A poesia de Jovan Dučić oscila
entre a Luz e as trevas. O poeta sérvio-bósnio nasceu sob o jugo do império
Otomano e viveu entre o último quartel do século dezanove e a primeira metade
do século vinte. Se não se pode abordar a ficção sérvia sem se ler Ivo Andrić, o mesmo se passa com a poesia de Jovan Dučić.
Asas
Levantar voo
e voar, voar sempre mais alto,
Para o
espaço ignoto como para um velho amigo,
Rodopios
imparáveis, como um belo pássaro,
Que vão
desfalecer nas mãos do infinito.
Ouvir apenas
os seus movimento pelo espaço -
A música da
sua asa! E, até ao término,
Perder do
olhar o seu fim e o de seus traços,
E desaparecer,
magnifico, no ar sereno.
Se alguém vive
com sede a cada dia mais seco,
São estes
olhos que há muito tempo a luz tem bebido,
Como sorvete,
doces, duas ovelhas no fresco,
Como dois
vampiros ávidos sugam sangue.
Que sejam esquecidas
as sombras e os terrenos nascimentos;
A luz
atinge-me como uma raiva mortal
Os seus
raios trespassam-me como lanças,
Ali, onde
bruxuleiam, sem sombra, os meios-dias eternos.
Cruzamento
mirífico de sóis, onde nasce
A intempérie
de luz, que não se detém no caminho,
Através do
país silencioso onde reina e se cala
O Deus que
ofusca os olhos que ilumina.
Só conheço o
abismo, dessas alturas,
Para todas
as minhas fibras no espaço observado;
Voar, voar
eternamente, sem obstáculos,
E tombar sobre
o peso único das minhas asas encantadas.
O Limiar
Quando se
chegam ao olhar do porto,
Após as
férias e as lágrimas,
Os abissais
cumes da morteE os lagos escuros, frios e calmos –
Quem
aguardam no limiar? Oh,
É enigma que
perdura, eterno!
A fronteira
entre duas graças
E duas
fragilidades, qual é ela?
Esta união
silenciosa de mistérios,
Ponte
lançada entre duas alegrias,
Esta cruz de
duas quimeras –
À vida e morte
é superior!
Ela
sustenta, a corda sem vida,
Os sons do
céu e da terra,
E o germe
negro da meia-noite,
As muitas cores
do voo solar...
Mas o limite
o que é que significa,
O que separa
o movimento do repouso?
As margens
do rio ao crepúsculo
Desfiam-se sob
a força das ondas.
O Pinheiro
Colossal e sombrio,
tristemente
Ergue-se,
anónimo, como a erva,
Manancial
estranho sob o firmamento
Onde no seio
a noite hospeda um corvo.
Eterno e
solitário, porte formidável,
Dos primeiros
raios da aurora até ao ocaso
Sobre o
penhasco radioso treme
A sombra
negra do seu desespero.
Ele geme ao
céu para que a noite o vele
Quando tudo
dolorosamente se encobre
E toda a
noite conta às estrelas
A solidão acerba
desta terra.
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