É certo que numa sociedade moderna e democrática todos temos a liberdade de acreditar no que quisermos, bem como a liberdade de tornar públicas as nossas crenças. Também somos livres de doar parte da nossa força de trabalho ou do nosso património a uma qualquer entidade do nosso agrado.
No entanto, no que respeita às pulseiras Power Balance, não se trata de uma questão de fé. Trata-se da comercialização de um produto a que se atribui um certo número de propriedades e efeitos. É certo que quem o comercializa não é obrigado a garantir a sua eficácia junto de 100% da população. Por exemplo, a esmagadora maioria dos medicamentos pode, em situações raras e devidamente quantificadas, agravar os sintomas que supostamente combatem. Quem comercializa estas pulseiras deve no entanto demonstrar que aquilo que afirma tem algum suporte e legitimidade.
Talvez o problema não resida tanto no facto de o público em geral não saber que uma frase como "o holograma quântico reequilibra as energias electromagnéticas naturais do organismo" revela um óbvio e deliberado charlatanismo. Em rigor, eu também não sei avaliar a frase "O modo de acção da alfa-amilase no edema inflamatório caracteriza-se por hidrólise com os polissacáridos de exsudado inflamatório", que encontrei no folheto do medicamento Maxilase. O problema está na aparente falta de interesse pelas declarações de centenas de cientistas competentes que em todo o mundo têm denunciado esta fraude. Aparentemente essas declarações não têm grande impacto nas vendas da Power Balance. Devemos infelizmente concluir que as enormes conquistas da ciência não foram ainda suficientes para merecer uma maior confiança por parte do grande público, e que um produto com estas características pode ainda tornar-se num enorme sucesso de vendas a nível mundial.
Mas ainda bem que nalguns países existe uma regulação séria da actividade comercial. Depois do caso espanhol, foi a vez da Australian Competition and Consumer Comission (ACCC) enconstar a Power Balance à parede. A Power Balance foi obrigada a admitir que incorreu em publicidade enganosa e em "misleading and deceptive conduct". A Power Balance ficou também obrigada a publicitar a não-existência de estudos científicos que comprovem o efeito das pulseiras e a reembolsar os seus clientes insatisfeitos. A ACCC emitiu ainda um aviso dirigido aos revendedores de retalho, que poderão igualmente vir a ser alvo de sanções. Em Portugal vinha mesmo a calhar, confesso que estou um pouco cansado de ver estas pulseiras à venda em...farmácias.
O leitor poderá consultar aqui o sítio da ACCC e aqui a notícia do Público-Online.
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4 comentários:
Triste é que há quem tenha sido alertado e mesmo assim tenha embirrado que "os cientistas não sabem nada". Claro, a net e o cristiano ronaldo é que sabem...
É verdade que há determinado jargão e determinadas incoerências que só são gritantes para quem está dentro da área. No entanto, os que me rodeiam conhecem-me, bem como à minha formação, e quando tentei alertá-los para a fraude em que estavam a cair, fui apelidada de ignorante, limitada, de vistas curtas, com a mania que sabe tudo...
Não se trata somente de não haver alertas ou interesse em desmascarar, porque houve bastantes. Eu mesma fiz circular imensos alertas... que não pegaram. Porquê? porque a ficção é mais apelativa que a realidade, porque as pessoas se melindram e persistem na parvoíce só para não darem o braço a torcer,porque "os cientistas são uma cambada de totós que não sabe nada", etc, etc... as pessoas gostam de ser enganadas e a algumas basta somente a iluminação da EDP.
A título de exemplo, recordo o alerta lançado aqui, pelo David Marçal, sobre as ecobolas (outra fraude que envolve iões...os iões e os hologramas estão na moda entre os charlatães, quânticos ou não), e algumas comentadoras cépticas tentaram contra argumentar perguntando, entre outras coisas, se "os ilustres" conheciam o "Cascão" e que é "cultura geral, está na internet"...acho que isto ilustra muito bem a mentalidade que corre e discorre e que vem à tona sempre que é lançado um alerta.
Os cientistas são totós, é o que é, não sabem nada. O Deepak Chopra é que a sabe toda... :p
;)
No meio de tamanha trapalhada ainda soltei umas gargalhadas quando a power balance mostrou a sua indignação quanto à venda de produtos contrafeitos, que não apresentavam o potencial "terapêutico" que as originais!
Abusando da crendice
das pessoas em geral,
vai-se tornando usual
o recurso à vigarice!
JCN
Uma vez experimentei uma, só para provar que não funcionava. No suposto teste de equilíbrio, parti da evidência que não é uma pulseira de plástico que dá equilíbrio e claro, não deu. Eu não sou cientista, apenas uma pessoa normal, e não conseguia acreditar nisso, como em muitas outras coisas. Mas, homens de pouca fé, é a fé que vende e os milagres são para quem acredita neles. Tirando isso, haja pelo menos um senso estético. A pulseira é feia! No mínimo. Meu Deus, como anda o mundo... Agora o plástico com não sei o quê é que é nosso amigo! Que mariquice!!! Se fossem diamantes...
Ana
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