domingo, 25 de outubro de 2020

No final, Samuel Paty poderá ficar só

Texto na continuação de outro antes publicado. Ver aqui.

Imagem recolhida aqui.
As elevadas cerimónias fúnebres a Samuel Paty tiverem palco privilegiado na famosa Sorbonne. França (através dos representantes políticos, dos professores, da comunicação social e das pessoas comuns) prestou-lhe homenagens continuadas, todas elas impressionantes quanto à dimensão e envolvimento. 

Este professor, assassinado na sequência da abordagem pedagógica que entendeu dar à "liberdade de expressão", foi condecorado, a título póstumo, com a Legião de Honra, teve funeral de Estado e viu-se transformado num símbolo da República. À Assembleia Nacional chegou a proposta para que o seu corpo fique no Panteão Nacional, ao lado de nomes que constituem uma referência na cultura ocidental, alguns dos quais conhecidos por terem defendido a educação escolar pública, como Victor Hugo. Estão a ser pensadas medidas de protecção dos professores, sobretudo em caso de ameaça. 
Apesar da expressão que o conjunto de medidas teve e continua a ter, e que é plenamente justificada, não poderá salvar o direito e o dever de ensinar e de aprender a que a escola moderna está obrigada.

O esvaziamento e direccionamento do currículo, por força de pressões ideológicas diversas, constitui uma realidade bem palpável. Trata-se de uma realidade antiga que assume de vez em quando manifestações preocupantes, sendo aquele em que vivemos um deles: o conhecimento fundamental (tanto o que se inscreve nas disciplinas como o que se inscreve no domínio da ética, onde a cidadania se situa) e a estimação da capacidade de pensar (racionalmente) que escola pode oferecer não se vêem claramente afirmados nem nos múltiplos discursos sobre o currículo, nem nas directrizes que se lhe referem. Além disso, os professores que assumem tal desiderato tendem a ser vistos (e a verem-se) como marginais aos sistemas. O silêncio é, em muitos casos, o seu refúgio.

Assim, sem a afirmação inequívoca, por parte de quem tem responsabilidade na escola pública, da sua efectiva função civilizadora, o esforço dos professores que a assumem é pouco mais do que em vão.

É de prever, pois, que, mesmo tendo sido tão acompanhado na morte, Samuel Paty fique, no final, só.

1 comentário:

Anónimo disse...

Quando nasce o Homem não é um bom selvagem que a sociedade corrompe, nomeadamente através da ação das escolas e dos professores, como pensam muitos especialistas da educação. Para um professor, não há função alternativa à de ensinar, seja agora ou no futuro. O mundo ocidental, onde estas verdades singelas são vistas como falsidades, só pode estar em decadência.

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