Minha crónica no "Público" de hoje:
Estando a Terra quase a
completar mais uma volta em torno do Sol, é novamente tempo de balanço. Embora
o ano não esteja ainda fechado, uma boa previsão é que o número de novos livros
publicados em Portugal caiu, com a crise, para cerca de 13500, um valor apenas comparável
ao do início da década e bastante abaixo do pico de 17331 atingido há cinco
anos. Mesmo assim ainda se publicaram, dia e noite, 1,5 livros em cada hora.
Eis a minha escolha pessoal de dez livros de 2013. Privilegiei a originalidade,
que não faltou. A ordem é alfabética do apelido do autor.
- Luís M. Bernardo, Cultura Científica em Portugal. Uma
perspectiva histórica, Editora da Universidade do Porto. Um professor de
Física do Porto traça um retrato do modo como a ciência foi sendo vista entre
nós. Numa altura em que a Fundação para a Ciência e Tecnologia decidiu, num
gesto inculto, encerrar a disciplina de História da Ciência, esta é uma obra
que relata o modo, nem sempre bom, como temos encarado a ciência. Recomenda-se
em particular aos políticos de ciência que insistem em ignorar a história: eles
esquecem-se que ignorando o passado não se pode preparar o futuro.
- Afonso Cruz, Para Onde Vão os Guarda-chuvas,
Alfaguara. O novo original de um escritor (também ilustrador, cineasta e
músico) chegado há pouco à edição mas já premiado é isso mesmo: original.
Parece no início um livro infantil (“História de Natal para crianças que já não
acreditam no Pai Natal”), mas revela-se, numa vertiginosa sucessão de mini-capítulos,
um surpreendente romance em terras do Oriente. que termina com uma colecção de
aforismos.
- David Deutsch, O Início do Infinito, Gradiva. Muito
própria para estes tempos de crise, uma extraordinária obra de um físico israelita,
pioneiro da computação quântica e professor em Oxford. Passando em revista os
avanços verificados após a Revolução Científica, Deutsch afirma-se bastante
optimista a respeito das capacidades da ciência. Graças à ciência vamos ter
futuro.
- Jorge Lima, Pensamentos do Dalai Lima, Abysmo. Este
livro do prelo de uma pequena mas original editora lisboeta contém frases
divertidíssimas, com um design gráfico bastante cuidado, da autoria de um publicitário.
Por exemplo: “Um governo paralisado não é necessariamente mau quando se está à
beira do abismo.”
- Alberto Manguel e Gianni Guadalupi, Dicionário de Lugares Imaginários, Tinta da China. Da autoria de um
apaixonado pelos livros e pela literatura de origem argentina e de um
especialista italiano de literatura de viagens, trata-se de um muito completo
repositório de paisagens ficcionais.
- Paulo Mendes (fotos),
A Biblioteca Joanina. The Joanine Library,
Imprensa da Universidade de Coimbra. Apesar de ter uma pequena quota do livro
como autor do texto introdutório, não posso deixar de recomendar este belo
volume de fotografias da Biblioteca Joanina da Universidade de Coimbra,
recentemente considerada de novo uma das mais belas do mundo. Com este coffee-table book bilingue aquela
Universidade encerra o ano em que passou a ser património da Humanidade.
- Ion Morris, O Domínio do Ocidente, Bertrand. Um
historiador inglês que ensina na Universidade de Stanford apresenta uma
comparação magistral entre o Ocidente e o Oriente. O Ocidente, por enquanto,
ainda domina... Em inglês há um segundo volume, The Measurement of Civilization, que ensina a comparar o
desenvolvimento de povos e culturas.
- Jerónimo Pizarro e Patricio
Ferrari (orgs.), Fernando Pessoa: Eu sou
uma antologia. 136 autores fictícios, Tinta da China. A multiplicidade
estonteante de Pessoa aparece, maior do que nunca, neste livro cujo primeiro
autor é um estudioso colombiano distinguido este ano com o Prémio Eduardo
Lourenço. Em 2014 passarão os cem anos da estreia literária de Caeiro, Reis e Campos,
mas há muito mais pessoas no poeta da Mensagem.
Como António Mora, que a Assírio e Alvim revelou este ano.
- Gonçalo M. Tavares, Atlas do Corpo e da Imaginação, Caminho.
Um ensaio fragmentado, onde o leitor entra por um qualquer sítio e sai onde
quiser. E sai mais enriquecido, por obra e graça não só do autor do texto, hoje
já consagrado com traduções em meia centena de países, mas também do colectivo responsável
pelas fotografias.
- Padre António Vieira,
A Chave dos Profetas, Círculo de Leitores. Na monumental obra
vieirina, que o Círculo começou este ano a publicar, distingo este volume
coordenado por Pedro Calafate, que é também responsável pela edição completa
juntamente com José Eduardo Franco. O pregador jesuíta vai finalmente ter edição
integral, incluindo inéditos.
Boas leituras e Bom Ano
de 2014!
3 comentários:
Sempre muito útil.
Abraço
E Bom 2014.
Augusto
Então e «Alfabetizar em Democracia»?
Apresentado por si como um grande livro de um dos maiores especialistas mundiais na matéria?
Será porque tem afirmações políticas com as quais não concorda?
Das quais, deselegantemente, se demarcou na apresentação do livro na própria contracapa, com esta frase redundante e completamente despropositada: «… José Morais oferece-nos um magnífico resumo, baseado na sua rica experiência científica e pedagógica, do que é alfabetizar. Mas vai além. O autor não é apenas um professor e cientista: é também um cidadão empenhado na "res publica". E, por isso, não se coíbe de dar um salto para tratar, de um modo necessariamente pessoal, questões de ordem política.»
E o cidadão Carlos Fiolhais quando se empenha nas questões políticas da «res publica» e dá opiniões não o faz «de um modo necessariamente pessoal»?
Ou considera-se puro, acima do mundo?
Bom princípio de ano a si!
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