Montanhas
Rochosas
|
Na Grécia antiga, Eratóstenes (285-194 a.C.), o astrónomo, geógrafo, matemático e poeta, bibliotecário da grande Biblioteca de Alexandria, o mesmo que calculou o raio da Terra, constatou que havia conchas de moluscos marinhos no interior das terras, inclusive nas montanhas, a centenas de quilómetros do litoral, o que o levou a aceitar que, no passado, essas terras haviam sido fundo marinho, uma dedução que antecipou a de Leonardo da Vinci (1452-1519).
Dois séculos depois, na mesma linha de pensamento, o seu conterrâneo, Estrabão (64 a.C.-24 d.C.), geógrafo, historiador e filósofo grego, autor de um dos primeiros mapas do mundo, chamou a atenção para a existência de “pedras com a forma de conchas de moluscos marinhos” em regiões afastadas do litoral e concluiu pela presença do mar nessas terras em tempos passados.
O mundo, segundo Estrabão (64 a.C.-24 d.C.). |
Na mesma época, Ovídio (43 a.C. - 17 d.C.), o poeta romano contemporâneo de Estrabão, deixou-nos em verso alguns conceitos, que pôs na boca de Pitágoras (579-497 a.C.), alusivos à tendência universal para a mudança, não só das coisas vivas, mas também das mortas. E nas coisas mortas estavam, entre muitas outras, as terras e os mares, as montanhas, os rios e as rochas. Dizia ele: tudo flui, tudo muda, nada morre. Embora ele tenha posto estas afirmações na boca do filósofo e matemático grego, não se sabe de onde Ovídio as tenha retirado. Em alguns dos seus versos volta a referir a existência de conchas marinhas no interior das terras, que há terras que emergem e que há outras que se afundam, dando lugar a mares, mas não explica como. Numa enciclopédia do século X, escrita colectivamente por uma fraternidade de filósofos ismaelitas que se admite terem vivido em Bassorá, no Iraque, conhecida pelos “Irmãos da Pureza”, lê-se “as terras actuais foram antigos fundos marinhos e os mares do presente serão futuros continentes”.
Manuscrito atribuído aos Irmãos da Pureza |
Na transição para o Renascimento, Jean Buridan, filósofo francês e reitor da Universidade de Paris, recuperando a sabedoria deixada pelos “Irmãos da Pureza”, escreveu Onde hoje se encontra o mar foi outrora terra e, inversamente, onde a terra firme está no presente, esteve o mar e aí voltará. Leonardo da Vinci, que soube descrever, em pormenor, a fossilização e compreendeu o interesse dos fósseis, defendeu que este tipo de objectos petrificados encontrados nas montanhas eram restos de seres vivos anteriormente depositados no fundo do mar, fundo esse que admitiu soerguer-se posteriormente. Neste capítulo, manteve acesa polémica com os defensores de ideias conservadoras, contrárias às suas e que não aceitavam a origem biológica dos fósseis, preferindo encará-los como entidades criadas por acções dos astros.
No século XVI, o geógrafo e cartógrafo, o flamengo Abraham Ortels (1527-1598), viajou pela Europa, ao serviço de Filipe II de Espanha (Filipe I de Portugal), e iniciou a carreira como desenhador de mapas, por influência de Gerardus Mercator (1512-1594), tendo-se dedicado, por sugestão deste seu conterrâneo, à compilação do famoso atlas (o primeiro tido por moderno) pelo qual ficou famoso, conhecido pelo nome latino Theatrum Orbis Terrarum.
Theatrum Orbis Terrarum, desenhado por Abraham Ortels, em 1570 |
(Continua aqui)
A. Galopim de Carvalho
Sem comentários:
Enviar um comentário