sábado, 5 de abril de 2008

“Dê-lhe contos de fadas”

Em Fevereiro passado, escrevemos para o De Rerum Natura um texto intitulado Ei, intelectuais! Deixem as crianças em paz!, sobre a Colecção de Clássicos da Literatura Portuguesa Contados às Crianças, que o semanário Sol e as Edições Quasi decidiram publicar em conjunto. Continuamos a reflexão que iniciámos nesse texto, pois entendemos que a adaptação de obras marcantes da literatura, pelas questões fundamentais que levanta, merece mais algumas considerações.

Se atendermos à forma dos livros que compõem a dita colecção, inferimos que tais livros se destinam a crianças que dão os primeiros passos na leitura, senão vejamos: têm poucas páginas, os caracteres são muito grandes, as imagens são vastas e coloridas, a capa é dura, as folhas resistentes. O estilo da escrita vai, pelo menos em muitas passagens, no mesmo sentido. Por exemplo, n’ Os Maias a história começa assim: “Foi há muito tempo. Foi antes de tu nasceres, foi também antes de eu nascer, foi antes de os teus pais nascerem e mesmo antes de os teus avós nascerem. Foi no tempo em que as casas tinham nomes”.

O que queremos discutir neste texto é se os livros adaptados, com o intuito de fazerem parte da colecção a que aludimos, são, de facto, adequados ao público a que se destinam.

Comecemos com uma história contada por Maria Emília Traça (1992: 23).

“Era uma vez um famoso físico chamado Albert Einstein, que um dia encontrou uma senhora extremamente desejosa de ver o seu filho triunfar numa carreira científica. A senhora pediu ao sábio que lhe desse conselhos sobre a educação do seu filho, em particular sobre o tipo de livros que lhe deveria ler.
– ‘Contos de fadas’, respondeu Einstein, sem hesitar.
– ‘Está bem, mas que deverei ler-lhe em seguida?’, perguntou a ansiosa mãe.
– ‘Mais Contos de fadas’, replicou o grande cientista acenando com o seu cachimbo como um feiticeiro que prenuncia um final feliz para uma longa aventura.”

Pois é, os leitores mais pequenos devem ler contos de fadas e outros livros adequados à sua idade e não Os Maias ou outras obras destinadas a jovens quase adultos ou a adultos. Há temáticas mais adequadas a estes leitores, mais compreensíveis, mais edificantes, enfim, mais próprias para eles.

Que ideia tão estranha a de querer que as crianças, conheçam Os Maias! É impossível uma criança nos primeiros anos de vida ler Os Maias. Trata-se de uma obra com 712 páginas (Edição «Livros do Brasil»), que exige uma destreza de leitura e um conhecimento do mundo e do homem incompatíveis com a sua capacidade de entendimento. Isto para não falar da temática, totalmente desajustada a um leitor muito jovem. Ou seja, o que estamos a defender é que há livros impróprios para serem postos nas mãos de uma criança, do mesmo modo que há filmes impróprios para menores de 16 ou de 18 anos.

N’ Os Maias, o que temos? Uma belíssima visão crítica da sociedade do século XIX apresentada por um dos maiores escritores portugueses, possuidor de um estilo que confere às suas obras a marca da arte literária. Já vimos no post anterior que adaptar uma obra destas é destruí-la: ao ser adulterado o estilo do escritor e alterados os assuntos, deixámos de estar perante a obra do escritor para estarmos perante uma imitação, uma abusiva e má imitação.

Mas, então, não devemos dar estas obras aos mais jovens? Não, não devemos. Eles vão lê-las quando tiverem idade de as poder compreender em todas as suas dimensões.

Então, o que devemos dar a ler às crianças mais pequenas? Literatura, naturalmente! Textos literários, sem dúvida! Mas quais?

Podemos considerar três tipos de textos a pôr nas mãos das crianças: os produzidos pelos chamados escritores de literatura infanto-juvenil, os dos escritores de literatura canónica que escreveram algumas obras especificamente para o público mais novo, como, por exemplo, o Romance da Raposa, a Arca de Noé e O Livro de Marianinha, de Aquilino Ribeiro, e, ainda, as obras de escritores consagrados que não foram especificamente escritas para crianças, mas cuja temática também é adequada ao nível etário dos mais novos.

Não vamos focar os dois primeiros casos: trata-se dos textos obviamente destinados às crianças. E são estes os que devem predominar.

