sábado, 27 de maio de 2023

MIÚDOS AGARRADOS A UM ECRÃ E A ESCORREGAR PELA PAREDE

Em 2017, uma escola de Santa Maria da Feira (Escola EB 2/3 António Alves Amorim) proibiu o uso de telemóveis no seu recinto. Foi notícia na altura (ver, por exemplo, Uma escola portuguesa sem telemóveis), apareceu com alguma regularidade nas notícias e volta agora a ser destacada. Hoje, a Agência Lusa informa, no essencial, o seguinte (ver, por exemplo, aquiaqui):
Teria sido um professor a solicitar a restrição do uso de telemóveis.
Esse professor foi ouvido pela direcção.
O conselho pedagógico, os professores e o conselho geral (onde estão representados os encarregados de educação) estiveram a favor. Os miúdos acabaram por concordar.
Percebe-se aqui uma vontade partilhada... Mas também se percebe que medidas óbvias, razoáveis, comuns, afigurando-se "pedagogicamente" impopulares, requerem um escrutínio alargado.

Feitas as contas, a actual directora diz que a restrição foi "a melhor coisa" que aconteceu na escola:
- O recreio escolar readquiriu a animação característica desse espaço, os miúdos passaram a fazer o que os miúdos costumam fazer quando não usam telemóvel;
- Os miúdos dizem que gostam de fazer os que os miúdos costumam fazer quando não usam telemóvel;
- Sem usarem telemóvel, dizem os professores auscultados, desenvolvem capacidades de socialização e comunicação, desenvoltura argumentativa;
- Dizem também que o 'bullying' online diminui (nomeadamente, a difusão nas redes sociais de imagens e de vídeos captados nas aula, em situações de agressão, etc).
Nada de extraordinário! Medidas educativas tendem a traduzir-se em resultados educativos.

Destaco o comentário clarividente de uma professora de Matemática e Ciências:
"Venho de uma escola onde os miúdos, mal saíam das aulas, escorregavam pela parede abaixo com o telemóvel e ficavam ali agarrados àquilo. Não havia convívio como há aqui e por isso é que achei isto magnífico. Todas as escolas deviam seguir este exemplo (...) Estamos na era das comunicações, mas a nossa sociedade está a ficar doente por causa da falta de comunicação física, presencial. Acho esta medida importantíssima, pela saúde dos nossos filhos - principalmente a mental".

O tom que dei a este texto parece dar a entender que não valorizo por aí além a medida em causa. Na verdade, reconheço-lhe grande valor. Apenas sublinho que se trata de uma medida que, por isso mesmo, deveria ser a regra e não a excepção; deveria ser o normal e não o estranho.

Sobre a questão dos telemóveis em contexto escolar escrevi aquiaquiaquiaquiaquiaqui

2 comentários:

Anónimo disse...

Os comentários, que deviam ser mais que muitos, mas não são, suscitados por esta grito de alerta de Helena Damião, no que diz respeito às consequências nefastas de um mau uso das novas tecnologias de comunicação, indicam que a maioria dos professores, incluindo os "colegas" educadores de infância, não têm o mínimo interesse em conversar, sequer, sobre assuntos relacionados com educação.
A má utilização dos telemóveis, em contexto escolar, está diretamente ligada ao problema central da indisciplina e violência que grassa no interior, e nas imediações, das escolas EB 2,3, e nas outras também. Para além da indisciplina, as principais dores de cabeça dos professores, resultam dos baixos salários reais que auferem e da perda de autonomia científica e pedagógica que os transformou nuns paus mandados. A carreira dos professores do 3.º ciclo e do ensino secundário é substancialmente diferente de outras carreiras ligadas ao ensino, nomeadamente a dos educadores de infância. Impor, por decreto, que é tudo igual, é cometer um erro crasso, ao nível de difundir a filosofia ubuntu como panaceia para todos os males que corroem o ensino em Portugal.

Helena Damião disse...

Depois de escrever esta nota, tive conhecimento de uma petição que corre em favor da recuperação da escola / do recreio sem telemóveis: https://peticaopublica.com/?pi=PT116223

O BRASIL JUNTA-SE AOS PAÍSES QUE PROÍBEM OU RESTRINGEM OS TELEMÓVEIS NA SALA DE AULA E NA ESCOLA

A notícia é da Agência Lusa. Encontrei-a no jornal Expresso (ver aqui ). É, felizmente, quase igual a outras que temos registado no De Rerum...