quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

A diferença entre a ciência e a pseudociência é clara

Ao contrário do que diz Desidério Murcho, não há nenhum problema muito complicado de demarcação entre a ciência e pseudociência (em determinado momento poderá haver problemas muito localizados, que acabam por se esclarecer). As duas tem características distintas. A ciência é conhecimento racional e baseia-se em provas. A pseudociência baseia-se em figuras de autoridade (empossadas de “virtude intelectual”). Segundo uma decisão de um julgamento num tribunal americano no principio dos anos 80 do século XX (“McLean versus Arkansas”) as características da ciência são estas:

1. é guiada por leis naturais;
2. tem que ser explicável de acordo com leis naturais;
3. tem que ser verificável no mundo empírico;
4. as suas conclusões são provisórias e não necessariamente
a palavra final;
5. pode ser refutada

Isto aconteceu num julgamento a propósito do ensino das “ciências” da criação. Claro que não é um tribunal que define o que é ou não é ciência, mas neste caso o juiz interpretou bem as características do conhecimento científico e reflectiu-as na sua sentença (nem sempre acontece). Os seja, as “ciências” da criação não são ciência e não podem ser ensinadas nas aulas de ciência (ao contrário do que pretendia uma comissão de educação do Estado do Arkansas).

Imagino que Desidério ache isto uma coisa ditatorial e argumente que se há uma série de gente com “virtude intelectual” a estudar “ciências” da criação, não há razão para não se ensinar essas matérias nas aulas de ciência a par com a teoria da evolução. No entanto, essa gente com “virtude intelectual” não poderá encontrar uma estratégia eficaz de tratamento para a SIDA, porque para isso é necessário reconhecer que o vírus HIV está em evolução rápida (e não que saiu há 4000 anos da arca de Noé, em casalinho). E há uma diferença grande entre uma coisa e outra. E essa diferença está patente, por exemplo, no enorme aumento da esperança média de vida nos últimos 100 anos, nos países mais desenvolvidos. Não só por causa das avanços na medicina racional (vacinas, antibióticos, etc.) ao longo do século XX, mas por vários outros factores, como o aumento da produtividade agrícola (para o qual a ciência, nomeadamente a química, também deu um enorme contributo, a despeito de todas as danças da chuva e sacrifícios aos deuses das colheitas, em que gente cheia de virtude intelectual acredita).

Desidério também argumenta, a propósito das medicinas alternativas, que o exercício de qualquer actividade deve ser livre, desde que não prejudique terceiros. Estou de acordo. A questão é que, promover um tratamento que não funciona prejudica gravemente terceiros. Na Africa do Sul um charlatão chamado Mathias Ratth conseguiu convencer algumas autoridades do país de que os medicamentos anti-retrovirais eram a causa da SIDA e que uns suplementos vitamínicos por ele vendidos é que seriam um tratamento eficaz. Como resultado, estima-se que milhares de pessoas tenham morrido prematuramente. Isto não é prejudicar terceiros? Se o Estado regulamentar o exercício da profissão de “terapeuta vitamínico” para a SIDA isso não é pernicioso? Isso não contribui para induzir nas pessoas a ideia de que uma mistura de vitaminas é uma opção valida para tratar a infecção com HIV? Deve o Estado conceder uma carteira profissional a algumas pessoas, reconhecendo-as como capazes de administrar um tratamento que não funciona? E as profilaxias homeopáticas para quem viaja para regiões onde a malária é endémica? E vacinas homeopáticas que nenhuma imunidade oferecem? A homeopatia prejudica gravemente todos aqueles que, tendo um problema de saúde para o qual há um tratamento eficaz, optam (com base em informações erradas que lhes são transmitidas) em vez dele pela homeopatia.
Mas isto não prova que a homeopatia é pseudociência, pois também há muitas afirmações científicas que podemos provar cientificamente que são falsas, e na verdade fazemo-lo o tempo todo em ciência.

Isso é uma das coisas que caracteriza a ciência: Pontos 3, 4. e 5. A homeopatia não cumpre nenhum dos pontos. E a ciência não é um conjunto de afirmações. A ciência é o conhecimento e o modo de o obter.

Segundo, que a maior parte dos cientistas não tem virtude intelectual: limitam-se a seguir as receitas aprovadas pelo poder instituído, e seguiriam outras receitas se as suas bolsas e financiamentos a isso os obrigasse. A maior parte dos cientistas que segue um determinado procedimento laboratorial, por exemplo, não faz a mínima ideia por que razão se faz as coisas daquela maneira em vez de outra.

