Trancrevo com a devida vénia do Público de hoje (Revista) parte de artigo de Clara Viana, Graça Barbosa Ribeiro e Samuel Silva a respeito do infeliz mandato de Nuno Crato na educação e na ciência, que aproveitou declarações minhas:
"Críticas de alguns dos principais cientistas,
protestos da geração mais jovem de investigadores,
contestação das universidades e
até impugnações em tribunal — o mandato
de Nuno Crato foi marcado por um clima de
contestação sem precedentes na ciência. A
redução acentuada do número de bolsas de
doutoramento e a avaliação dos centros de
investigação pela Fundação para a Ciência e
Tecnologia (FCT) foram os principais ingredientes
de uma legislatura polémica, fazendo
até esquecer os problemas de financiamento
aos quais o sector não ficou imune.
Nuno Crato deixa “um legado de abandono
e quebra do consenso que existia acerca da
ciência”, avalia Carlos Fiolhais. O cientista
e o ministro eram próximos até há quatro
anos, mas este professor da Universidade
de Coimbra acabou por tornar-se numa das
principais vozes críticas da política do MEC.
“Julgava que o conhecia e nem nos meus piores
sonhos julguei que se pudesse passar o
que se passou”, confessa à Revista 2.
Na blogosfera e nos jornais, Fiolhais foi
fazendo uma avaliação crítica ao longo do
mandato. Quase no final do consulado de
Crato, mantém uma visão feroz sobre a sua
política científica: “Os sucessos dos investigadores
que por vezes aparecem nas notícias
são fruto do legado de Mariano Gago [que foi
ministro da Ciência durante 16 anos, repartidos
entre os governos de António Guterres
e José Sócrates].” “Colheu-se, mas não se semeou.
Pior: cortaram-se muitas árvores que
davam bom fruto”, acrescenta.
A proposta de Nuno Crato e da secretária
de Estado da Ciência, Leonor Parreira, era
apostar numa investigação “de excelência”,
privilegiando os centros de investigação com
maior capacidade instalada e condições de
serem competitivos em termos internacionais.
Mas cedo as críticas se começaram a tornar
audíveis. Em 2013, alguns dos principais
cientistas nacionais, como Sobrinho Simões
ou Alexandre Quintanilha (hoje candidato
independente pelas listas do PS), deixaram
os primeiros avisos, apontando sobretudo
o dedo ao desinvestimento no sector. Os laboratórios
associados, por exemplo, sofreram
cortes de 40% e a percentagem do PIB
investida em I&D baixou de 1,53%, em 2010,
para 1,36%, em 2013.
As críticas ao parco financiamento acabaram,
porém, por ficar para segundo plano
face à dimensão do golpe sofrido pelo sistema
científico nacional no ano seguinte. No
início de 2014 eram conhecidos os resultados
do concurso de bolsas individuais de doutoramento
da FCT: dos 3416 candidatos, só
298 seriam financiados, o que correspondia
a um corte de 40% face ao ano anterior. Nos
dois concursos seguintes, o número de bolsas
aumentou ligeiramente (foram atribuídas
399 este ano), mas manteve-se, ainda assim,
muito aquém dos anos anteriores.
O foco de tensão seguinte foi a avaliação
dos centros de investigação, que eliminou os
apoios públicos para praticamente metade
dos laboratórios nacionais. De 322 avaliados, 154 não conseguiram ter nota suficiente para
passar à segunda fase, em que se discutia o
acesso à maior parte dos 71 milhões de euros
de financiamento disponível. A contestação
aumentou de tom quando veio a público o
contrato entre a FCT e a European Science
Foundation (ESF) — a entidade responsável
pela avaliação — em que estava definido que
só 50% das unidades poderiam passar à segunda
fase.
Os reitores chamaram-lhe “um falhanço
pleno” e as críticas mantiveram-se até ao
encerramento do processo, já neste ano,
justificando mesmo que alguns centros de
investigação tenham impugnado a avaliação
em tribunal, apontando “erros grosseiros” a
um processo em que a FCT mudou as regras,
no seu decurso, pelo menos sete vezes.
Carlos Fiolhais considera que esses dois
processos vão ter consequências críticas
num futuro próximo. Devido ao corte nas
bolsas de doutoramento, “há uma geração
de cientistas a quem foi negada uma oportunidade
de continuar o seu trabalho e que
vai fazer falta nos próximos anos”, acredita.
Já a avaliação da FCT eliminou “unidades
de investigação produtivas, que demoraram
muitos anos a desenvolverem-se, e que
não se conseguem recuperar facilmente”.
O resultado destas políticas foi “um sistema
científico mais pequeno e com uma enorme
concentração de recursos num conjunto
restrito de grupos de investigação”. O físico
de Coimbra lamenta que alguns dos danos
provocados por Nuno Crato na ciência sejam
“irrecuperáveis”. Outros “podem demorar a
serem corrigidos”.
Em época eleitoral, o PS alinha com os críticos da política de Crato. “É fundamental
recuperar a confiança no sistema de ciência
e tecnologia, que ao longo dos últimos 25
anos conheceu um desenvolvimento assinalável,
mas que foi interrompido em 2011”,
defende fonte do partido. Apesar das críticas
quase generalizadas feitas à política científica do actual Governo, a coligação Portugal
à Frente defende que o próximo executivo
“deverá prosseguir” a linha dos últimos anos
“no sentido de potenciar uma maior competitividade
internacional do sistema científico
e tecnológico português”. "
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