quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

As "Histórias Falsas" de Gonçalo M. Tavares


Como sou um admirador da escrita de Gonçalo M. Tavares ando, depois de ter lido o livro, a ouvir no meu carro a edição audio das "Histórias Falsas" desse autor (locução de David Borges, edição de MHIJ; um bocadinho pode ser ouvido aqui). Não resisto a transcrever um excerto da história de Mercatore, um rico comerciante contemporâneo do filósofo grego Diógenes (Claro que Tavares mistura brealidade e ficção):

“Descia Mercatore umas pequenas escadas quando deparou com o filósofo, pobremente vestido, sentado no chão, contra a parede, a comer lentilhas.

Arrogante, mais do que era seu costume, cheio de vaidade pela riqueza que ostentava, e pelo estômago farto, disse, para Diógenes:

- Se tivesses aprendido a bajular o rei, não precisavas de comer lentilhas.

E riu-se depois, troçando da pobreza evidenciada por Diógenes.

O filósofo, no entanto, olhou-o ainda com maior arrogância e altivez. Já tivera à sua frente Alexandre, o Grande, quem era este, agora? Um simples homem rico?

Diógenes respondeu. À letra:

- E tu - disse o filósofo - se tivesses aprendido a comer lentilhas, não precisavas de bajular o rei.”

7 comentários:

Tatiana Faia disse...

Muito bom!

Anónimo disse...

brealidade?

Anónimo disse...

Esta, parece uma historieta de tasca!
Um manda uma boca para lixar o outro, e outro manda outra ainda pior.
Depois do Descia mandar a boca, o Diógenes replica com ainda maior arrogância! Eu pensei que a arrogância é uma coisa má, que os homens sábios são humildes, e tal e coisa, afinal enganei-me, são arrogantes e altivos, do pior, de fugir!
Quem é este triste do Descia, pensa o filósofo, que cúnfia, vem para mim de carrinho, para mim, que sou íntimo do Alexandre? Deixa lá que já te ponho os patins!
Se calhar o alfaiate do Cavaco Silva também se julga o maior só porque dá dois dedos de conversa com o homem. É assim que se mede a sapiência. Muito bem.
A última resposta é muito fraca e não convence ninguém: quem for honesto limita-se a ter que gostar de lentilhas! Tá bem tá, espera lá que vais ter muitos seguidores , ó Diógenes!
O que o Diógenes devia fazer era copiar o seu discípulo Desidério: arranjar um lugar numa boa universidade e com bom ordenado, publicar uns bons livros que vendam bem e que deiam mais uns euros, mais umas crónicas no Público, que também devem render bem, e com isto tudo ter bastante dinheiro para ir comer ao Gambrinus de vez em quando, já não digo todos os dias.
Se o Desidério for apanhado a comer lentilhas, pode sempre dizer: ó pá, estou a comer isto porque gosto, os gostos não se discutem, qué uma das conclusões da filosofia da estética, porque ainda ontem estive a encher bem a pança no Gambrinus, hoje é que me apeteceu isto, sabes? Por isso vai lá lamber as botas ao rei, eu não preciso dessas cenas, a mim basta-me o enorme poder do meu cérebro par me safar bem na vida, vai lá lamber as botinhas, baza!
E isto tudo tinha que ser dito num tom de gozo e com um sorriso irónico, nada de arrogância estúpida.

Ainda nunca li nada do Tavares, se calhar já nem lhe vou pegar! O Saramago também diz muito bem do homem, eu é que não percebo nada disto!
luis

sinuosa disse...

yep, isto não é conversa de filósofo, é conversa de todos nós, os chicos e chicas espertas.
Ainda hoje, me estiveram a chatear por eu fumar que ia ficar doente e eu disse: e depois?, é mais uma maneira de ficar doente; e tornam: lá estás tu a desconversar; e eu: e quem é que começou a desconversar?, até foste tu!

Anónimo disse...

As duas experiências não são incompatíveis, digo a do lamber as botas (ou os pé-de-meias) do poder vigente e a do gozo narcísico. Digo mais sob pena de o injustiçar, duvido que o Dr. se satisfaça só com uma.
O meu amigo até pode falar "de gente que fala de filosofia", mas além destes filosofemas de bolso para arvorar o protagonismo tonto habitual e costumeiro elevado agora a comezana académica. Nada mais releva que razia de pensamento especulativo e crítico, infantilização dos estudantes e leitores.

Anónimo disse...

tiveste um mau dia... admite la

Anónimo disse...

podiam fazer uma analise/interpretaçao deste livro?

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