“
Atingir o ideal é
compreender o real” (Jean
Jaurès).
Pelo interesse do
comentário de FMC ao meu post, “O circo funambulesco das pedagogias
alternativas” (20/07/2015)”,entendi chamar a atenção para a respectiva leitura (que
recomendo vivamente), correndo eu o risco em deslustrar o respectivo brilho
pela opacidade do verbo desta minha resposta.
Corro esse risco! Começo
por dizer que o nome do comentário (“Nada”)
está desajustado. Se me é permitida a sugestão, pelo número de questões nele levantadas,
profundidade dos temas questionados e sua complexidade, sugiro este título: “Tudo”.
Assim, logo de
início, a questão posta é: “Qual o Homem que queremos construir e com que objectivo supremo”? Sem entrar em domínios ontológicos, para não
assumir o papel de sapateiro que toca rabecão (embora pudesse encontrar arrimo
em Huxley: “A metafísica!... Num deserto
de ideias, um dilúvio de palavras”), entendo ser objectivo, essencialmente, de
natureza política. A sociedade comunista
tinha um objectivo; a sociedade
hitleriana outro; Portugal Salazarista outro; Portugal logo após o 25 de Abril
outro; Portugal do tempo de Nuno Crato
outro. Repare-se que o insuspeito Francisco de Sousa Tavares (um homem
de Abril) não hesitou em escrever criticamente: “Estamos a formar não um país de
analfabetos, como até aqui, mas um país de burros diplomados”.
Depois, entrando em domínios
freudianos, em tempos em que era convidado para fazer palestras sobre Educação
desculpava-me da subjectividade do tema com as costas largas do fundador da
psicanálise. Uma vez interpelado por uma
mãe angustiada sobre a melhor forma de educar o filho, respondeu: “Minha
senhora, faça o que fizer fará sempre mal!”
Batendo à porta da Pedagogia, ocorre-me
a história de um pedagogo que dizia, citando-o de memória: “Dantes
tinha seis teorias sobre Educação e nenhum filho, hoje tenho seis filhos e
nenhuma teoria!”
Mas vejamos, agora, o desencanto
de Platão sobre a Educação do seu tempo quando confrontado com a incapacidade
das crianças distinguirem os números pares dos números ímpares, dizia:
“Quanto a mim, parecemo-nos mais com porcos
do que com Homens e sinto-me envergonhado não só de mim, mas de todos os
gregos”.
Avancemos séculos e ouçamos Nietzsche:
“E assim cheguei até vós, ó homens de hoje, e ao país da educação. E o que me aconteceu? Não obstante toda a minha
ansiedade, tive de rir. Nunca os meus olhos tinham contemplado algo tão
manchado e heterogéneo”.
Admirador confesso de Eça, de
minha leitura de mezinha de cabeceira, não podia deixar de o evocar com esta
citação que subalterniza a cultura, lato sensu, a costumes fúteis (ontem
como hoje?): “Uma nação vive, prospera, é respeitada, não pelo seu corpo
diplomático, não pelo seu aparato de secretarias, não pelos banquetes
cerimoniosos de camarilhas. Isto nada vale, nada constrói, nada sustenta; isto
faz reluzir as comendas e assolhar o pano das fardas – mais nada. Uma nação
vale pelos seus sábios, pelas suas escolas, pelos seus génios, pela sua
literatura, pelos seus exploradores científicos, pelos seus artistas”.
A Educação é um fenómeno social de real importância em que se devem preparar os jovens de hoje para amanhã - um amanhã
onde o avanço da Ciência e das novas tecnologias se renova todos os dias - sem
que os próprios educadores saibam qual ele
venha a ser! Isto é, já lá vai o tempo em que a Educação era um saber
estabilizado transmitido de geração em geração.
“A
única forma de prevermos o futuro é ter
poder para formar o futuro”, como escreveu Eric
Hoffer. E saberemos nós utilizar um poder para
qual não estamos preparados? Vazio de soluções sobre o desafio
que me é feito sobre se tenho alguma ideia sobre “o papel da escola neste
refazer do Homem”, sinceramente, respondo: Não”!
