terça-feira, 21 de maio de 2019

"A desvalorização do papel do professor, de ensinar, de transmitir um saber"

José Pacheco Pereira escreveu recentemente um artigo para o jornal Público a que deu o título A hostilidade aos professores. Detêm-se em indícios preocupantes de hostilidade para com os professores que vale a pena analisar "porque ela incorpora aspectos muito negativos da evolução da nossa sociedade", no sentido de um "profundo retrocesso (...) naquilo a que chamamos precariamente “civilização”.
"... isso acontece muitas vezes na história: anda-se para trás quase sem se dar por ela, contando com a inacção, a apatia, ou a acédia, de quem deveria reagir."
"Como a democracia é uma fina película contra a barbárie e é apenas defendida pela vontade dos homens e não por nenhuma lei da natureza, mais vale prevenir com todos os megafones possíveis." 
E, no nosso país, que razões estão na base da hostilidade ? 
"... tem a ver com a vitória muito significativa da ideologia da troika, que está longe de ter desaparecido e, nalguns casos, migrou para sectores que lhe deveriam ser alheios e não são: os socialistas, por exemplo. Disfarçada de economia, essa ideologia assenta numa visão pseudo-científica, muito rudimentar e simplista, cheia de variantes neo-malthusianas, que se apresentou como não tendo alternativa, a nefasta TINA. Isto encheu-nos as cabeças e não saiu delas. Essa ideologia centra-se na crítica do Estado, em particular do Estado social, e transforma os funcionários públicos em cúmplices de uma rede de privilégio, sendo descritos apenas como despesa excessiva." 
"Portanto, gritem contra a função pública e os malefícios do Estado, que também existem como é óbvio, mas percebam que o pacote de não ter professores, enfermeiros, médicos (...) leva atrás de si o ensino e a saúde pública (...). 
Mas, estas razões de "desvalorização do papel do professor, de ensinar, de transmitir um saber"
"... vem num pacote sinistro que inclui o falso igualitarismo nas redes sociais, o ataque à hierarquia do saber, o desprezo pelo conhecimento profissional resultado de muito trabalho a favor de frases avulsas, com erros e asneiras (...). É o ascenso da nova ignorância arrogante, um sinal muito preocupante para o nosso futuro."

8 comentários:

Anónimo disse...

Nos nossos tempos, também existem grandes hostilidades contra os padres e os toureiros. Só que estas vão-se resolvendo, sem dramas de maior, porque o Estado não impõe a obrigatoriedade de frequentar missas nem festas bravas. Já, na Educação, os jovens cidadãos são obrigados, por lei, a receber lições de professores que a sociedade atual vê, genericamente, como inimigos!
O último resquício de "poder" e importância social que resta aos professores, dignos da função que exercem, é a possibilidade de avaliarem os seus alunos através de exames nacionais. Com carreiras únicas, onde um professor de matemática, que ensina trigonometria e números complexos, é completamente igual, na "hierarquia do saber", a um educador de infância que conta a história do gato das botas, e sem exames nacionais, que a reforma da flexibilidade curricular em curso acabará por extinguir, os professores serão definitivamente reduzidos à condição de proletários vulgares, com tanto direito a realizarem greves como os camionistas de materiais perigosos!

Rui Baptista disse...

Escreveu o sociólogo Francesco Alberoni (2010): "Ir para a universidade e para escolas de excelência com professores respeitados e programas rigorosos; é por esta razão que há cada vez mais gente a querer uma escola mais séria, mais rigorosa, com professores mais preparados e mais respeitados". E não um país, como escreveu, o neurocirurgião João Lobo Antunes em que a mediocridade é lei, por uma carreira docente única parida pelos fórceps da Fenprof e sindicatos quejandos.

Carlos Ricardo Soares disse...

O Pacheco Pereira está cada vez mais retórico-opinativo, diria, em modo automático. Os professores merecem muiiiito mais e dispensam condescendências, venham de quem vierem. O Pacheco Pereira assume e arroga-se um estatuto, diria de vedeta, paternalista, moralista ideológico, entre o teórico das virtudes de sempre e, paradoxalmente, o prático do nunca te comprometas, que é mais certo.

Anónimo disse...