No que diz respeito ao terceiro caso, que fazer para que as crianças comecem a tomar contacto com a escrita maior dos autores considerados clássicos? Três caminhos foram seguidos no passado e podem continuar a ser trilhados: a escolha de textos completos de pequena extensão; a selecção de excertos da obra com determinada unidade, eventualmente precedidos de uma contextualização da situação ou do episódio; e a introdução de supressões na obra, mantendo o essencial, tornando-a com uma extensão mais compatível com a capacidade de leitura da criança. Em qualquer destes casos, além do respeito pelos assuntos e pela intencionalidade comunicativa, opte-se sempre, sempre, pela manutenção das palavras do escritor, das suas frases, da sua construção de parágrafo, enfim, do seu estilo.

Nota: Este assunto continua num próximo post.... Com a indicação de alguns textos de escritores consagrados que podem servir para que as crianças iniciem a leitura dos clássicos.

Referência bibliográfica: Traça, Maria Emília (1992). O Fio da Memória. Do Conto Popular ao Conto para Crianças. Porto: Porto Editora.

Maria Regina Rocha e Maria Helena Damião

10 comentários:

Anónimo disse...

88ALFAÓMEGA777

Devemos estar num mundo de "loucos" ou de "super intelectuais", pois os alunos do ensino secundário não podem ser martirizados com Luis de Camões ou Gil Vicente, mas para um fedelho de cinco anos já nada mais apropriado como o Eça de Queirós com OS MAIAS.

E porque não Camilo com O AMOR DE PERDIÇÃO ?????

HAJA BOM SENSO !!!!!!!!!!!!!!!

Ana Cristina Leonardo disse...

Que ideia tão estranha a de querer que as crianças conheçam Os Maias!

Não é uma ideia (nesse caso, seria estranha): trata-se tão-só de uma maneira parva (e talvez fácil) de ganhar dinheiro. Esse será o único simulacro de ideia que subjaz a esta colecção.

Carlos Medina Ribeiro disse...

Estou inteiramente de acordo com o teor deste "post".

LA disse...

A única dúvida que tenho é sobre a sapiência que o Einstein tinha sobre o que as crianças devem ler. É que muitas vezes esses gaijos sabem muito de física e matemática mas são fracos noutras áreas, não se pode ser bom em tudo.
No Cartas De Inglaterra o Eça dá uma opinião contrária, de que não se devem dar livros sobre fadas às crianças.
Eu não digo nada, não sei se será bom ou mau, acho que seria melhor fazer um bom estudo, ver o que se passou com as crianças que leram o quê e saber o que lhes aconteceu a nível profissional.
De resto concordo com o post.

Anónimo disse...

O Carlos Medina Ribeiro escreveu como comentário a este "post":

"Estou inteiramente de acordo com o teor deste "post"."

Os autores deste "post" certamente ficarão muito gratos pela sua benção. Comenta como carimba, o Carlos Medina Ribeira. Ora é a frase feita(pensamento regurgitado), ora é imperativo da autoridade: "Que se faça saber que eu, Carlos Medina Ribeiro, estou de acordo com o teor deste "post"". Sem mais, nem menos, nem algumas razões. Afinal, ele concorda com "teor". Ou seja, nem deve saber muito bem com o que concorda. Mas, ao bom jeito do falso intelectual, deu-se ao trabalho de comentar que concordava...com o teor. As autoras já podem dormir descansadas.

Anónimo disse...

Sobre Einstein e o argumento da autoridade:

Um dos livros que Einstein leu durante a sua adolescência foi a "Critica da Razão Pura". Livro que, segundo o próprio (e não só), o influênciou durante a vida. Comparem lá a CRP com os Maias e depois diga lá se o Einstein é bom exemplo.
Outros bons exemplos de Einstein: Nunca teve um doutorando e foi chocantemente infiel (com alunas e não só) durante a sua estadia nos EUA. Será mesmo que as palavras do Einstein devem ser utilizadas, fora do seu dominio, como se uma autoridade absoluta fosse? Claro que não.
Bem visto, este "post" não contem uma única razão sólida. É apenas opinativo, logo, pouco vale.

Anónimo disse...

Ninguém tem uma pedra para atirar a este tipo? Arre

Anónimo disse...

la escreve:

"É que muitas vezes esses gaijos sabem muito de física...mas são fracos noutras áreas"

tanta ignorância até doi!


Para lapidável:

Não Doutoramento e um comportamento "imoral" (imoral?)? Mas será que é necessário ser papa?
Ja se deixava o mesquinho e o humanóide, não?

Rui

Anónimo disse...

???

Anónimo disse...

não

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