A maior parte? 51%? 75%? Isto baseia-se em quê? E a maior parte dos filósofos? E a maior parte dos polícias? E a maior parte dos taxistas? A carreira dos cientistas é altamente competitiva e os cientistas são sujeitos a uma selecção muito forte. Ser bom ajuda. Claro que há distorções, a ciência está longe de ser uma meritocracia perfeita. De qualquer forma, o conhecimento científico não assenta em figuras de autoridade. Isso é uma marca da pseudociência.
A conjunção destas duas ideias contraria uma ideia comum entre os militantes contra a pseudociência: que todas as pessoas que fazem pseudociência são trapaceiras e que todas as pessoas que fazem ciência são certinhas.
Não tem a ver com pessoas, tem a ver com ideias. Não faz sentido pôr a má conduta científica de alguns cientistas no mesmo saco que disciplinas que de científico nada têm. Um investigador pode conduzir um trabalho de investigação de forma viciada e até mesmo pouco ética. Isso é má conduta. E é grave. Mas não é equivalente à homeopatia, que por muito boa que seja a conduta não tem nenhuma base científica. Há pseudociência na ciência. Há falsa ciência por todo o lado, das correntes de emails à revista Nature. Há fraudes científicas. Mas não é por causa da fraude da fusão a frio que a física, como ramo do conhecimento, é uma pesudociência. A homeopatia é, em si, pseudociência. Os princípios em que se baseia estão errados, tal como se pode demonstrar. E os tratamentos não funcionam melhor do que um placebo, tal como se pode demonstrar. Por muito virtude intelectual que tenham os homeopatas.

10 comentários:

Unknown disse...

Caro David Marçal,

Pouco importa que a homeopatia seja uma ciência ou uma pseudo-ciência (embora isso aparentemente isso seja relevante para si). Há pessoas que confiam que a homeopatia é boa para resolver alguns dos seus problemas de saúde e há pessoa que acham que essas terapias resolvem esses problemas. Porque isso deve ser dificultado?

(o ser ou não ser pseudo-ciência é perfeitamente irrelevante para o caso, uma vez que isso nunca foi critério nenhum para validar qualquer terapia)

A, Moura Pinto disse...

Isto faz-me lembrar uma polémica famosa que envolveu o físico António Manuel Batista e Boaventura Sousa Santos e que, pelos vistos, ou não é conhecida por este filósofo ou não lhe foi suficiente.
Ciência não é o que se queira, apesar do uso desregrado da palavra. E não está em causa a importância e seriedade dos outros saberes que não passam pelo crivo apertado da ciência.

tempus fugit à pressa disse...

Caro Scienthista ou Pseudo-Scienthista muitas theorias en física e particularmente no campo da micro física evadem-se das leis dittas naturais e mesmo das dimensões existentes

2. tem que ser explicável de acordo com leis naturais...não obrigatoriamente
3. tem que ser verificável no mundo empírico...no bulk universe tutto é possível;
4. as suas conclusões são provisórias e não necessariamente
a palavra final;....aqui cabe muita cousa que não é sciência


5. pode ser refutada.....imaginemos que tudo se pode refutar se bem que experimentalmente nem por isso

Anónimo disse...

1- Diga uma lei natural
2- Voltamos ao mesmo. Diga uma lei natural que seja.
3- Diga uma única verificação (conhece, por ventura, alguma coisa da imensa literatura filosófica sobre o assunto? É claro que não, senão não diria estas patetadas afiolhadas)
4- Claro. Aliás, por isso mesmo não existem na ciência lei naturais conhecidas e verificadas. Se assim fosse então não seriam provisórias e refutáveis.
5- O mesmo que 4.

Portanto, temos apenas uma triste mostra de arrogância do cientista que nada sabendo sobre o assunto, acha que tem a solução na mão e que os filósofos são uns imbecis. Intelectualmente, pobre, muito pobre. Um vendedor de pipocas.

Anónimo disse...

Um vendedor de pipocas, tenho que concordar. Não teria problema algum em debater com os pipoqueiros, uso aqui o anonimato por mera conveniência, se houver debate, certamente estarei lá para os confrontar.

