador social, um terapeuta, que esteja presente nas minhs aulas? É que se puderem colaborar comigo, talvez eu consiga ser, apenas e só, professora. Alguém que desperta a curiosidade dos alunos e os incita a conhecer e a compreender, os fenómenos, os processos, aquilo que o rodeia.Alguém que os questiona e os leva a questionar, que os motiva, que os ajuda, que partilha, que fomenta o espírito crítico, a criatividade e a solidariedade, que os ajuda a crescer e a torna-los seres humanos melhores. Foi para isto que escohi esta profissão. Mas infliszmente não tenho encontrado as condições necessárias para ser professora APENAS.

Fartinho da Silva disse...

No alvo! Muito bom este post, parabéns! Graças ao PREC a escola pública que centra-se em três pilares fundamentais, a saber: 1º Pilar: Rousseau (século XVIII), o aluno não deve sofrer qualquer interferência do adulto porque a criança é pura e assim deve continuar, as ditas "ciências" da educação centram-se neste enorme disparate; 2º Pilar: marxismo-leninismo: a classe oprimida (alunos) devem ser protegidas da classe opressora (professores), todas as ordens emanadas de suas excelências os burocratas e "especialistas" da educação se centram neste enorme disparate; 3º Pilar: o pós-modernimo em si mesmo: foi introduzido na escola a ideia que os professores (palavra banida do dicionário pós-moderno) devem ser o cruzamento perfeito entre um psicólogo, um sociólogo, um marketeer (mesmo que os seus defensores não saibam do que estou a falar), um entertainer, um médico, um pai, uma mãe, um secretário e um amigo.... Claro que como estamos a falar de pós-modernismo temos que perceber que o professor deve ser isto e o seu contrário dependendo da contextualização (palavra tão cara aos defensores desta corrente do pensamento).

Devido a tudo isto, hoje quem percebe as exigências do mercado global tira os seus filhos da escola pública e coloca-os num dos poucos colégios privados de qualidade ainda existentes neste país! E que tipo de escola estes pais querem para os seus filhos? Simples, uma escola com exigência e disciplina, onde os professores estudem e ensinem, os estudantes estudem e aprendam e os pais eduquem! Simples. Mas este tipo de escola vai contra os pilares ideológicos defendidos para a escola pública e vai contra os ENORMES interesses que giram à sua volta e como tal tenho MUITAS dúvidas que a médio prazo tenhamos uma escola pública exigente, onde os professores ESTUDEM e ENSINEM, onde os estudantes ESTUDEM e APRENDAM e onde os pais EDUQUEM.

Imagine-se um Ministro da Educação a criar EXAMES nacionais EXIGENTES e a contar a sério para a NOTA final do aluno nos 2ª ano, 4º, 6º e 9º anos! Era o fim do mundo! Veríamos os representantes dos lobbies na comunicação social, no Ministério, nos partidos a tentar inverter o processo e até a armadilhar o Ministro para o empurrar para a demissão! Que lobbies são estes? Simples. Escolas Superiores de Educação públicas e privadas, Faculdades de Psicologia e Sociologia, Editoras, Formadores, etc.

Há dúvidas? Basta ver quem manda EFECTIVAMENTE no Ministério da Educação.

Fartinho da Silva disse...

Mais uma vez tenho que pedir desculpas pelas gralhas! Ter um equipamento com um ecrã de 2,8'' é muito bom desde que não se escrevam textos com mais de 3 linhas!

CL disse...

