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Um é que a obra dá a entender que a "poesia é apenas emoção, uma emoção anti-razão, uma emoção não filtrada pelo intelecto. É como se a poesia fosse sinónimo de sinceridade, de pureza, de mera inspiração não conspurcada pelo trabalho intelectual. É como se escrever consistisse apenas no abrir da corrente de pensamento, é como se escrever não fosse um lento garimpar das palavras. Outro é que nela se "proclama o império da criatividade sobre o trabalho disciplinado, sobre a memória, sobre o conhecimento."Penso que ele só agora percebeu estes dois equívocos porque, apesar de terem "barbas brancas", nos anos oitenta e noventa do passado século, na altura em que o filme foi visto por toda a gente, eles estavam no seu apogeu. As antinomias: "ensino versus aprendizagem" e "criatividade versus memória", ou, por outras palavras, os alunos "só aprendem se não forem ensinados" e "só criam se não tiverem conhecimentos" eram dois lemas (melhor, dogmas) "pedagógicos" completamente infiltrados no pensamento social. Não se pensava fora destes deles. E se alguém ousasse fazê-lo era imediatamente advertido da inconveniência da sua atitude. Ainda hoje é assim, aliás. Sobretudo se falamos de poesia.
E isto tudo à revelia da investigação científica muito séria que se fazia e se faz na área da psicologia e da pedagogia sobre a aprendizagem e sobre como o ensino deve ser organizado para que os alunos aprendam, mesmo na área da poesia, que requer, claro está, criatividade.
Mas para que o alunos manifestem as suas potencialidades criativas, diz, e diz bem, Henrique Raposo, "é preciso um trabalho de apreensão de conhecimento, de memorização, um trabalho que requer humildade perante o mundo exterior ao eu".
Maria Helena Damião
4 comentários:
Pois é a pura verdade, Drª Maria Helena. E essa é a causa de muita ignorância de alunos que terminam o secundário, que terminam o superior mesmo... Deixa-se a aula ao ritmo do aluno, espera-se que ele "descubra" o que desconhece e o professor esquece-se de que ele precisa de bases, precisa de conhecimentos prévios para poder concluir, para poder apreciar, para poder comentar... e o professor que diz, ou faz, o contrário, é antiquado, faz uma aula muito expositiva, não deixa o aluno espraiar-se...enfim! — Isaltina
Tem simples exposição:The Wall, Pink Floid.
The Deliberate Dumbing Down of America
http://www.youtube.com/watch?v=yWHhLfc0VLg
Pouco leio Henrique Raposo - por razões subjectivas e tb por outras com maior grau de objectividade; no entanto, tem algumas crónicas interessantes. Gosto bastante do Clube dos Poetas Mortos. Provavelmente derivo entre dois preconceitos, mas não considero o filme "uma xaropada". O jornalista só agora descobriu que a poesia é trabalho; sobre trabalho; toda a escrita, aliás, o é - sendo de alguma qualidade. A criatividade, ou a inspiração se se quiser assim chamar-lhe, não brota espontânea , mas, apesar de reconhecer que não é apenas fruto de trabalho, faz-se sobre ele. É assim na ciência; é assim na literatura; é assim na arte; deve ser tal em todo o processo criativo. Porque só os deuses acertam à primeira. E ao homem - à sua inteligência discursiva - resta um caminho árduo - de aprendizagem - até à criação.
Continuo a encontrar naquele professor diferente um incentivo a pensar diferente. Um incentivo à escrita. Um incentivo ao pensamento reflexivo e pessoal; um incentivo a fazer seus os conhecimentos papagueados sem nexo. Mas, como acima referi, sou pelo filme. E não o revi há pouco tempo, quem sabe a memória o guardou mal. É o meu filme sobre o filme. Não vejo razão para não continuar paralelo à versão reciclada Henrique Raposo.
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