“Em tempos, certas
dependências da administração pública (a Direcção-Geral do Consumidor, CP, CTT,
por exemplo, e tantas mais) dispunham de linhas 707: chamadas de valor
acrescido que proporcionavam aos departamentos oficiais receita suplementar.”
A Provedora de
Justiça emitira, porém, a 5 de Abril de 2018 (depois de perturbantes
contradições no seio do próprio serviço) oportuno e adequado comunicado, nos
termos do qual
“… adverte
para a circunstância de vários serviços públicos e empresas detidas pelo Estado
continuarem a usar linhas telefónicas de custos acrescidos (com os prefixos
707, …), como meio de contacto com os utentes, em desrespeito à legislação em
vigor."
"Não é legal a utilização de linhas de
telefone de custos acrescidos pela administração pública como meio de contacto
pelos cidadãos".
Rege neste particular
o art.º 11 do DL 135/99 (alterado pelos Decretos-Leis n.ºs 73/2014, de 13 de Maio;
58/2016, de 29 de Agosto e 74/2017, de 21 de Junho).
Por conseguinte, os
serviços não podem adoptar tais práticas; não é lícito que sujeitem os cidadãos
que os contactem a dispêndios acrescidos, para além dos normais custos de uma
chamada.
TAP,
CP, CTT, AT –
Autoridade Tributária e Aduaneira, Lojas e Espaços do Cidadão, Instituto de Segurança
Social, Serviços Municipais, Direcção-Geral do Consumidor, ADSE, Instituto
da Juventude, Caixa Geral de Depósitos, entre
outros, mantiveram, há não muito, tais linhas que constituíam como que uma
fonte suplementar (desnecessária) de receitas no afã de se “esportular” o
cidadão, avantajando a administração...
E a proibição não é, pois, de agora.
Porém, pela Lei
7/2020, de 10 de Abril, no quadro das medidas suscitadas pela pandemia, sob a
epígrafe “linhas telefónicas”, surge
surpreendentemente no seu artigo 9.º:
• Proíbe-se que tais
entidades se socorram de números especiais de valor acrescentado com o prefixo
«7» (707…), para contacto telefónico dos consumidores. Com custos que excedam
os montantes de uma ligação normal.
• Consente-se apenas
que haja números especiais, números nómadas com o prefixo «30», ou números
azuis com o prefixo «808», disponíveis para contacto telefónico dos
consumidores.
• Tais entidades
devem proceder à substituição por números telefónicos com o prefixo «2», no
prazo máximo de 90 dias [prazo que expirou a 09 de Julho pretérito].
Destinatários da
norma são-no:
- Entidades integradas na
Administração Pública central, regional ou local,
- Empresas que prestam serviços
públicos essenciais, designadamente de fornecimento de água, energia eléctrica,
gás natural e gases de petróleo liquefeitos canalizados, comunicações
electrónicas, serviços postais, recolha e tratamento de águas residuais, gestão
de resíduos sólidos urbanos e transporte de passageiros e
- Empresas concessionárias da
Administração Pública central, regional ou local.
A lei impõe ao
Ministério da Saúde que, prazo máximo de 60 dias, substitua o número de acesso
ao Serviço Nacional de Saúde - SNS 24 de prefixo «808» por um número especial,
assegurando a sua total gratuitidade para os utentes.”
É estranho que a
Administração Pública se revele relapsa no cumprimento da lei e das
recomendações emanadas da Provedoria de Justiça ("Ombudsperson").
E que haja
sistematicamente de se tornar a situações destas para que se não agrave a
posição do cidadão perante a Administração.
Até parece o processo
da abolição do papel selado, em Portugal, velha pecha da burocracia do Estado
Novo: foram precisos três diplomas legais para que o facto entrasse na cabeça
dos burocratas… e o “papel selado” fosse, com efeito, à vida!
ADENDA:
Cfr. o
artigo 11 do diploma da Modernização
Administrativa (DL 135/99, de 22 de Abril, actualizado) no que tange ao acesso aos serviços públicos por
telefone e outras plataformas electrónicas:
“1 - Nos
serviços e organismos da Administração Pública, onde as circunstâncias o
justifiquem, são afectadas exclusivamente a pedidos de informação apresentados
pelos utentes, uma ou mais linhas telefónicas, designadas por linhas azuis,
cuja instalação e manutenção deve ser prioritária.
2 - As linhas azuis devem ser adaptadas ou
instaladas de modo a não permitir a realização de chamadas internas ou para o
exterior, garantindo assim a sua total disponibilidade para o público.
3 - As linhas
azuis devem ser apetrechadas com um dispositivo especial para atendimento de
chamadas por ordem de entrada, bem como para a sua gravação, nos períodos de
encerramento dos serviços, para posterior resposta.
4 - Sempre que
possível e se justifique, o serviço deve ponderar a instalação de linhas de
atendimento específico de custos reduzidos ou nulos para o utente.
5 - A
existência destas linhas de atendimento é de referência obrigatória em todas as
comunicações e suportes informativos externos, bem como nos anuários
telefónicos.
6 - Sempre que possível e adequado, os
sistemas de atendimento telefónico aos cidadãos devem ser alargados de forma a
poder incluir comunicações por chat em plataformas electrónicas ou por
teleconferência, nomeadamente através de VoIP.
7 - As comunicações referidas no número anterior dependem de consentimento do cidadão.”
Já o artigo 11-A (aditado pelo
DL 73/2014, de 13 de Maio) prescreve, sob a epígrafe “Linha do Cidadão”:
“1 -
É criada uma linha de atendimento central do cidadão, designada por «Linha do
Cidadão», constituída por um número curto e facilmente memorizável, atribuído
nos termos do Plano Nacional de Numeração.
2 - A
«Linha do Cidadão» permite ao cidadão, através da marcação de um número único,
ter acesso ao universo dos serviços públicos prestados pela Administração
Pública Central que tenham serviços de atendimento telefónico nacionais.
3 -
Através de resolução do Conselho de Ministros, são identificadas as linhas de
atendimento telefónico da Administração Pública que se filiam na «Linha do
Cidadão», e são regulados os termos dessa filiação, a entrada em funcionamento
da «Linha do Cidadão» e a sua gestão.”
Mário Frota
apDC – DIREITO DO CONSUMO - Coimbra
Sem comentários:
Enviar um comentário