Hoje em dia mais do que tentar perceber certas e determinadas problemáticas, faz-se moda discutir sem grandes fundamentos algo tão importante como a Educação. Até porque a mesma não é nada do que era à 20 anos atrás, uma simples sala de aula.
Hoje a Educação quer-se global e inclusiva. Significa isto que é essencial a responsabilização de toda a Sociedade para a educação do indivíduo (individual e colectivo), sendo esta o maior pilar para o desenvolvimento de uma cultura dita civilizada. Este pressuposto é demasiado importante para tanta demagogia e "peixeirada" de um povo mais interessado na bola e telenovelas e que se lembra de vez em quando de mandar os seus “bitaites” pouco reflexivos.
A necessidade urgente de fazer algo produtivo pelo nosso maior tesouro (a educação) só por si significa que ninguém pode ficar de parte ou delegar funções a terceiros. Começando nos principais responsáveis da escola/educação formal, aos responsáveis pela educação informal e não formal é fundamental que cada um desenvolva de forma consciente, inteligente, reflexiva e empenhada as suas "funções". Deste modo ninguém ultrapassará as competências de ninguém e faremos com que a cooperação seja funcional e exequível, caminhando no sentido de uma excelência necessária à educação.
Quanto aos encarregados de educação, permitam-me afirmar que são por si só reflexo da própria sociedade em si. A eles pede-se-lhes que sejam Pais, e isto é algo que não é fácil, mas presumindo-se que a partir do momento que o maioria (ainda quero acreditar nisto) decidiu que o queria ser, se predispôs a sê-lo em todas as suas exigências, não relegando tarefas suas a outros "profissionais", algo está a correr mal...
A desorientação cultural, de formação pessoal e moral que esta sociedade atravessa, demonstra que tudo o que disse ser essencial para uma educação séria e virada para o futuro, está a anos de luz de ser atingido no nosso país. Não por estruturas mal organizadas, não por ideologias desactualizadas, mas sim porque como indivíduos produtores e produtivos, estamos no pior desempenho que se possa imaginar. Como consigo afirmar isto de forma tão "ligeira"? Simples: observo com atenção o que é valorizado no nosso país…o chico-espertismo, tão bem caracterizado por Eduardo Prado Coelho, o facilitismo, o laxismo e a pouca vontade de dar uso ao órgão que nos distingue de outros animais, o cérebro. Fátima, futebol e fado? Exacto, a bola é o que é, e Fátima? Quando os pais de hoje mais depressa levam os filhos a Fátima do que à Gulbenkian...Quanto ao Fado? Nem é preciso dizer muito quando nos é mais fácil dizer que o nosso "fado" é este e nada adianta tentar mudar...
Como mudar então esta tendência? Comecemos por parar de atirar a culpa nos outros, assumir a nossa dose de responsabilidade e tentar mudar mentalidades, começando claramente na nossa.
Ler e aprender, criticar de forma proactiva e não tão-somente reactiva, querer conhecer mais estudando e evoluindo a cada passo dado, querer ir mais longe, deixar de dar valor a mesquinhices e afins como as "problemáticas" do futebol e os "mexericos da telenovela e da vizinha do lado".
Até lá, começando nos pais e terminando nos professores e todos os outros profissionais da sociedade, longe estaremos de alcançar o tão ambicionado sucesso social e intelectual, combustível da evolução.
Sou professor e ainda não sou pai, mas tenho a certeza que não sou "cego intelectual" e uso os meus sentidos para observar o mundo que me rodeia, fazendo uso da cabeça para mais do que bonitos penteados...

João Silva disse...

Cara Helena Damião

Há dias disse-me uma professora, a respeito de um trabalho meu, que filosoficamente era o melhor da turma. No entanto, era pouco dinâmico, demasiado expositivo (leia-se entediante), demasiado argumentativo e demasiado lógico (repare-se nesta acusação macabra!). E lá levei a 2ª pior nota da minha catita turma.

Nem fiquei perplexo: tais coisas são normais em quem confunde relativismo com tolerância. Mas foi-me invadindo um sentimento indevido de desilusão: desiludiu-me a passividade aprovadora do auditório, a incompreensão da minha irónica farpa "Isso realmente faz sentido!" e claro a profunda ignorância do meu professor.

Dito isto, não só aclamo como agradeço o seu texto: serviu para me relembrar que não estou tolo, que o professor deve ensinar e o aluno aprender, que não se deve falar para impressionar.

Sinceros cumprimentos!

P.S.: o Grego na minha escola não abriu por insuficiência de alunos - muito triste notícia!

João disse...

Esta senhora Bettencourt deve viver num universo paralelo. Um professor, por exemplo de Ciências, ou de Geografia, pode ter à volta de 120 alunos por ano lectivo. Se for de Matemática ou Língua Portuguesa podem ter pelos menos uns 100. Qualquer pessoa com um bocadinho de senso percebe que esta história de tutoria, acompanhamento pessoal, ensino de 1 para 1 é pura poesia. Numa turma de 25 alunos, em 90 minutos de aula, o professor pode dispensar em média 3 minutos de ensino individualizado a cada alminha. E não sobra tempo nenhum nem para ensinar alguma coisa no sentido tradicional, nem para avaliar coisa nenhuma.

