Quatro professores portugueses faleceram recentemente enquanto trabalhavam ou imediatamente após terminarem tarefas de trabalho: corrigir testes, dar aula, enviar dados para a escola. Se há uma relação entre as mortes e as exigências laborais não foi ainda apurado, mas foi pedido ao Ministério Público que faça uma investigação (ver aqui, aqui, aqui e aqui).
Trabalhar sob constante pressão, a tempo inteiro, em ambientes sociais adversos não é uma particularidade do ensino, mas está bem presente nesta profissão. E são os professores mais dedicados, preocupados e cumpridores que a sentem em contínuo. Abandonar a profissão tem sido, para muitos, a solução ou a salvação. Isto acontece no nosso país e noutros com o mesmo alinhamento político-curricular.
Há algum tempo encontrei e guardei o depoimento de uma jovem professora que ilustra esta situação, a qual parece agravar-se de ano para ano (ver aqui e fui aqui, aqui).
Diz ela (fiz uma tradução-síntese das suas palavras) que as pessoas hão-de pensar que deixou o ensino por insatisfação quanto ao salário ou por ter encontrado uma profissão melhor. Não é o caso, apesar de a sua "paixão pelo ensino" se manter, sentia-se com se tivesse o "cabelo a arder", não podia continuar. E explica.
A desculpa de que "as crianças mudaram" não colhe. As crianças são crianças. O que mudou foi a parentalidade e a sociedade, as crianças são vítimas disso. Os pais trabalham horas sem conta, deixando os filhos em condições instáveis, há influências terríveis dos meios de comunicação. Eventualmente na sala de aula é o primeiro lugar em que as crianças irão ouvir um 'não', em que se lhe colocam limites, precisamente porque é a sua educação que está em causa.
Face a este problema tão grave a resposta é que se precisa de escolas do século XXI apetrechadas com tecnologia, promovendo aprendizagens práticas (isso fica bem no "site" da escola). De alguma forma sugere-se que se esqueçam os conceitos básicos, que não é relevante um comportamento adequado...
Acresce que, como a abordagem tecnológica não parece estar a funcionar, insiste-se no "treino" aos professores, roubando tempo ao ensino. Um desperdício.
Em vez de responsabilizarem os pais e torná-los verdadeiros parceiros, adopta-se a mentalidade de "atendimento ao cliente". Tive pais que, por exemplo, queriam participar de viagens de campo, que me ocupavam muito tempo com telefonemas e que me disseram que não tinha permissão para dizer "não" aos seus filhos.
Sentia que a minha saúde física e mental estava em perigo, percebi que os meus filhos precisavam e mereciam mais do que estavam a receber e que não podia, não era capaz de ensinar verdadeiramente os meus alunos.
Deixei o meu fundo de reforma, a minha licença médica, não fiquei com um salário melhor. Saí da sala de aula mas ainda sinto que estou a defender as crianças, apenas o faço agora de um modo diferente.
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3 comentários:
Como é que os horários de trabalho diminuíram, mas os/as pais/mães têm menos tempo para os/as filhos/as?
Pergunta pertinente a do leitor anónimo. A questão é saber em que profissões diminuem os horários, como é que diminuem, etc. E também como é que as famílias se organizam para cuidarem das crianças. A verdade é que, também no nosso país, passando por escolas nesta altura do ano, vêem-se lá crianças desde manhã até à noite.
Cordialmente,
MHDamião
O caldo cultural judaico-cristão, que aqueceu as cabeças e os estômagos europeus pelos séculos dos séculos, está a esfriar muito rapidamente! Na escola do século XXI, fugir para a frente, com muita autonomia e flexibilidade, mas sem ensino e aprendizagem, conduzir-nos-á, inevitavelmente, a um beco sem saída!
Em Portugal três grandes questões necessitam de resposta urgente:
- Continuar a investir numa escola pública massificada e sem qualidade ainda faz sentido?
- A escola ainda serve para ensinar?
- O quê?
Enquanto não houver respostas para iluminar os caminhos do futuro, a selvajaria bem instalada nas escolas não vai acabar!
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