quarta-feira, 18 de setembro de 2013

Ciência numa encruzilhada: financiamento e impacto.

Na última década Portugal teve um incremento extraordinário em I&D: triplicamos o investimento, quadruplicamos os recursos humanos, quase que multiplicamos por 10 o número de doutoramentos anuais, foram reforçadas e criadas imensas infra-estruturas dedicadas ou de apoio à comunidade científica.

Porém, do lado dos outputs os resultados, embora interessantes, ficam aquém do expectável. Pior, mostram problemas estruturais graves que não foram de forma alguma resolvidos com o aumento do financiamento.

A produção científica por investigador não aumentou, continuando muito baixa. O número de patentes ou o retorno dessas patentes é dos mais baixos da Europa e não aumentou consideravelmente. As exportações de "alta-tecnologia" também aumentaram pouquíssimo - sendo igualmente das mais baixas da EU27, as colaborações entre o sistema científico e as empresas mantém-se igualmente entre os mais débeis da Europa, a dependência das Universidades do financiamento público aumentou, mostrando uma incapacidade de gerar receitas próprias. Em termos de projectos do 7º Programa Quadro europeu, Portugal tem sido um contribuinte líquido em cerca de 20% (só consegue recuperar 80% do dinheiro que pagamos para os fundos europeus).

As empresas continuam a não contratar doutorados e as universidades, com um corpo docente envelhecido, também não lhes abrem as portas.

Perante a crise em que o nosso país está envolvido, ouvem-se vozes de desespero por parte de Reitores e responsáveis por unidades de I&D. Mas, perante os resultados obtidos na última década, terão eles razão? Será mesmo necessário mais financiamento? Ou não será melhor primeiro fazer as reformas que precisam ser feitas para que Portugal fique melhor na fotografia?

Embora o Estado deva ser um actor forte no apoio à I&D, não acredito que o seu papel deva ser reforçado, mas antes reduzido e, sobretudo, ser um actor mais eficaz do que tem sido: basicamente um distribuidor de esmolas entres os "pobres".

Se quisermos ter um investimento em I&D rentável, temos que pensar em criar um ambiente económico e fiscal que atraia o investimento privado, sobretudo o internacional - como o fez a Irlanda. O sector privado não precisa de esmolas do Estado.

Outro aspecto importante é ter um plano ambicioso e coordenado para estimular o empreendedorismo. O mundo mudou imenso e hoje quem cria empregos de alta-tecnologia não são as grandes corporaçoes mas as pequenas empresas.

Porque é que Israel tem mais Startups que França e Alemanha juntas? Serão os israelitas mais espertos ou sabem tirar proveito do seu know-how? Temos factores competitivos muito fortes: clima, salários, geografia, mão de obra qualificada, criatividade. Um programador Java fica 3 vezes mais barato aqui que na Alemanha. Porque é que Portugal não é ainda uma powerhouse de desenvolvimento de informática para o resto da Europa?

Deixo aqui estas questões, num momento tão crucial da nossa história. O mundo mudou. É preciso mudar as mentalidades e perceber que o dinheiro público nem sempre é a solução mas muitas vezes o problema.

1 comentário:

Anónimo disse...

Falta de massa crítica; corpo docente envelhecido; falta de cultura; falta de capacidade de investimento (agradeçam às políticas financeiras nos últimos 5/6 anos e à UE).

Centremos-nos nas três primeiras: só se resolvem investindo ainda mais na formação, no sistema científico e nas universidades. As reformas estruturais não são um eufemismo para cortes e despedimentos. A reforma estrutural é dar nova forma à estrutura. Neste caso, a estrutura universitária e a estrutura social. Ambas demoram tempo e custam dinheiro, mas as grandes reformas são assim mesmo - pouca dadas a gestores de prémio anual, jogadores de risco ou economistas de donas de casa. Se não existe renovação nas universidades, se não existe criação de massa crítica, então continuaremos a ter um índice mediano de publicações, a ter uma população sem sentido crítico e disposto a embarcar em conversas cheias de trivialidade e sofismas, como as que são cantadas em economês arraçado de bretão pelos empreendedores, e continuaremos a ter a situação vergonhosa, para a UE, de Portugal andar a subsidiar o sistema científico Inglês (é isso que significa sermos contribuintes líquidos). Reformas estruturais, para quem sabe algo da história do mundo, demoram muito tempo e dinheiro. Se depois de séculos de atraso, precisamos de reformar a estruturas do sistema científico e universitário, então é preciso investir mais, especialmente nos recursos humanos.

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