Talvez essa senhora possa conseguir do Ministério que passemos a ter turmas de 10 alunos e o máximo de 3 turmas por professor. Isso fazia algum sentido.

Helena Ribeiro disse...

PS2- E o Latim, já só em meia dúzia de escolas...!!!

Helena Ribeiro disse...

Eh,Eh,Eh

Anónimo disse...

Ou a Helena Damião apenas quis desconversar ou não percebeu o que a tal senhora disse.

Um BOCADINHO disso tudo não é a mesma coisa que um psicólogo, um assistente social ou um terapeuta POR INTEIRO.

Aliás, o que a conselheira do CNE afirma nada mais é, por singelas palavras, do que os requisitos que a LEI DA REPÚBLICA exige de quem quiser exercer as profissões de EDUCADOR de infância ou de PROFESSOR dos ensinos básico e secundário (DL 240/2001 de 30 de agosto).

Ora, enquanto a lei estiver em vigor, os professores renitentes nada mais poderão fazer do que protestar contra ela ao mesmo tempo que têm de se submeter aos seus ditames, sob pena de serem metidos nos eixos por quem de direito (dura lex sed lex).

Alberto Sousa

setora disse...

6º ano de escolaridade. Aula de Estudo Acompanhado. A proposta de trabalho é exercitar o cálculo preenchendo uma ficha num tempo determinado sem recurso a calculadora. Todos os alunos aderem à tarefa excepto um que não volta a folha que lhe tinha sido distribuída nem pega na caneta. Está sozinho numa mesa da última fila. Na sala estão duas professoras, a de matemática e a de português. Que fazer?

João disse...

E eu proponho ao Alberto Sousa que contrate um polícia para vigiar cada professor durante cada aula, para verificar se ele está a ser psicólogo, assistente social e tudo (excepto professor). E se o professor não não for tudo isso e depressinha, dura lex sed lex, logo uma multa de excesso de lentidão.

Alberto Sousa com essas ameaças não deve estar a falar a sério, pois não? Vá pastar a vaca!

setora disse...

Faltarão dados para tentar indicar o que fazer?
Que dados?

Anónimo disse...

Setora,
experimente estar atenta a qualquer emoção menos positiva que essa atitude do aluno lhe possa trazer ( reacções adversas). Tente chegar a ele, falar-lhe com firmeza ( não agressividade nem autoritarismo), olhando-o nos olhos. Transmita-lhe que sabe que ele é capaz.E que a única hipótese é fazer o trabalho - esta última parte implícita na sua atitude. Se ele se entir acolhido, com certeza trabalhará.

Maria de Lurdes

João disse...

A Maria de Lurdes esqueceu-se de escrever o resto da mensagem, que dizia assim:

"se o aluno se encontrar armado, assuma na parte implícita da sua atitude que ele é o elemento mais forte e, como tal, a Setora concorda inteiramente com a sua postura insolente e mandriona."

A Maria de Lurdes precisava de encontrar um certo tipo de alunos para ver se abria a pestana.

Setora disse...

Maria de Lurdes, faltam-lhe dados. Precisava de conhecer o aluno. Aqui talvez sejamos "psicólogos". Mas com essa conversa nem eu nem um sério psicólogo lá iríamos. É um pouco agressivo, não gosta de "ordens" nem desses acolhimentos.
E para o João até teríamos que ser polícias/apalpadores ou detectores de metais e teríamos de assumir de imediato que o aluno é insolente e mandrião.
Tem 12 anos e sai de casa às 6:30. A aula era ao meio-dia.
Foi mais simples. A prof de português pegou numa ficha e num lápis, avançou até ao fundo, sentou-se na cadeira vaga ao lado do aluno e desafiou: vamos fazer isto ainda dentro do tempo. Arrancou para a tarefa e o rapaz virou a folha pegou na caneta e seguiu o exemplo. Realizou 80% do trabalho.

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