Demos aqui conhecimento da vitória de António Gil Cucu, aluno do ensino secundário, numa prova de tradução de Latim que teve lugar na passada semana em Venosa, Itália. Falámos com ele:
António, antes de mais, os sinceros parabéns do De Rerum Natura. Melhor aluno de Latim entre quantos alunos e e Portugal entre quantos países?
Agradeço-vos, também, antes de mais, a vossa atenção ao acontecimento. Havia uma prova para alunos italianos e outra para estrangeiros. Estrangeiros eram quatro austríacos, duas búlgaras, um croata, dois romenos, e claro, um português.
Como conseguiu? Sei que ainda não tem dois anos de estudo de Latim…
Nem eu percebi muito bem como consegui, especialmente por terem participado austríacos que, por costume, conseguem ''varrer'' a concorrência. Penso que foi uma surpresa para todos, pois nunca se espera que um ''portuguesinho'' consiga levar para casa alguma coisa nestes concursos... Foram muitas horas a traduzir odes (nunca havia traduzido um autor latino tão sistematicamente), muitas horas a ler excertos de livros sobre literatura, muita paciência para entender a métrica que serve de base à poesia latina, e sobretudo uma despreocupação total em relação a vencer ou perder: fui a Venosa para dar o meu melhor e para conhecer uma nova realidade, o prémio foi a dispensável mas saborosa cereja no topo do bolo!
E o que representa essa cereja para si?
Representa o reconhecimento de todo o trabalho que envolveu a minha preparação para este concurso, tanto para mim como para o professor Jorge Moranguinho e para a professora Alexandra Azevedo. Mas, como tantas vezes disse e pensei, durante o evento, tudo teria valido a pena na mesma pela maravilha da experiência: com prémio ou sem prémio.
São pouquíssimos os alunos que escolhem as Clássicas… Quase se estranha que alguém as escolha, por isso não resisto perguntar-lhe porque é que escolheu as Clássicas?
O primeiro motivo foi a curiosidade. Depois da rudimentar e superficial abordagem da origem dos vocábulos portugueses que se faz no nono ano, fiquei sempre com o bichinho do latim. Quando estava a matricular-me para o décimo ano não resisti a escolher Latim, ao vê-lo entre a lista de disciplinas possíveis, não obstante os comentários jocosos e às vezes reprovadores de algumas pessoas. Mas mantive-me confiante. Mal sabia eu que sorte tinha em viver no Porto e em me ter matriculado na escola certa... Agora, mais do que a curiosidade, move-me a necessidade: a necessidade de entender melhor a minha língua, a necessidade de entender melhor as outras línguas românicas, de entender a história e a cultura do mundo ocidental, de entender, sem intermédios, aquilo que nos legaram, em seus textos, autores das mais diferentes épocas da história.
Esta será a sua opção de estudos futuros?
Certamente. Já há muitos anos que o meu sonho é ser professor, ou linguista, ou filólogo. O latim é uma base indispensável a tudo isto. Pretendo seguir o curso de Estudos Clássicos na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e, mais tarde, provavelmente, aprofundar o meu conhecimento também de outras línguas.
Quer fazer o favor de nos apresentar Horácio?
Conheço-o há pouco tempo, mas acho que o posso fazer. Descrevem-no como baixo, anafado, e eu não poderia imaginá-lo de outra forma. É um homem que se entrega aos prazeres do amor e do vinho (mas sempre com moderação!), de modo a aproveitar ao máximo o dia de hoje, pois os deuses podem guardar-nos os mais variados destinos para o dia de amanhã. Canta a beleza e a simplicidade da natureza, recusa-se a cantar temas demasiado sérios, e demonstra uma lealdade e admiração inspiradoras pelos seus amigos mais próximos. Este é o Horácio das Odes.
O texto que traduziu, que título tem, qual é o seu conteúdo?
Trata-se da quinta ode do terceiro livro. A principal mensagem desta ode seria, do meu ponto de vista, a valorização da maturidade amorosa (embora se possa alargar esta ideia às mais variadas dimensões), a crítica às coisas ''verdes''. O poeta aconselha-nos a não desejarmos o cacho ainda verde, esperemos que o Outono chegue e amadureça a uva, dando-lhe nova cor e novo sabor.
Que lugar ocupa Horácio na sua vida?
Fiquei a gostar de Horácio, mas há outros à frente na fila. Os meus poetas de estimação são Ary dos Santos e Florbela Espanca; já os prosadores são José Saramago e Domingos Monteiro. Se forçoso for separar os modernos dos clássicos, aqui Horácio já se encontra na posição mais simpática de segundo lugar, atrás de Júlio César.
Até um dia destes, em Coimbra.
Na fotografia (original): António, ao,centro com os dois concorrentes austríacos que foram premiados com menção honrosa e segundo prémio.
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3 comentários:
Ai aquela gralha no nome do poeta! "Quer fazer o favor de nos apresentar Horário?"
Muito obrigada, caro Leitor, uma gralha muito pouco simpática, na verdade.
Helena Damião
Parabéns! António Gil.
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