Isto já não lá vai com falinhas mansas!
Os professores, especialmente os do liceu, provinham, até há três ou quatro décadas atrás da pequena e média burguesias que vinham governando o país, pelo menos, desde os consulados dos doutores Oliveira Salazar e Marcelo Caetano, fazendo, portanto, parte do rolo compressor que esmagava o povo português de aquém e além-mar! Hoje, tudo isso acabou, o mundo mudou, quer o Dr. Pacheco Pereira -que também já deu aulas, conforme o ouvi confessar publicamente perante as câmaras da televisão- queira, quer não!
Atualmente os professores, agregados aos educadores de infância, são, por assim dizer, a vanguarda da classe operária. Os docentes e educadores de infância sabem que a sua valorização socioprofissional já não depende do reconhecimento de uma sociedade portuguesa atualmente alineada por telemóveis, fado e futebol, nem, muito menos, pela frequência de cursos universitários, que antigamente os licenciavam para dar aulas, pelo que a única saída possível é a luta revolucionária. No dia em que os professores e os educadores de infância se unirem aos doutores enfermeiros, aos motoristas de matérias perigosas, aos mineiros, aos pescadores, aos gruístas, aos escrivães de direito e a todo o povo, de um modo geral, ao poder político não restará outra opção senão provê-los em lugares do quadro, abonando-os com vencimentos avultados, conforme é prática comum por essa Europa rica de que fazemos parte. Se os professores e educadores de infância nunca tivessem deixado de lutar, desde o 25 de Abril de 1974, hoje estariam todos ricos!

Anónimo disse...

É muito curiosa a ideia, aqui plasmada nos comentários, sobre os educadores de infância que servirão apenas para entreter crianças e o consequente rebaixamento face aos outros. Não vou aqui falar da importância das fundações de uma casa, descansem.

Ivone Melo - Professora ( Ensino Secundário )

Anónimo disse...

Aqui do que se trata é de uma questão de "hierarquias do saber". Já imaginou a confusão que seria no serviço nacional de saúde se obrigassem os médicos a fazer uma carreira única com os novos enfermeiros doutores?! Estes últimos progrediriam muito mais rapidamente na carreira porque, em média, perdem menos tempo com a sua formação inicial politécnica, e depois o Estado acabaria por não ter dinheiro para pagar a tantos doutores enfermeiros e médicos, e lá estaria, mais uma vez, o caldo entornado! Devemos aprender com as lições da história: milhares de professores primários e educadores de infância puderam reformar-se com pouco mais de cinquenta anos de idade porque, aquando da revolucionária criação da carreira única dos professores dos ensinos básico e secundário e dos educadores de infância, verificou-se que, em média, os primários e educadores de infância tinham começado a trabalhar mais cedo do que os professores que tinham formação universitária e, portanto, tinham mais tempo de serviço! Por estas e por outras, os professores do ensino secundário atualmente só podem reformar-se com cerca de 67 anos de idade. Acha justo, colega?!

Ana disse...

Os tempos são de uma falta de ética generalizada, despudorada e despenalizada, que permite a muitos entrar pela casa adentro dos seus concidadãos, em programas televisivos como o "Eixo do Mal", por exemplo, para opinarem sobre o que não dominam, impunemente, em registos linguísticos extremados e, frequentemente, indignos, como:
"... não se falou noutra coisa senão na porcaria dos professores".
(Pedro Marques Lopes; "Eixo do Mal"- SIC; 23 de maio de 2019).

Anónimo disse...

Desde o dia da nefasta criação da Carreira Única dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário e dos Educadores de Infância, filha dileta da Revolução Dos Cravos, a desvalorização do papel do professor (do ensino secundário e com formação universitária), de ensinar, de transmitir um saber, tem prosseguido com uma aceleração alucinante nos últimos tempos, aproximando-se vertiginosamente do precipício pavoroso que é a Reforma da Flexibilidade Curricular.
A grande luta dos sindicatos comunistas, comandados pelo professor primário Mário Nogueira, em conluio com os sucessivos governos, é a defesa encarniçada dos interesses e direitos dos antigos professores primários e educadores de infância, que estiveram sempre na linha da frente na luta contra a ditadura fascista, e desprezo pelos antigos professores do liceu, aos quais custa entender a mensagem simples de que agora a sua função já não é ensinar matérias que exijam estudo aos pobres filhos e filhas das classes operárias.
Por uma mera questão de igualitarismo radical, dado que agora os comunistas e os tais sucessivos governos já exigem formação politécnica aos primários e educadores de infância, a Maria de Lurdes Rodrigues, apoiando-se nos vastos trabalhos teóricos da Ana Benavente, e de muitos outros, destruiu os horários e condições de trabalho dos professores do secundário. Para não me alongar em argumentos, peço aos meus estimados leitores que encontrem um mínimo de sentido justiça em quem humilhou os professores do ensino secundário com os horários atualmente em vigor:
-Nas escolas secundárias, durante os intervalos, de cinco, dez, ou quinze minutos, entre os tempos letivos, de quarenta e cinco, ou cinquenta minutos, contabilizados a toque de campainha, os professores podem deslocar-se à casa de banho ou aonde quiserem, dentro da escola, mas, nesses intervalos, não recebem um cêntimo do Estado! Nem os odiosos capitalistas, inimigos dos comunistas da fenprof, tratam tão mal os seus empregados!

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