sexta-feira, 3 de junho de 2011

No Dia Mundial da Criança - 1

Para festejar o Dia Mundial da Criança, muitas ou todas as escolas portuguesas do ensino básico associaram-se a empresas da mais variada amplitude e natureza. Desde empresas internacionais a empresas locais; desde empresas públicas a empresas privadas...

As empresas, deram suporte logístico às festas: espaços, técnicos, equipamentos, prendas...

Tudo devidamente identificado com os símbolos que lhes dão identidade no mercado... A sua filantropia não se confunde com discrição. Nem tem de se confundir. A lógica das empresas é, toda a gente sabe, tornarem-se conhecidas, darem uma boa imagem de si, fazerem com que os seus produtos sejam desejados... Até se inventou uma palavra para isso: "marketing".

Se as escolas estabeleceram ligações com a comunidade próxima - como se recomenda sistematicamente nos documentos curriculares -, se as crianças se divertiram - como toda a gente acha que está bem que aconteça em ambiente de educação formal -, se tiveram direito a balões - o que dá sempre um toque de cor e de alegria -, o que é que aqui pode incomodar?

O que pode incomodar algumas pessoas (não, não serão muitas) nesta associação escola-empresas (noto: para um fim aparentemente legítimo) é o facto de a Escola, como instituição, pela sua especificidade, não se reger (ou não se dever reger) pela lógica empresarial. Mais: de neste caso particular, estar ao serviço de empresas, parecendo, até, que são estas que estão ao serviço dela.

Num dia dedicado à infância e aos direitos que lhes estão consagrados, as empresas (mais uma vez) puderam entrar nas escolas, ou andar de mão dadas com elas, tendo acesso a milhares e milhares de potenciais e apetecíveis clientes.

No Dia Mundial da Criança, pelo menos nesse dia, as crianças não deviam ser usadas e manipuladas. E foram-no.

Nota: Tendo o leitor curiosidade de perceber a extensão do "fenómeno" que referi, bastará fazer uma consulta na Internet, não terá a menor dificuldade em encontrar inúmeros exemplos.

4 comentários:

Anónimo disse...

A mim incomoda-me a publicidade dos bancos dirigida às crianças.
Acho bem a função de responsabilidade social das empresas e interagirem com as comunidades, mas, particularmente no que diz respeito a crianças, deve ser muito bem regulamentada.
O que não falta são exemplos de falta de escrúpulos na forma de actuação das grandes multinacionais e, com recursos absolutamente desproporcionais comparados com uma qualquer escola ou até o próprio ministério de educação, querendo facilmente obterão os seus proveitos em detrimento dos direitos e interesses das crianças.

Anónimo disse...

Ninguém devia servir-se
das crianças para efeitos
de obter os seus proveitos
sem por elas assumir-se!

JCN

José Batista da Ascenção disse...

E isto não acontece só com crianças.
Em escolas secundárias, com o apoio dos então conselhos executivos e, imagine-se, dos departamentos de psicologia escolar, foram distribuídos "kits" de amostras de pensos higiénicos e tampões, bem como livrinhos de esclarecimento sobre aspectos da sexualidade, com os directores de turma a serem obrigados a distribuí-los nas turmas, um por cada aluno(a).
Houve um ou outro professor que reagiu ao facto de estar a ser obrigado, no fundo, a distribuir propaganda de (poderosas) multinacionais. O que foi alvo da incompreensão de quem mandava...
Imagine-se agora, com os kafkianos modelos de avaliação que estão em vigor...

Anónimo disse...

O primeiro leitor e o leitor José Batista da Ascenção referem um (grave) problema que dificilmente é entendido como problema: a introdução de publicidade em meio escolar
Isto acontece porque a “colaboração” das empresas é apresentada como um apoio ao desenvolvimento do currículo, nomeadamente em aspectos de ligação à vida real (cuidados de saúde e de higiene, prevenção rodoviária, etc.), ou de dinamização de actividades ligadas ao currículo (comemoração de dias mundiais, nacionais, desporto, visitas de estudo etc.).
Como se trata de dimensões curriculares que se valorizam (arriscaria dizer, tanto ou mais do que as dimensões “académicas tradicionais”), uma escola ou professor que identifique este problema como problema e que tente fazer-lhe face, arrisca-se a não encontrar compreensão no quadro do sistema educativo, da escola, da comunidade.
Penso que em Portugal estamos apenas a iniciar-nos nesta ligação escola-empresas. A avaliar pelo exemplo de outros países, nomeadamente dos Estados Unidos da América, tudo por aqui se agravará e muito depressa.
Helena Damião

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