Sinto-me, muito
sinceramente, perdido num verdadeiro
labirinto de Creta sem o fio de Ariadne que me indique o caminho da saída.
Na imagem: Nietzsche (citado no texto)
P.S. : Acabo de rectificar o último parágrafo do meu texto que estava redigido, parcialmente, da forma seguinte: "Sinto-me, muito sinceramente, perdido num verdadeiro la"(...)
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3 comentários:
Professor, agradeço a sua resposta apesar de a pergunta ter sido de retórica... O ideal não tem solução real. O Homem não se explica (ou explica-se mal) porque realmente não se compreende, porque idealmente continua a habitar o exterior das coisas e das palavras e porque não faz a menor ideia de onde vem, nem para onde vai. É um fingidor que abrilhanta o opaco sapato do que toca rabecão com um movimento repetidamente repuxado do concetual pano roto, no vaivém superficial das mãos sujas de tinta.
Agradeço também o risco que correu ao ter descido a rua, pedindo emprestado o meu rabecão para sapatear um poucochinho ao ritmo do jazz devolvendo-me virtuosamente à minha condição original... um exemplo do que o João Lobo Antunes chama de “desnatamento” dos casos complexos ou arriscados que poderão perturbar a tranquilidade de uma clínica rotineira ou arriscar a reputação pessoal e profissional do médico.” (in “Inquietação Interminável – Ensaios sobre ética das ciências da vida; Gradiva, pág. 225).
Retomando a centralidade da mesa e retirando da bandeja de prata o que me serviu, confundo-me na etiqueta de não saber que talheres segurar, tal a diversidade de alimentos com que me presenteou. Sem entrar em domínios ontológicos, eis, então, a política... com o Esteves sem metafísica à porta da Tabacaria a apreciar os círculos de fumo que saem da sua boca e a cantar lengalengas de História encadeada sobre a teoria humana de ser humano, percepcionando com estudiosa sistematicidade o fracasso de o SER, faça-se o que se fizer. Professor, quem tinha seis filhos era o Goebbels e a Magda matou-os a todos nos últimos dramáticos momentos.
Posto isto:
“Uma nação vale pelos seus sábios, pelas suas escolas, pelos seus génios, pela sua literatura, pelos seus exploradores científicos, pelos seus artistas”. Talvez... embora a genialidade seja demente e incompreensível para a maioria; a literatura cumpra a beleza anárquica da palavra e do sonho; os cientistas descubram o que sempre existiu na limitação do comprovável; os artistas se enrolem na macieira, ao mesmo tempo que caem do céu, quais anjos expulsos pela inocência, acolhidos para sempre na lucidez, uma luz que seca... Desculpe ter agora depilado o bigode de Nietzsche (piaçaba de Eça) e despojado o homem da superior alternativa de ser super, nesta minha tentativa de perceber o grande desígnio do imóvel e quasimudo Hawking, mas não resisto a puxar a toalha da mesa para ver cair, um por um, todos os pratos e copos que sustentam este cordial banquete.
Ontem, ouvi o Bagão Félix dizer que, se andarmos muito para trás, antes da primordial explosão, decerto encontraremos Deus. Portanto, atrás da explosão, Deus; à frente, nós (com Ele, sem Ele, Ele?). A explosão talvez tivesse violado a fronteira entre o inanimado e o animado, o não-humano e o humano, abrindo um túnel errático de passagem. Ficámos assim, presos a esta identidade de bosão, partícula elementar que medeia as forças (do bem e do mal). A ética não é possível neste clima... Afinal, que ordem cósmica se projeta na mundana? Política não ontológica é um palhaço sem graça. Os erros históricos devem-se à falta de graça. Graça no sentido ontológico do ser.
Um abraço,
FMC
Transcrevii, há pouco, este seu comentário num meu post intitulado:"Um novo comentário ao meu post, "Uma tentativa de resposta ao comentário: Nada!"
Retribuo e agradeço o abraço que me foi enviado.
:)
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