segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

DO MODELO ATÓMICO DE BOHR À DESCOBERTA DA VITAMINA A EM 1913

Crónica primeiramente publicada na imprensa regional.


O ano de 1913 foi marcado por inúmeros avanços no conhecimento científico e na tecnologia. Cem anos depois verificamos que essas descobertas permitem-nos compreender melhor o universo. Por exemplo, ao ligarmos qualquer equipamento electrónico estamos a usufruir do avanço no conhecimento sobre a natureza “íntima do átomo” verificado em 1913. De facto, são desse ano três artigos seminais do físico e prémio Nobel dinamarquês Niels Bohr (1-3).


Publicados na revista Philosophical Magazine, é nestes três artigos, sobre a constituição do átomo e das moléculas, que Bohr descreve as suas propostas para o comportamento do átomo, segundo o modelo atómico proposto em 1911 por Ernest Rutherford.

O modelo de Bohr propõe que os electrões orbitam o núcleo atómico em órbitas precisas e que eles libertam ou absorvem quantidades fixas de energia ao transitarem de uma órbita para outra.

Bohr estende ao universo íntimo do átom a teoria quântica formulada por Max Planck em 1900. Os “quanta” de energia captados ou emitidos nas transições electrónicas são "grãos" de radiação electromagnética (como a luz visível, as ondas de rádio e as micro-ondas entre outras). Bohr propõe ainda, na alvorada da física nuclear, que o fenómeno designado por decaimento beta (uma emissão “espontânea” de um electrão ou positrão por um núcleo de um átomo instável) é um processo nuclear.

Numa outra área do conhecimento, mais precisamente o da bioquímica, 1913 ficou para a história como o ano em que se identificou uma substância que mais tarde se designaria por vitamina A, ou retinol.


Recorde-se, a propósito, que 1912 tinha sido marcado pela cunhagem por Casimir Funk do termo “vitamina” (a amina vital) para o “factor alimentar acessório” e pela formulação, por Hopkins e Funk, da “hipótese da deficiência vitamínica”, que propunha que a ausência, num dado sistema orgânico, de quantidades suficientes de uma certa vitamina, poderia levar ao desenvolvimento de uma determinada doença.

Neste contexto bioquímico, no ano seguinte, o de 1913, é descoberto um “factor alimentar acessório” solúvel em groduras, importante para o crescimento do rato (Mus musculus), animal que tinha sido introduzido em 1909 por Little como modelo animal experimental nos estudos laboratoriais.


Curioso, mas não único na história da ciência, o facto de a descoberta de ter sido efectuada, de forma independente, por duas equipas de cientistas. Por um lado, Lafayette Mendel e Thomas Osborne (4), por outro lado, Elmer McCollum e Marguerite Davis (5), comunicaram uma observação similar utilizando ratos alimentados com extractos de gema de ovo e de manteiga. 

McCollum e Davis enviaram o artigo com os resultados para publicação três semanas antes de Mendel e Osborne fazerem o mesmo. Ainda mais singular, os dois artigos foram publicados no mesmo número (o 15) do “Journal of Biological Chemistry”! A descoberta foi creditada a McCollum e Davis pelo facto de o artigo destes ter sido recebido primeiro.

Cem anos depois, continuamos a estudar o papel da vitamina A como essencial para a manutenção de um bom estado de saúde. Um dos aspectos mais fulcrais é o de o composto que dela deriva no nosso organismo (o ácido retinóico) permitir a visão, uma vez que é a componente funcional de proteínas (rodopsinas) existentes na retina dos nossos olhos. Excitada pela radiação eletromagnéctica do espetro visível da luz solar, entendemos o seu funcionamento também pela contribuição de Bohr para a compreensão das transições electrónicas nos átomos e moléculas. 

Sem elas o leitor não estaria a ver este texto.

António Piedade

Referências

1.       Niels Bohr (1913). "On the Constitution of Atoms and Molecules, Part I"Philosophical Magazine 26: 1–24. 
2.       Niels Bohr (1913). "On the Constitution of Atoms and Molecules, Part II Systems Containing Only a Single Nucleus"Philosophical Magazine 26 (153): 476–502.
3.       Niels Bohr (1913). "On the Constitution of Atoms and Molecules, Part III Systems containing several nuclei". Philosophical Magazine 26: 857–875.
4.       Osborne TB, Mendel LB. The relation of growth to the chemical constituents of the dietJ Biol Chem 1913;15:311-326.
5.       McCollum EV, Davis M. The necessity of certain lipins in the diet during growthJ Biol Chem 1913;15:167-175. 

4 comentários:

José Batista disse...

Muito bem.

E, afinal, com "jeitinho", até podemos considerar reforçada a afirmação popular que diz que "comer cenouras faz os olhos bonitos"...

Cláudia da Silva Tomazi disse...

A respeito da contribuição humanística, este modelo atômico seria em definitivo o divisor de águas.

Tiago Leski disse...

Excelente.É interessante observar a evoluçao do modelo de Bohr até o atual modelo.

Cláudia da Silva Tomazi disse...

É claro que podería-mos chegar até, lá. Dizer, seria apenas exemplificar através de fórmula, e convenção, e para elém de muito estudo, ad maxima ciencia. Creio que o papai do céu, ouve-nos.

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