Fico infeliz por estas posições radicalizadas de esconder a ignorância por detrás da ciência ou do científico, esse é um lado que grassa no mundo actual de forma daninha. Se alguma verdade existe então estará na Arte, naquela de Bach e de outros imortais. Infelizmente, a Verdade não está acessível a todos da mesma forma, a forma mais avançada de lá chegar é naturalmente longe da ciência, só a arte e alguns artístas experimentam essa sensação absoluta da totalidade.

Extirpar a arte da ciência, tentar chegar à Verdade sem a emoção, a intuição e a superioridade da selectividade perceptiva da Criação é como fazer comida sem sal. Por isso estas longas dissertações improdutivas e inconclusivas em si, pura batalha de egos!

Tenho que dar alguma razão à exposição de Desidério Murcho no artigo anterior e no seguinte, a ciência é por natureza relativa, reducionista e aspirar à universalidade é legítimo, no entanto, é só uma aspiração.

O sr. David Marçal e o Fiolhaes estão a prestar um mau serviço, admito que a todos nós, metendo tudo no mesmo saco. Estas conversas só aumentam o encarniçar das posições ocas e a arrogância do cientista é a sua perdição. Os cientistas de hoje são demasiados especializados e com graves falhas no Saber da Filosofia, não é por acaso que se tenta esquecer os mundos anteriores de reflexão. Sempre que assim é, a civilização declina e regride.

A ciência tomou hoje excesso de importância, tal como o excesso de produção científica que ofusca a capacidade de saber tudo o que é produzido e deixando demasiado espaço a terceiros para estabelecer que estudos e que visões da ciência se instalam no consenso. Os cientistas pecam muito ao achar que controlam alguma coisa ou que só a verdade vem à superfície. Especialmente descuram os depoimentos verbais ou escritos de grandes cientistas, no fim de carreira, fora do seu estrito âmbito académico. A ciência oficial é assim uma visão distorcida e passada do conhecimento humano e por isso decadente e sem brilho que deixou de servir ao bem da humanidade, estando praticamente só ao serviço de megagrupos económicos e entidades obscuras que determinam quando e como a tecnologia é partilhada abertamente. É inegável que os exércitos das potências e os megagrupos económicos vivem 40 ou mais anos no futuro, fazendo disso segredo e vantagem para instalar verdades oficiais e o domínio de nações e populações.

Anónimo disse...

O sr. David Marçal a continuar assim vai depressa acabar um pseudocientista(uma figura de autoridade). À filosofia o que é da filosofia e à ciência o que é da ciência. A filsofia mostra que há várias formas de chegar ao conhecimento e a ciência é melhor para alcançar alguns saberes, ainda assim as ciências racionais são em si uma fracção da nossa capacidade de conhecer e a sua virtude é tantas vezes tão questionável quanto limitada.

A propósito das medicinas alternativas, o exemplo que usou é mau porque sabe o seu problema é não saber do que está a falar, as medicinas alternativas são especialmente um ponto de partida filosófico e empírico que integra em simultâneo os planos espiritual, mental, emocional e físico do indivíduo. Algo que a ciência devido à natureza do seu método não pode alcançar, dando uma visão analítica e fraccionada das realidades.

Sr. David Marçal deixe de usar factóides para cobrir a sua ignorância. Afirma que "A questão é que, promover um tratamento que não funciona prejudica gravemente terceiros. Na Africa do Sul um charlatão chamado Mathias Ratth ..." ora francamente, quantas vezes a ciência mata pessoas? Lá porque é a verdade institucional isso não reduz nem a culpa nem o crime. A ocultação essa sim é bem mais eficaz. Deverá saber de onde veio a SIDA, creio! Já nem comento outros factos que aponta como sendo verdades aboslutas que estão longe de ser consenso da comunidade científica, mas enfim, passo à frente.

Este tipo de afirmações é de uma insensatez atroz:
"A homeopatia prejudica gravemente todos aqueles que, tendo um problema de saúde para o qual há um tratamento eficaz, optam (com base em informações erradas que lhes são transmitidas) em vez dele pela homeopatia".

