sábado, 2 de maio de 2015

Jovan Dučić

 
 


A poesia de Jovan Dučić oscila entre a Luz e as trevas. O poeta sérvio-bósnio nasceu sob o jugo do império Otomano e viveu entre o último quartel do século dezanove e a primeira metade do século vinte. Se não se pode abordar a ficção sérvia sem se ler Ivo Andrić,  o mesmo se passa com a poesia de Jovan Dučić. 





Asas

Levantar voo e voar, voar sempre mais alto,
Para o espaço ignoto como para um velho amigo,
Rodopios imparáveis, como um belo pássaro,
Que vão desfalecer nas mãos do infinito.

Ouvir apenas os seus movimento pelo espaço -
A música da sua asa! E, até ao término,
Perder do olhar o seu fim e o de seus traços,
E desaparecer, magnifico, no ar sereno.


Se alguém vive com sede a cada dia mais seco,
São estes olhos que há muito tempo a luz tem bebido,
Como sorvete, doces, duas ovelhas no fresco,
Como dois vampiros ávidos sugam sangue.


Que sejam esquecidas as sombras e os terrenos nascimentos;
A luz atinge-me como uma raiva mortal
Os seus raios trespassam-me como lanças,
Ali, onde bruxuleiam, sem sombra, os meios-dias eternos.


Cruzamento mirífico ​​de sóis, onde nasce
A intempérie de luz, que não se detém no caminho,
Através do país silencioso onde reina e se cala
O Deus que ofusca os olhos que ilumina.

Só conheço o abismo, dessas alturas,
Para todas as minhas fibras no espaço observado;

Voar, voar eternamente, sem obstáculos,
E tombar sobre o peso único das minhas asas encantadas.

 
O Limiar

Quando se chegam ao olhar do porto,
Após as férias e as lágrimas,
Os abissais cumes da morte

E os lagos escuros, frios e calmos –

 
Quem aguardam no limiar? Oh,
É enigma que perdura, eterno!

A fronteira entre duas graças
E duas fragilidades, qual é ela?

 

Esta união silenciosa de mistérios,
Ponte lançada entre duas alegrias,

Esta cruz de duas quimeras –
À vida e morte é superior!

 
Ela sustenta, a corda sem vida,
Os sons do céu e da terra,

E o germe negro da meia-noite,
As muitas cores do voo solar...

 
Mas o limite o que é que significa,
O que separa o movimento do repouso?

As margens do rio ao crepúsculo
Desfiam-se sob a força das ondas.


O Pinheiro

Colossal e sombrio, tristemente
Ergue-se, anónimo, como a erva,

Manancial estranho sob o firmamento
Onde no seio a noite hospeda um corvo.


Eterno e solitário, porte formidável,
Dos primeiros raios da aurora até ao ocaso

Sobre o penhasco radioso treme
A sombra negra do seu desespero.


Ele geme ao céu para que a noite o vele
Quando tudo dolorosamente se encobre

E toda a noite conta às estrelas
A solidão acerba desta terra.

 

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