No
dia 28 de Maio, pelas 17h30, no Rómulo - Centro Ciência Viva da Universidade de
Coimbra, irá realizar-se a Conferência Diálogos:
Medeia de Eurípides – o conflito
entre paixão e razão.
Serão
oradores os Professores Delfim Leão e Alexandre Sá, da Universidade de Coimbra.
Delfim Leão apresentará a comunicação Em Defesa de Medeia? O Horizonte Literário e Jurídico da Medeia de Eurípides e Alexandre Sá A Medeia Enquanto Paradigma Fraturante.
No
decurso da Conferência haverá Leitura
encenada de excertos da Medeia pelo
grupo de teatro “Thíasos” / FESTEA – Festivais de Teatro de Tema Clássico.
Esta
Conferência enquadra-se no âmbito da colaboração entre o Projeto Diálogos e a
Universidade de Coimbra: Rómulo - Centro Ciência Viva; Centro de Estudos Clássicos
e Humanísticos; Instituto de Estudos Clássicos e Grupo de Teatro “Thíasos” /
FESTEA.
O
Projeto Diálogos, apoiado pela Fundação Calouste Gulbenkian, visa promover uma
reflexão a partir de textos fundamentais da história do pensamento ocidental.
Aqui se inscreve a Medeia de
Eurípides.
Maria
Helena da Rocha Pereira refere na Introdução da Medeia de Eurípides, na edição da Fundação Gulbenkian que “(...) é na forma que Eurípides deu à
história que o mito cristalizou, foi assim que ele se transformou em motivo de
inspiração de pintores e poetas desde a Antiguidade aos nossos dias”.
Analisar,
hoje, um texto como a Medeia, numa abordagem
transdisciplinar, mostrando a força e persistência de mitos que deram forma à consciência
ocidental, é um exercício revelador do sortilégio da poesia e da literatura
como meios de irradiação do conhecimento e de construção de um pensamento
crítico.
Sejam
bem-vindos!
Nota de
Delfim Leão
Embora a ação de Medeia
nos remeta para o passado remoto de Corinto e, por conseguinte, para um
tempo heroico de personagens de exceção, a audiência que assistiu à sua
apresentação, nas Grandes Dionísias de 431, vivia numa pólis específica, que se
encontrava organizada segundo uma estrutura social concreta. Por este motivo, o
público ateniense, na apreciação do drama euripidiano, terá por certo ponderado
também a situação jurídica de uma mulher exilada, com uma descendência
reconhecida pelo marido, que estava a ponto de ser trocada por outra mulher, de
estatuto mais elevado e que oferecia uma ligação mais proveitosa para Jasão.
Além disso, acrescia ainda o facto de Medeia se movimentar com uma determinação
varonil numa sociedade dominada por homens e respetiva mundividência familiar,
política e legal. Numa primeira abordagem, a situação jurídica desta mulher é bastante
difícil ou mesmo até insustentável: a um historial altamente violento e
comprometedor, motivado pelo impulso amoroso de seguir Jasão, a quem se
encontrava ligada sem um vínculo matrimonial legalmente reconhecido, juntava-se
ainda a contingência de ser bárbara, de praticar a feitiçaria e de recorrer ao
crime hediondo de matar os filhos, quando o instinto maternal a deveria levar a
protegê-los. A conjugação destes fatores relega Medeia para as margens da
existência em sociedade e torna-a, à partida, numa pessoa indesejável em
qualquer comunidade politicamente organizada. Ainda assim, importantes
personagens do drama – como a Ama, o Coro e Egeu – reconhecem-lhe certa dose de
razão que, se não justifica por inteiro a sua atuação extrema, ajuda a sustentar
a justeza dos motivos de agravo relativamente a Jasão.
Nesta análise, irá ser privilegiada uma abordagem
jurídica do desenlace trágico da atuação de Medeia e Jasão, não com o objetivo de
absolver ou condenar em definitivo a conduta de qualquer um deles (até porque
isso não seria viável), mas antes para tentar reproduzir alguns dos constrangimentos
legais que, a par de fatores éticos, religiosos, culturais e estéticos, terão
pesado na apreciação do público que assistiu à estreia da peça.
Texto: Eurípides. Medeia (vv. 160-172) [tradução de M.H.
da Rocha Pereira]
[fala
da Ama]
Traindo a minha senhora e
os seus próprios filhos, Jasão repousa no tálamo régio, tendo desposado a filha
de Creonte, que manda nestas terras; e Medeia, desgraçada e desprezada, clama pelos
juramentos, invoca as mãos que se apertaram, esse penhor máximo, e toma os
deuses por testemunhas da recompensa que recebe de Jasão.
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