1- Médicos criaram a Homeopatia em recção a uma medicina que matava mais do que as doenças. Como será que estamos hoje?
2- Se o tratamento da medicina convencional fosse eficaz, certamente os homeopatas não teriam clientes, até porque não há nenhuma comparticipação, o que a torna custosa face ao SNS tendencialmente gratuito. Por isso, não generalize com os escassos conhecimento que possui.
3- Os homeopatas não fazem publicidade nem chamam ninguém à sua clínica e as "informações erradas" a que se refere, nem sempre são teoria homeopática e quem a exerce pugna pela rectidão, os erros pagam-se caro.
4- Não está a condenar o direito a optar, não? Questione porque optam, talvez entenda as suas razões, sabe que as pessoas não são inerentemente estúpidas!
5- Não fale em "vacinas homeopáticas" porque isso não existe em homeopatia e a generalizção do seu uso é danosa para todos.
6- A homeopatia tem uma linguagem própria, sólida e antiga, não têm forma de provar nada para lá dos casos clínicos, tudo isso lhes está vetado pelos colegas da ciência com base "no vosso tipo" de evidências, estamos longe dos laboratórios e da comunidade científica.

Anónimo disse...

"Pontos 3, 4. e 5. A homeopatia não cumpre nenhum dos pontos."
Isso não é bem assim, a forma de provar habitual da ciência bate de frente com a teoria homeopática, a personalização do remédio torna invalida muita da investigação, muitos indícios revelam que as observações clínicas são reais, no entanto, há muitos problemas a resolver, até no processo prescritivo dos homeopatas, mas enfim, isso são questões internas da classe. Nós também temos método e provas de acordo com as teorias de que dispomos e evoluímos, tentamos.

Uma das fontes do declínio da ciência é aquilo que propagandeia:
"A carreira dos cientistas é altamente competitiva e os cientistas são sujeitos a uma selecção muito forte".
Isto leva a que a verdade dos resultados não seja necessariamente o mais importante, e já lhe expliquei no início quem manda nos cientistas. Aliás, o rótulo de pseudociência é trapaceiro e é usado como o de conspiracionistas, para atirar areia aos olhos. A questão é quem precisa disso e porquê?

Estamos à espera que a Física e a concepção do Universo Elétrico faça o seu caminho por todas as disciplinas científicas, será uma revolução na ciência. Sempre quero vê-lo depois a falar da homeopatia, fica a dever-nos um grande pedido de desculpas. E para acabar, fique a saber que:
"Mas não é por causa da fraude da fusão a frio que a física, como ramo do conhecimento, é uma pesudociência. A homeopatia é, em si, pseudociência."

é com estas afirmações que prova não saber do que está a falar, fique a saber que a Homeopatia está para medicinal tradicional como a fusão a frio está para a Física.

Bom, o texto vai longo e talvez nem seja útil para obstinados.

Cláudia da Silva Tomazi disse...

Para ter, junco.

maria disse...

ah...bem me parecia que a ciência é a principal responsável pelo grave problema demográfico actual , à vez excesso populacional global e pirâmides invertidas no ocidente . e qualquer dia a ciência , muito racional ,lá virá com a xpto indolor injecção letal "arranjar" o que estragou .
os medicamentos que hoje foram retirados para o mítico colesterol ? ciência da boa , a milhas da homeopatia :)
se começassem a discutir as consequências não esperadas da ciência de modo a terem mais cuidadinho com o que fazem , agradecia.

TERAPIAS COMPLEMENTARES disse...

Esta discussão da validade "científica" da Homeopatia já dura por cá há muito tempo. Na verdade não interessa muito essa questão, mas a sua validade clínica e terapêutica. E se ela é benéfica ou não. Fazer e utilizar homeopatia é uma arte, como toda a medicina o é, porque não é uma ciência exacta e lida com complexidade (refiro-me ao ser humano). Importa referir que os maiores detratores na história da homeopatia foram médicos. Um deles é Kent, um médico americano, que acabou por se tornar um dos maiores homeopatas. Porquê? Porque se atreveram a experimentar, por sua conta e risco, esses remédios. A experimentação em homeopatia não é igual que na farmacologia e entender o funcionamento da homeopatia requer determinados conhecimentos.
Gostaria então de deixar um desafio para quem não tem medo de experimentar, e para quem possa eventualmente vir a utilizar a homeopatia para fins terapêuticos:
- experimentar o remédio IGNATIA na potência 12CH da seguinte maneira: fazer 3 tomas seguidas (bastam 3 grânulos de cada vez) num intervalo de 1 hora entre cada toma (fora das refeições) e observar os sintomas. A recomendação é não repetir excessivamente. Se sabe que é uma pessoa com baixa vitalidade, então aconselha-se baixar para 9CH. De qualquer forma, não se aconselham pessoas com patologias a fazer a experimentação.

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