sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Sim, só faltava ver esta(s)...

Deste post da Helena e da entrevista a que faz referência, veio-me à memória uma discussão tida aqui sobre a FCT e a questão da divulgação da ciência que, lá pelo meio, derivou  para os inúmeros preconceitos que os portugueses têm com o dinheiro e o trabalho. Mas vou começar por aquilo que a Helena destaca.

Há coisas para as quais vamos estando preparados mas, ainda assim, vamos tendo aquelas surpresas que nos tornam a vida divertida. E aquela que não esperava era ter uma agência de funcionários públicos a determinar o que é empreendedorismo. Para além de me parecer óbvio que ninguém na FCT imagina o que sejam os custos e os esforços associados a patentes, é mais surpreendente que a agência não seja capaz de entender o que é valor económico e, mais simples ainda, entender o que é empreendorismo.

A mim, que ando nesta vida há uns valentes anos, não me passaria pela cabeça ir dizer a uma pessoa que está a construir um instituto com 600 investigadores, e que gere hoje 130, o que é empreendorismo.  Não iria ensinar futebol ao Cristiano Ronaldo, não iria ensinar empreendorismo ao Sobrinho Simões. Não está a criar uma corporação de quadros especialistas em fazer "power-points" dinâmicos sobre as mais-valias do financiamento no mercado de capitais, nos "empowerments" e "cutting edges" estratégicos? Irrelevante. Construiu uma estrutura a partir do seu querer, desenvolveu-a e está a entregar valor na sociedade. Quando um homem destes se dispuser a ensinar-me empreendorismo, eu estou lá no dia seguinte! 

Quanto ao financiamento,  infelizmente os nossos concidadãos entenderam que era mais importante gastar em autoestradas e salários excessivos que em ciência. Contra isso, batatas. E como todos os empreendedores, Sobrinho tem que gerir os impactos que isso tem na procura que os seus activos passam a ter a procurar novas formas de entregar valor mais imediatas. Se for o empreendedor que revela, fará isso com o mesmo equilíbrio que os seus receios revelam.

O que também me parece relativamente óbvio é que não preciso de nenhuma patente para aferir o valor económico deste empreendimento. Ainda que me possa faltar uma métrica mais imediata, como teria numa empresa, e me possa enganar durante 3 ou 4 anos, não é particularmente complicado sob "expert decision" aferir se a investigação feita aqui tem ou não valor económico. Ao 5 ano já percebi se me enganei ou não. 

Portanto, parece-me que as pessoas da FCT sofrem da mais grave das ignorâncias, a activa. Não só não sabem, como ainda por cima, fazem que sabem. Ainda que possa, em abstracto, admitir que se possa exigir o mesmo equilíbrio que o Sobrinho Simões deixa transparecer relativamente às formas de financiamento, não consigo imaginar maior imbecilidade que a questão das patentes. 

O que nos traz, outra vez, à questão da divulgação. Quando disse aqui que a divulgação do tipo Ciência Viva não deveria ser a preocupação da FCT mas sim a divulgação da investigação de facto, recebi quase o dobro dos insultos que costumo receber. Mas a questão volta a estar aqui. Primeiro nenhum funcionário público ou político trabalha em favor do bem público mas sim em função daquilo que o público acha ser um bem público. Se o público não acha que algo é um bem público, deixa de o ser. Segundo, nenhum empresário fora do ambiente científico vai contratar um doutorado por uma razão imbatível: ele nem imagina para que é que essa coisa serve. Terceiro, empresário nenhum vai olhar para aquilo a que se chama de produção científica (salvo raras excepções dos dois lados) e vai ver valor. Portanto, ou os centros de investigação passam a ser empresas de facto e contratarem gente para vender a sua investigação de forma que os empresários percebam, ou  os funcionários públicos que acham que patentes é uma coisa importante, passam a achar que vender investigação é muito mais importante que pagar advogados. E, consequentemente, repõem o financiamento a essa complicadíssima tarefa que é vender o resultado do conhecimento científico. 

Dizer que Portugal não tem uma estrutura empresarial que absorva os doutorados é uma desculpa para quem não quer vender. Ou para funcionários públicos que já definem empreendorismo...
    
PS: Não conheço, nem nunca falei (infelizmente) com o Prof. Sobrinho Simões, pelo que os elogios o são de facto.

5 comentários:

Armando disse...

hoje tive a oportunidade de conhecer o Sobrinho Simões. Houvessem N com ele.

Cláudia da Silva Tomazi disse...

ccc

Anónimo disse...

Caro
Faça um levantamento de todos os projectos financiados até hoje pela fct e verifique quais é que se divulgaram os resultados, dos quais se publicaram artigos, livros, fizeram conferências, etc, ou seja se chegou a alguma conclusão.
Não tenhamos ilusões, a fct financiou muito projecto até hoje que estão escondidos a 7 chaves e não se sabe que conclusões se alcançaram..
Ora este conhecimento pago com dinheiro dos contribuintes não deveria ser público??

João Pires da Cruz disse...

No interesse público, acho sinceramente irrelevante. O interesse público não se mede em papers, nem em conferências, mede-se em postos de trabalho, em valor económico. E este deriva da carteira de projectos, não daquele projecto em concreto. O que não quer dizer que não exista "accountability". O público gasta esparrames de dinheiro em actividades de índole militar que são controladas apesar de não serem do conhecimento público. Mas, sinceramente, acho que o facto de ser pago pelo contribuinte, deve ser devolvido na forma que o contribuinte entregou: em euros. Se isso depender da publicação, bom; senão, bom na mesma. Acredito (e isto é mesmo "acredito", porque não há dados) que o contribuinte hoje recebe aquilo que paga nos vários subprodutos que a investigação coloca na sociedade e que a maior parte não são nem patentes, nem papers, nem comunicações. Como todas as actividades de carteira, é na diversificação que vem o proveito.

Anónimo disse...

pois o pior é quando ficam na gaveta e não dão origem a nada, depois os outros se quiserem saber os resultados ou andam a pedir por favor ou então gastam mais tempo e recursos para saberem aquilo que já foi pago para saber, é como o governo, estudos de estudos e no fim não concluem nada nem dão origem a nada, sem qualquer proveito..

O BRASIL JUNTA-SE AOS PAÍSES QUE PROÍBEM OU RESTRINGEM OS TELEMÓVEIS NA SALA DE AULA E NA ESCOLA

A notícia é da Agência Lusa. Encontrei-a no jornal Expresso (ver aqui ). É, felizmente, quase igual a outras que temos registado no De Rerum...