segunda-feira, 23 de novembro de 2015

CEM ANOS DE EINSTEIN

Meu artigo no último As Letras entre as Artes (na foto o casal Einstein):

Neste Ano Internacional da Luz comemora-se o centenário de uma das teorias físicas maiores e um dos picos mais altos do pensamento humano: a teoria de relatividade geral de Albert Einstein. Precisamente no dia 25 de Novembro de 1915 o sábio suíço nascido na Alemanha e mais tarde naturalizado norte-americano escreveu uma equação notável que junta matéria, energia, espaço e tempo  de modo a explicar a gravitação universal. Isaac Newton tinha em 1687 alcançado uma fórmula para a força entre os astros (como a Terra e a Lua) ou entre um astro e um objecto com massa (como a Terra e uma maçã), mas ninguém percebeu qual era o mecanismo dessa força  até surgir Einstein  A partir da equação de Einstein ficou claro que a força da gravidade é a deformação que a matéria e energia (unidas no conceito de matéria-energia na teoria da relatividade restrita de Einstein de 1905, dez anos antes da relatividade geral) provoca no espaço e ao tempo (unidos no conceito de “espaço-tempo”, que também surgiu na mesma teoria). Em redor de um astro o espaço e o tempo são modificados, isto é, réguas e relógios passam a fornecer resultados diferentes dos que forneceriam no espaço longe desse astro. Uma boa analogia é o encurvamento de um lençol esticado quando no meio dele se coloca uma bola pesada: a superfície do lençol dá uma ideia do que é a deformação do espaço, que é ao fim e ao cabo a atracção gravítica.

A relatividade geral serve para descrever, entre tanto outros objectos cósmicos, os buracos negros, uma espécie de abismos no espaço-tempo. O que são buracos negros?  Resultam de estrelas pesadas que, após uma violentíssima explosão, ficam reduzidas ao seu caroço muito compacto. O espaço-tempo à volta é tão deformado que o nosso mundo acaba aí, quer dizer, quem  entrar dentro de um buraco negro não pode retornar. Tudo cai para dentro de um buraco negro, incluindo a luz, e é por isso que se lhe chama negro. Segundo a teoria da gravidade geral de Einstein, a luz segue os caminhos mais curtos através do espaço-tempo deformado, acabando por cair sobre o buraco-negro, isto é, pode-se dizer, por mais estranho que possa parecer,  que a “luz pesa”! Esses objectos começaram por ser fictícios, mas hoje há um vasto conjunto de provas que os abonam

Será que podemos imaginar o inverso de um buraco negro? Sim, se um buraco negro é o sítio para onde tudo vai, o buraco branco é o sítio de onde tudo vem. Existirão buracos brancos? Não há qualquer evidência para a existência de buracos brancos dentro do Universo. Mas, de facto, vivemos no interior de um grande buraco branco: o nosso próprio Universo, que provavelmente é infinito, o qual, em consonância com a teoria da relatividade geral, teve o seu início no Big Bang, há cerca de 14 mil milhões de anos. Esta grande explosão inicial pode ser imaginada como o evento em que tudo apareceu, o espaço e o tempo, a matéria e a energia, tendo começado tudo com a luz, que é ao fim e cabo uma forma de energia.

Einstein trabalhou muito antes de chegar à fórmula que encerra os segredos da gravitação. Cedo percebeu que a teoria da relatividade restrita, segundo a qual as leis da física são as mesmas para todos os observadores em repouso ou em movimento com velocidade constante, devia também ser aplicada a observadores com velocidade variável, isto é, acelerados. É esse o grande salto da teoria da relatividade restrita para a teoria da relatividade geral. Newton imaginou uma maçã a cair, mas Einstein imaginou-se a si próprio a cair. A epifania ocorreu em 1907 quando Einstein teve o que chamou o “pensamento mais feliz da sua vida”:  apercebeu-se, sentado numa cadeira, de que, se estivesse em queda livre, em movimento acelerado, “não sentiria o seu próprio peso”, uma vez que a cadeira cairia com ele. Embora a cair, o sábio estaria parado relativamente à cadeira. O princípio que afirma a queda idêntica de todos os corpos tinha sido há muito descoberto por Galileu. Uma consequência imediata da generalização do princípio da relatividade de 1905 era que um raio de luz vindo do espaço longínquo encurvaria ao passar perto do Sol. O efeito era minúsculo e não pôde ser logo confirmado.

Einstein precisou de uma geometria curva em vez da geometria plana de Euclides. Geometrias ditas não euclidianas, como sabemos hoje existir em volta de buracos negros,  já existiam nos livros de Matemática, dando razão a Galileu, que tinha dito que “o Livro da Natureza está escrito em caracteres matemáticos”. No caminho para a equação que descreve a gravitação, Einstein, melhorando a descrição físico-matemática, chegou finalmente a um valor para o ângulo de deflexão da luz que era o dobro do previsto pela relatividade restrita. A Primeira Grande Guerra impediu a realização de expedições para observação de eclipses, ocasiões favoráveis para medir deflexões de raios provenientes de estrelas por trás do Sol. Foi em 29 de Maio de 1919 que uma expedição inglesa, dirigida por Arthur Eddington, se deslocou à ilha do Príncipe, na altura uma colónia portuguesa,. para fotografar um desses eclipses. Os astrónomos conseguiram obter algumas imagens do Sol, numa aberta de uma enorme chuvada. Einstein em breve recebeu um telegrama de um colega, que o felicitava pelo sucesso da sua previsão. Mas Einstein sabia estar certo. Chegou mesmo a dizer que teria pena de Deus se a realidade fosse diferente daquilo que ele tinha previsto (Deus para ele era a harmonia universal e não o Deus da Bíblia).

A 6 de Novembro de 1919 numa sessão conjunta da Sociedade Real de Londres e da Sociedade Astronómica Real de Londres, na presença das maiores autoridades da ciência (na parede Newton assistiu em retrato), os resultados da observação solar no Príncipe foram anunciados e Einstein foi, finalmente, aclamado.  Foi o princípio da sua glória. O jornal  Times de Londres titulou Revolução na Ciência. Essa notícia significava que Einstein tinha conseguido ver mais longe do que Newton, o autor dos “Principia Matematica” e antigo Presidente da Sociedade Real. A fama mundial logo obtida pelo sábio facilitaria mais tarde a sua mudança para Princeton, nos Estados Unidos. Com efeito, em 1932, 
Einstein, pressionado pela perseguição nazi aos judeus, disse adeus a Berlim, onde vivia. A ciência estava a passar simbolicamente do Velho para o Novo Mundo.


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