Eis a minha posição sobre o assunto, recolhidas pela jornalista Alexandra Correia da Visão. Para conhecer outras posições sobre este assunto ver o belo número da revista que saiu hoje:
V ISÃO - Como explica a fé dos portugueses na Ciência (são menos de 200 mil os que, estando elegíveis para serem vacinados contra a Covid-19, não o foram. e a maioria é mais por medo do que por negacionismo)? Será mesmo fé na Ciência ou simplesmente os portugueses fazem o que lhes mandam?
CF- Os portugueses estão entre os povos europeus que mais acham que a ciência tem um impacto positivo na sociedade e, por isso, tendem a confiar nela. Há um inquérito da União Europeia, divulgado este ano, o Eurobarómetro sobre os conhecimentos e atitudes perante a ciência e os resultados revelam uma adesão à ciência mais do que em países mais desenvolvidos como a Alemanha e a França.
Além disso, diria eu, há em Portugal uma longa tradição de aceitação do que as autoridades (médicas, administrativas, políticas, etc.) indicam. Devem somar-se as duas coisas para se compreender o alto grau de aceitação da vacinação em Portugal, que está a acontecer no caso da pandemia de COVID-19 e que já antes era conhecido para outras vacinas. Estamos - felizmente - à frente de países a Alemanha e a França na cobertura vacinal da COVID-19. os portugueses fazem orelhas moucas aos negacionistas das vacinas.
Mas há um facto paradoxal. Se olharmos para os resultados dos inquéritos PISA da OCDE sobre os conhecimentos e capacidades em ciências dos jovens de 15 anos, vemos que a nossa escola está longe dos lugares cimeiros. O mesmo se passava com o Eurobarómetro nos tempos em que ele recolhia respostas a questões de ciência, para averiguar os conhecimentos da população. A nossa confiança na ciência é, portanto, um tanto «cega», já que não temos suficientes conhecimentos de ciência nem conhecemos bem o método científico. Além disso, os governos portugueses não têm valorizado a ciência, pois investimos em ciência e tecnologia muito abaixo da média europeia: o valor português de 2020 é 1,6% do PIB e a média europeia é 2,3%. Estamos muito longe dos lugares cimeiros (a Alemanha investe 3,1% e a França 2,4% do PIB). Neste quadro, a cultura científica só pode ser incipiente e superficial.
Em resumo: aceitamos bem algo que não conhecemos bem, algo que devíamos conhecer melhor, pois a ciência não é dos cientistas mas de todos.
VISÃO: Receia o crescimento de movimentos negacionistas em Portugal?
CF- Se é verdade que não é muito sonora a voz dos negacionistas das vacinas entre nós, não é menos certo que a pseudociência está omnipresente no nosso país em actividades relacionadas com a saúde como a homeopatia, a acupunctura, etc. Essas sectores desconfiam da ciência em geral. Chegámos ao ponto de o governo português ter regulado o ensino dessas «tretas», permitindo que sejam outorgados portadores de diplomas com bases absurdas.
Sim, receio que cresçam quer os negacionistas das vacinas quer os negacionistas da ciência de um modo mais em geral, entre os quais se contam os praticantes dessas «medicinas alternativas». É bem possível que o nosso maior desenvolvimento seja acompanhado por movimentos anti-científicos, como hoje acontece em países mais desenvolvidos.
Este problema da colisão entre saber e ignorância
não tem solução fácil. Para o obviar, é preciso que o espírito
crítico cresça, é preciso que os cidadãos estejam familiarizados
com a ciência, o que deve começar desde logo na escola: o espírito
crítico, que está no coração do método científico, tem de ser
transmitido desde a mais tenra idade. É necessário que tenhamos
mais espírito crítico. A ciência não é algo para aceitar
passivamente, mas sim um meio que tem sido muito bem-sucedido para
resolver muitas, embora não todas, as questões que o mundo nos
coloca.
1 comentário:
Quem não tem ambição, nem talento, nem se prostitui não come a cereja cristalizada do topo do bolo.
E assim, se chega a chefe.
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