quinta-feira, 14 de maio de 2015

E Tudo O Vento Levará



 O primeiro-ministro queria que as eleições se lixassem, mas já começou a lixá-las. À falta de pensamento político, usa a astúcia. Como as sondagens não o colocavam no poleiro, resolveu coligar-se ao CDS para as próximas legislativas. Antes já enchera os bolsos, graças à emissão desenfreada de dívida pública, para que, na expiração do seu mandato, reduza em algumas migalhas a dívida. Por outro lado, a sua política de privatizações não pára, como não param os casos de tuberculose nas escolas, a atomização caótica do SNS e o aumento de desempregados. Ao elogiar Dias Loureiro, não me apanhou de surpresa (nem ao residente de Belém), porque ainda me lembro das declarações que Passos Coelho fizera a respeito da licenciatura do seu amigo Miguel Relvas. Quando chegarem as eleições, a porta vai estar polida e os portugueses vão levar o lixo nos passos.
Não sei se Passos Coelho leu o romance de Margaret Mitchell (E Tudo O Vento Levou) e se se inspirou na governação do estado da Geórgia, por Rufus Bullock, após a guerra civil americana. Eu só espero que o fascismo ou o neoliberalismo (os fascistas passaram a adorar o dinheiro e a espezinhar a moral!) não se solidifique e que a noite escureça a porta. Também Scarlett O’Hara regressa sozinha a Tara, após três casamentos.
Este excerto do romance é histórico: 
«O Estado sufocava sob o peso das contribuições, pagas de má vontade, pois os cidadãos sabiam que, na maior parte, as somas destinadas ao interesse geral eram embolsadas por certos números de indivíduos.
Em torno do parlamento estadual apertava-se um círculo de oportunistas, de especuladores, de criaturas sem moral e vindas na esperança de tirar proveito da orgia louca das despesas, que a muitos enriquecia. Não tinham dificuldade em obter subvenções do Estado para construir, para comparar carruagens e locomotivas que jamais seriam compradas, para construir edifícios públicos que só se construíam na imaginação desses aventureiros.

Emitiam-se títulos de dívida pública, aos milhões, sempre de modo ilegal e fraudulento. O funcionário responsável do Tesouro, homem sério embora republicano, protestava contra essas emissões e negava-lhes a assinatura; mas, como acontecia a todos que procuravam opor-se àquela onda de abusos, os seus esforços eram inúteis.
A rede de caminho-de-ferro, que outrora proporcionara recursos permanentes ao Estado, vivia em regime deficitário, e a dívida atingia a linda soma de um milhão de dólares. Já não era uma rede de caminho-de-ferro, mas uma enorme cavalariça de Augias, onde os parasitas chafurdavam à vontade. Havia inúmeros funcionários nomeados por motivos de ordem política, sem que ninguém quisesse saber da sua competência.
(…)
O sistema que reinava na administração do caminho-de-ferro exasperava deveras os contribuintes, tanto mais que, em princípio, os lucros da exploração deviam ser aplicados no estabelecimento de escolas gratuitas. Mas, como só havia dívidas e nenhuns lucros, nenhuma escola se abria. Eram poucas as pessoas ricas que pudessem mandar os filhos às instituições pagas, de modo que essa geração em idade escolar crescia na ignorância, preparando um futuro de homens e mulheres sem qualquer instrução.

Mais ainda que a desordem nas finanças públicas, enfureciam os georgianos contra as autoridades do Norte o desperdício e a corrupção de que dava provas o governador.»

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