domingo, 17 de fevereiro de 2019

O "ranking clássico" e o "ranking do sucesso"

"Este indicador não premeia a retenção e 
ao mesmo tempo não premeia a seleção de alunos, 
porque estamos a comparar alunos comparáveis. 
Uma escola que recebe alunos de nível dez e os leva a 17 
é uma escola muito melhor do que 
uma que recebe alunos de 15 e os leva a 17, 
porque o resultado daquela escola é muito mais rico, 
comparar apenas médias é muito pobre".
João Costa, Secretário de Estado da Educação, 2016. 


O ranking "clássico" das escolas, ou seja o posicionamento hierarquizado das escolas com base nos resultados obtidos pelos estudantes em exames nacionais, tornou-se um anacronismo por referência à última reforma curricular, de 2016 em diante. De facto, essa reforma:
- minimiza o conhecimento disciplinar e desvaloriza as capacidades cognitivas, precisamente as duas componentes curriculares que são objecto de medição nos exames nacionais;
- insiste na contextualização do conhecimento em função das especificidades locais e dos alunos, incentivando o tratamento de problemas/temas que lhe "digam respeito";
- faz sobressair a importância das capacidades pessoais e sociais (afectivas e, sobretudo, emocionais), destacando, em tempos mais recentes esse grande ideal que é "felicidade";
- destaca como finalidade última que todos alcancem as ininteligíveis "competências transversais", prescritas pela OCDE, que dão corpo ao "Perfil de aluno".
Precisamente por isso, a actual equipa do Ministério da Educação, criou um outro ranking, mais compatível com a sua "política de sucesso": é o "ranking do sucesso". Quando, há três anos, o secretário de Estado da Educação o deu a conhecer destacou que se tratava de uma medida que superava em muito a que se baseava nos exames por ser mais"justa, robusta e consistente".

Mas, em que é que se baseia este novo e revolucionário ranking? Baseia-se na percentagem de alunos que terminaram o ensino secundário sem reprovações e com classificações positivas nos exames das disciplinas trienais.

Não se trata de comparar os resultados dos alunos, considerados na sua totalidade, por escola, mas de comparar a evolução de grupos semelhantes de alunos de diversas escolas. Parte-se do princípio que a sua evolução depende do trabalho, em termos de percursos de sucesso, que ela proporcionar.

O que passou a acontecer, bem visível neste ano, é uma dissonância entre os indicadores dos dois rankings. Escolas com lugares cimeiros no "ranking clássico" tendem a situar-se abaixo de meio da tabela no "ranking do sucesso".

Confesso a minha grande indiferença em relação a estas tentativas nacionais, muito esgrimadas de medir os desempenhos dos alunos, mais para aqui e menos para ali, mais isto e menos aquilo. Na verdade, elas parecem-me igualmente distractoras do essencial:
e o essencial é a recuperação do sistema educativo na sua função estrita de ensinar e de aprender conhecimentos disciplinares que permitem desenvolver capacidades humanas estimáveis.
Enquanto tivermos um sistema que se propõe transformar os alunos em "capital humano" sobretudo nas/em certas escolas públicas, onde, por principio, se acantonam os que têm mais dificuldades culturais e económicas, tudo o resto é secundário.

3 comentários:

Maria Dulce R. Marques da Silva disse...

Parabéns Doutora Helena.
Parabéns pelos textos que escreve.
Corroboro inteiramente o que afirma mas, infelizmente, o nosso sistema educativo está a agonizar.

Anónimo disse...

Peço desculpa por o meu discurso, claro e sensato, começar a parecer muito repetitivo, mas as únicas armas de que disponho, para lutar contra a destruição bárbara da escola, são as palavras que escrevo e as ideias que elas transmitem. Prometo ser sintético.
Sou professor do ensino secundário, com uma experiência de mais de trinta anos ao serviço do ensino e da aprendizagem. Ao longo destes anos, lecionei Matemática, Ciências Físico-Químicas, Física, Ciências do Ambiente, Física e Química (do Profissional e do Recorrente), Área de Projeto e também umas excentricidades, de que já não me lembro muito bem, destinadas a alunos adultos que, no fim de cada ano letivo, apresentavam publicamente um powerpoint com o seu percurso de vida, onde faziam uma autocrítica, ao estilo das da revolução cultural de Mao, em que narravam as misérias da sua vida passada, como requisito indispensável à obtenção do seu diploma de curso. Desde os primeiros anos de profissão, tenho sido corretor de exames e, mais recentemente, de provas de aferição. Com esta experiência toda, faço coro com o bom povo português que diz que o pior cego é aquele que não quer ver. As sucessivas e numerosas pseudorreformas na educação, a que temos vindo a assistir, têm como fim supremo o sucesso escolar completo de todos os cidadãos portugueses abrangidos pela escolaridade obrigatória de 12 anos. Como as autoridades governamentais querem alcançar, o mais rapidamente possível, esse estado de “felicidade” coletiva dentro das escolas, têm carta livre, baseados na célebre máxima de que os fins justificam os meios, para darem livre curso aos seus delírios flexíveis das aprendizagens essenciais em contexto de sala de aula, cortando, a torto e a direito, as matérias disciplinares dos currículos que minimamente possam apresentar a mínima dificuldade de aprendizagem para o aluno mais destituído, com prejuízo evidente de uma preparação escolar adequada às necessidades do mundo do trabalho e da vida! Isto significa que estão a destruir a escola!
Racionalmente, o principal critério de qualidade de uma escola não pode ser a elevada percentagem de notas elevadas que atribui, porque os professores podem estar cumprir ordens de ensinar apenas trivialidades fáceis e inúteis, como as “aprendizagens essenciais” e flexíveis! Uma boa escola é aquela onde os professores ensinam bem o muito que sabem, mais difícil ou fácil de aprender, proporcionando assim uma boa preparação dos seus alunos para o mercado de trabalho e para a vida!
Ao contrário do que possam pensar as moças iluminadas do Bloco de Esquerda, os selvagens não são todos bons, como os do Rousseau, nem querem ser todos doutores à força!

Anónimo disse...

Errata:
Onde se lê "carta livre" deve ler-se "carta branca".

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