segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

“E assim, acontece”


E assim, acontece” era a frase com que Carlos Pinto Coelho rematava as emissões do seu magnífico magazine cultural na RTP 2.

Completaram-se ontem, dia 15 de Dezembro de 2013, três anos sobre o falecimento do saudoso autor e apresentador do também saudoso ACONTECE, iniciado em 1994 e estupidamente extinto em 2003. O ministro da tutela, Morais Sarmento criticara a quantidade de dinheiro gasto para produzir o programa, dizendo “ser mais compensador oferecer uma volta ao Mundo a cada espectador”. Na sequência, o presidente da RTP, Almerindo Marques, anunciava o fim do programa.

No dia do seu funeral, ainda sob a comoção do seu súbito e doloroso desaparecimento, escrevi no «sopasdepedra» e no «sorumbático»:
“Acontece a todos. Uns hoje, outros amanhã. Sempre assim foi e assim será. Foi agora a tua vez. Amanhã será a dos que te viram partir. De todos, sem excepção. Dos bons como tu, que fazem falta à sociedade e que nós desejaríamos ter por cá muito mais tempo, e dos outros, incluindo os que não prestam, como aqueles que, estupidamente, te cilindraram na RTP, privando-nos do único e, até hoje, o melhor programa cultural televisivo em Portugal, e aqueles que, afastada a rapaziada que sancionou esse atentado à inteligência, não quiseram ou não souberam ir buscar-te e repor-te no lugar de onde nunca devias ter saído”...”Vais deixar saborosas saudades em muitos dos teus concidadãos e eu sou um deles. É um privilégio póstumo de que nem todas as almas se podem gabar. Mas com a tua, isso acontece”. 
Carlos Nuno de Abreu Pinto Coelho, de seu nome completo, nasceu em Lisboa a 18 de Abril de 1944. Foi um jornalista de muito prestígio, professor de jornalismo durante dois anos na Escola Superior de Tecnologia do Instituto Politécnico de Tomar, tendo revelado notáveis aptidões para a fotografia e a literatura. Viveu em Moçambique desde a idade de um ano até aos dezoito, em 1963, tendo regressado a Lisboa para cursar Direito, licenciatura que abandonou a poucas cadeiras de concluir a licenciatura.

A sua carreira de jornalista iniciou-se, em 1968, como repórter, no Diário de Notícias, e prosseguiu como um dos fundadores do Jornal Novo, redactor da Agência Noticiosa de Informação (ANI), correspondente em Portugal da rádio Deutsche Welle e redactor da revista Vida Mundial, dirigida pela igualmente saudosa Natália Correia. Na RTP foi director-adjunto de informação da direcção, chefe de redacção da Informação/2, director de programas e director de Cooperação e Relações Internacionais. Na rádio, deixou obra na TSF, na Rádio Comercial, na Antena 1 e na Teledifusão de Macau.

Numa carreira de pouco mais de três décadas, o autor do ACONTECE foi conferencista no Instituto de Altos Estudos Militares, membro do Conselho de Administração da Europa TV, coordenador dos Encontros de Televisões de Língua Portuguesa, presidente dos Comités Est-Ouest e Nord-Sud da Université Radiophonique et Télévisuelle Internationale, representante da RTP nos Comités de Informação e de Programas da União Europeia de Radiodifusão, da União das Rádios e Televisões Nacionais de África e da Organização das Televisões Iberoamericanas, representante do Ministério da Cultura na Reunião de Televisões Ibéricas, júri dos Prémios Emmy de Jornalismo de Investigação e dos Festivais de Cinema de Troia, Fantasporto, Cinanima e ICAM.

Pela vultuosa e útil obra que realizou, este nosso amigo foi distinguido como comendador da Ordem do Infante D. Henrique, oficial da Ordre des Arts et des Lettres do Ministério da Cultura da França, Prémio Bordalo, na categoria de Televisão, pela Casa da Imprensa, o Grande Prémio Gazeta, do Clube dos Jornalistas e o Prémio Carreira Manuel Pinto de Azevedo Jr., de O Primeiro de Janeiro.

Hoje, mais do que nunca, sentimos a sua falta.

A. Galopim de Carvalho

5 comentários:

Anónimo disse...

Um ministro da tutela que, passados 10 anos, veio ressabiado criticar um tal de Miguel Relvas por este tentar fazer exactamente as mesmas barbaridades que ele próprio não conseguiu concluir na altura...e ainda ficou com uma coluna de opinião semanal nessa mesma estação de TV que um dia procurou fechar! Acontece...

E acontece também que os portugueses têm, em geral, muito pouca memória, pelo que cabe aos restantes escreverem posts como este.

Dervich

Anónimo disse...

Um dos melhores programas que já passaram na rtp2!
Esse filho da mãe do ex-ministro ainda me deve uma volta ao mundo!

João Boavida disse...

Conheci-o no Serviço Militar, em 1970, fomos colegas durante três meses. E era realmente a pessoa que parecia ser. Simpático, fraterno, insinuante,amigo dos seus amigos, conhecia meio mundo. Era pessoa de múltiplos interesses. Por influência dele, que na altura trabalhava no Diário Notícias, visitamos o jornal, à paisana, coisa que não podíamos fazer porque éramos ainda cadetes da EPAM., em Lisboa. Fomos até recebidos pela diretor (então ainda essa personagem especial que foi o Augusto de Castro) que mandou chamar um fotógrafo para nos tirar uma fotografia para sair a notícia no jornal. O Pinto Coelho disse que sim senhor,muito bem, mas moveu os cordelinhos para a chapa não sair com as qualidades técnicas necessárias, não fosse o caso levantar problemas.

O programa Acontece foi de facto um ar fresco na cultura portuguesa, e o seu fim foi mais uma daquelas cavalidades políticas que envergonham quem o decidiu. Também não percebo por que razão os políticos que sucederam a Morais Sarmento não o repuseram. Tinha sido uma bofetada de luva branca em quem não sabe governar e tínhamos todos ganho com isso. Mas, enfim quem veio depois se calhar não era melhor. Já não sei quem foi...

Anónimo disse...

Depois do Morais Sarmento foi o Henriques Chaves, depois deste o Augusto Santos Silva, depois o Jorge Lacão, de seguida o Miguel Relvas! e finalmente o Luís Marques Guedes.

João Boavida disse...

Obrigado pela sua excelente informação.
A ideia é que ou são todos iguais ou houve coisas mais importantes que repor um bom e original programa de cultura. E nessa lista há uma ou duas pessoas que me parece podiam e deviam tê-lo feito.
Faz-me lembrar que também havia um programa magnífico na Antena 1 "Lugar ao Sul", que acabou não se sabe porquê. Era de uma portugalidade profunda e sentida, comovente, mas nada lamecha.. A mim encantava-me. Morreu e a não ser o RN e a Helena Damião, que eu saiba, mais ninguém se queixou.
Enfim. Em Portugal temos uma certa ideia de renovação que leva muito do que de bom fazemos e desaparecer e a ser substituído por nada..

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